Internacional

Presidente salvadorenho comemora vitória antes de divulgação de resultados oficiais

Popularidade de Nayib Bukele pode ser explicada pela luta contra as gangues, que tornaram o país um dos mais perigosos do mundo

Agência O Globo - 05/02/2024
Presidente salvadorenho comemora vitória antes de divulgação de resultados oficiais

Após 10 horas de votação, as urnas foram encerradas em El Salvador, neste domingo, com a vitória do atual presidente Nayib Bukele praticamente confirmada. De acordo com as primeiras pesquisas de boca de urna, Bukele teria 87% dos votos, em uma jornada eleitoral marcada por atrasos, denúncias de irregularidades e recorde de participação no exterior. Ao todo, nove pessoas foram presas.

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O Tribunal Supremo Eleitoral encerrou a votação às 17h locais (20h de Brasília). Havia 6,2 milhões de eleitores aptos a comparecer às urnas.

Antes mesmo dos resultados oficiais serem conhecidos, o presidente comemorou a vitória no X, antigo Twitter:

"De acordo com nossos números, ganhamos a eleição presidencial com mais de 85% dos votos e no mínimo 58 dos 60 deputados da Assembleia", escreveu. "É um recorde em toda a História democrática do mundo".

Mais cedo, ao votar, o mandatário pediu votos para seu partido, violando a neutralidade eleitoral.

— É importante votarmos para garantir que tenhamos uma Assembleia Legislativa que possa continuar a aprovar o regime de exceção — disse, sob forte aparato policial, e aplaudido por apoiadores que lotaram a seção eleitoral.

Bukele também se defendeu de críticas de que seu governo abala as bases democráticas:

— Não estamos atacando a democracia, porque El Salvador nunca teve democracia. É a primeira vez na História que El Salvador tem democracia, e não sou eu dizendo, é o povo.

O presidente também defendeu que El Salvador tenha a taxa de encarceramento mais alta do mundo e disse que todas as polícias "cometem erros" ao prender inocentes.

— O que está por vir para El Salvador é um período de prosperidade, porque não há mais impedimento para abrir um negócio, estudar, trabalhar. Já não há mais impedimento para o turismo — acrescentou Bukele.

Organizações como a Anistia Internacional e a Human Rights Watch denunciam detenções arbitrárias, tortura e mortes na prisão. Cerca de 7 mil pessoas inocentes foram libertadas, mas muitas permanecem presas, sem poderem se comunicar com suas famílias.

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Para as eleições, foram montados 1.595 centros de votação, com 8.564 Juntas Receptoras de Votos (JRV). Muitos eleitores reportaram atrasos para abertura nos centros de votação, alguns com mais de duas horas. Também foram registrados problemas com funcionários que iriam compor as JRV, registrados e convocados pelo Tribunal Superior Eleitoral, mas que teriam sido barrados ao entrar. Segundo o jornal La Prensa Gráfica, partidos opositores denunciaram que os cargos foram ocupados por pessoas ligadas ao Novas Ideias, legenda do presidente.

Com a provável vitória, Bukele cimentaria sua grande popularidade, apesar das críticas dos organismos de direitos humanos ao seu regime de exceção, vigente desde março de 2022, e das acusações de violação da Constituição ao buscar a reeleição.

A Constituição salvadorenha proíbe que presidentes se candidatem a mandatos consecutivos, mas em 2021, o Novas Ideias — que tem supermaioria no Congresso — substituiu juízes na Suprema Corte, que reinterpretaram a Carta para permitir que ele concorresse novamente.

Para o analista sênior do Centro de Estudos Internacionais da Universidad Católica do Chile, Daniel Zovatto, a provável vitória de Bukele é "um exemplo perigoso de como desmantelar uma democracia com um apoio popular elevadíssimo".

— Todo o poder para Bukele. Um cheque em branco sem limites — disse ao GLOBO o especialista eleitoral. — Como venho alertando: é o modelo mais perigoso para a democracia em nossa região: a "bukelização" da política e sua proposta: a "eficácia autoritária".

Luta contra as gangues

A maior razão da popularidade de Bukele, dizem analistas, é que o líder de 42 anos conseguiu um feito que parecia impossível: dizimar as gangues que tornaram o país um dos locais mais perigosos do mundo.

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Desde que chegou ao poder em 2019, o presidente prendeu milhares de pessoas inocentes, suspendeu liberdades civis indefinidamente e inundou as ruas com soldados. Embora a repressão que se seguiu tenha atacado liberdades individuais, ela entregou os resultados que muitos queriam.

Por mais de duas décadas, as gangues aterrorizaram El Salvador, abalando a economia, assassinando civis e provocando uma onda de migração para os EUA. Os dois partidos que governaram o país pouco fizeram para controlar os massacres, com presidentes que enriqueceram enquanto a população era caçada pelos criminosos.

Sua popularidade cresceu desde março de 2022 quando declarou guerra contra as gangues que mantinham controle territorial e se financiavam com extorsões e assassinatos de aluguel, após a qual o país começou a recuperar a tranquilidade.

Amparado em um regime de exceção que permite prisões sem mandado judicial e criticado por organismos de direitos humanos, o governo prendeu mais de 75 mil supostos membros de gangue. Segundo as autoridades, 7 mil inocentes foram libertados.

*Em atualização.