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Novo estudo mostra que primeiro registro de beijo na boca remonta há mais de 4.500 anos

Segundo autores, além de nova data, a evidência também aponta nova localidade para pesquisas futuras

Agência O Globo - 14/02/2024
Novo estudo mostra que primeiro registro de beijo na boca remonta há mais de 4.500 anos

Não se sabe ao certo quando o contato boca a boca passou a ser usado para romance e prazer, mas cientistas da Universidade de Copenhague, na Dinamarca, e da Universidade de Oxford, no Reino Unido, descobriram que as pessoas se beijavam na boca há pelo menos 4.500 anos. A descoberta foi publicada na revista Science.

— O beijo é praticado há muito mais tempo do que nós imaginamos, ou pelo menos pensávamos —disse o Dr. Troels Pank Arbøll, professor assistente de Assiriologia, na Universidade de Copenhague.

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Segundo os pesquisadores, milhares de tabuletas de argila da Mesopotâmia sobrevivem até hoje, trazendo referências ao beijo e trazendo novos entendimentos sobre a intimidade romântica no mundo antigo.

— Este fascinante estudo de caso se soma a um crescente corpo de pesquisas científicas sobre beijos românticos/sexuais e nos ajuda a compreender as origens do beijo no comportamento social humano e, especificamente, na vida íntima — contou o biólogo evolucionista Dr. Justin R. Garcia, professor de gênero na Universidade de Indiana, em Bloomington. Ele investiga a cultura e a evolução da intimidade humana no instituto Kinsey, mas não esteve envolvido na pesquisa.

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Em entrevista à CNN, Garcia afirmou que experiências de comportamento romântico e sexual fazem parte de padrões mais amplos de comportamento social humano. Assim, compreender como eles se expressam, mudam e evoluem, nos ajuda a entender melhor quem somos atualmente.

Beijos apaixonados

A evidência mais antiga registrada de beijo era atribuída aos Vedas, um grupo de textos bíblicos indianos que datam de cerca de 1.500 a.C. e são pilares para a religião hundu. Um dos volumes, o Rig Veda, descreve pessoas tocando os lábios. O beijo erótico também foi apresentado detalhadamente em outro antigo texto indiano: o Kama Sutra, que é um guia para o prazer sexual que data o século III d.C.

Assim, os estudiosos concluíram que os beijos românticos provavelmente surgiram na Índia. Mas segundo Arbøll, entre os assiriologistas havia o conhecimento de tabuletas de argila que mencionavam o beijo antes dos escritos indianos, entretanto, a conversa se dava dentro de círculos fechados da esfera acadêmica.

Em seu estudo com a Dra. Sophie Lund Rasmussen, pesquisadora do departamento de biologia da Universidade de Oxford, no Reino Unido, escreveu sobre beijos escritos em tábuas mesopotâmicas datadas de 2.500 a.C.

Dr. Arbøll explicou que estuda a escrita cuneiforme. Trata-se de caracteres prensados em tábuas e foi inventado por volta de 3.200 a.C. o cuneiforme antigo era utilizado para contabilidade, mas por volta de 2.600 a.C, ou antes, as pessoas começaram a registrar histórias sobre seus deuses.

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— Em um desses mitos, temos a descrição de que esses deuses tiveram relações secuais e depois se beijaram — disse ele. — Essa é uma evidência clara de beijo romântico sexual — acrescentou.

Com o passar dos séculos, a escrita foi se popularizando na Mesopotâmia. Dessa forma, surgiram mais registros do cotidiano, trazendo citações de beijos trocados entre casais casados e por solteiros também.

No estudo, foram encontrados alguns exemplos de alerta sobre os riscos do beijo. Por exemplo, acreditava-se que quem beijasse uma sacerdotisa que jurou uma forma de celibato, ficava privado da capacidade de falar.

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Um outro alerta era sobre o beijo na rua. Assim, os pesquisadores interpretam que a ação era muito cotidiana.

Menos fala e mais beijo

Os humanos não são os únicos que se beijam na natureza. Isso também acontece entre os primatas, como os chimpanzés (Pan troglodytes), que trocam beijos como saudações. Já para os bonobos (Pan paniscus), o beijo faz parte das suas brincadeiras sexuais mais frequentes; eles se relacionam cara a cara e muitas vezes se envolvem em “beijos de língua intensos”, escreveu o primatologista Frans B.M De Waal, biólogo comportamental da Universidade Emory, em Atlanta.

Segundo Arbøll e Rasmussen, é possível que o beijo romântico tenha evoluído nos primatas como uma forma de avaliar a aptidão de um potencial parceiro.

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Mas o beijo não é só uma questão de sociabilidade, diversão e prazer. Um outro ponto dele, entre os humanos, é a propagação de doenças infecciosas. Outro estudo, realizado por um grupo de pesquisadores de instituições da Europa, Reino Unido e Rússia e publicado em julho de 2022, afirmou que a rápida ascensão de uma linhagem do vírus herpes simplex HSV-1 na Europa há cerca de 5.000 anos estava “potencialmente ligada à introdução de novas práticas culturais, como o advento do beijo sexual-romântico”, depois de ondas de migração para a Europa a partir das pastagens da Eurásia.

Entretanto, para Arbøll e Rasmussen, o beijo romântico foi aceito na Europa da idade do bronze e não apenas por conta da migração. Na verdade, eles acreditam que a prática já deveria ser superficialmente familiar entre os indivíduos, porque era muito comum na Mesopotâmia e possivelmente em outras partes do planeta.

Beijando antes e agora

Diferente dos beijos compartilhados em pais e filhos, que acredita-se serem existentes ao longo de todo o tempo e lugar, os beijos românticos não são comuns em qualquer região. Até hoje, muitas culturas evitam ele, informam Arbøll e Rasmussen.

Um estudo desenvolvido em 2015, de autoria de Garcia, investigou 168 culturas modernas ao redor do mundo e descobriu que apenas 46% delas praticavam beijos sexuais ou românticos. Segundo os autores, esse tipo de beijo era menos comum em comunidades coletoras de alimentos (possuem pessoas que sobrevivem coletando recursos naturais e compartilham características sociais e culturais) e era mais encontrado em sociedade que tinham classes sociais, sendo as sociedades mais complexas as mais propensas ao beijar dessa maneira.

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Vale destacar que, mesmo o estudo de Arbøll e Rasmussen sugerindo que o beijo romântico não era incomum na antiga Mesopotâmia, os autores apontam que ainda existiam tabus sobre quem poderia beijar e onde faria.

— Este artigo é um lembrete importante de que o beijo generalizado que vemos atualmente representado ao nosso redor, na sociedade ocidental, nem sempre foi e nem sempre é, uma parte das demonstrações de intimidade de todos — disse Garcia.

Então se o beijo no mundo antigo era mais comum do que se pensava, talvez até mais universal do que nos tempos modernos, “isso abre questões interessantes para pesquisas futuras” conclui Arbøll.