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Prisão em que Kenneth Smith será executado já foi conhecida como a mais violenta dos EUA; conheça

Horrores do local incluem esfaqueamentos, assassinatos, incêndios e abusos sexuais; homem condenado deverá ser morto na cadeia nesta quinta-feira

Agência O Globo - 25/01/2024
Prisão em que Kenneth Smith será executado já foi conhecida como a mais violenta dos EUA; conheça

Condenado à morte por assassinar a mulher de um pastor nos Estados Unidos em 1988, Kenneth Smith, de 58 anos, deverá ser executado nesta quinta-feira. A Suprema Corte do país negou um pedido para suspender a medida, e a execução permanece marcada para ocorrer no Centro Correcional de Holman, em Atmore. O local, que foi fundado em 1969, é cercado por polêmicas de agressão e já recebeu a alcunha de ser a prisão mais violenta da América.

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Em 2016, após uma série de massacres ocorridos na penitenciária, o ex-funcionário Curt Stidham descreveu ao Guardian como era a vida dentro dela. Os horrores da prisão, localizada no sul do Alabama, incluem esfaqueamentos, incêndios e abusos sexuais. Cercada por campos de algodão, a construção fica em uma região isolada. Na época em que Stidham falou com o jornal britânico, um prisioneiro havia tentado cortar o olho de um guarda durante uma briga.

Naquele mesmo ano, o Departamento de Justiça dos EUA anunciou uma investigação sobre as prisões masculinas do estado. O objetivo era avaliar as condições geralmente inseguras que essas instalações apresentam – tanto para prisioneiros quanto para os oficiais. Em 2019, o resultado das análises foi divulgado em um relatório que dizia haver “um alto nível de violência que é (...) cruel e de natureza perversa” na penitenciária.

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O documento destacava casos de mortes de detentos, estupros, extorsão das famílias dos prisioneiros e contrabando generalizado de armas e drogas. Afirmava, ainda, que as instalações violavam a Constituição, uma vez que não havia “condições humanas adequadas de confinamento”. Na mesma época, a diretoria da prisão de Holman, que abriga o corredor da morte, informou que estimava ter apenas 11 funcionários de segurança por turno para uma população prisional de 800.

Problema ocorre 'há décadas'

Ao Guardian, Stidham esboçou um layout da prisão num guardanapo e descreveu a hierarquia dos oficiais, afirmando que há “um diretor no topo, depois dois capitães e, em seguida, tenentes”. Como tenente, sua primeira ordem todos os dias era descobrir quantos dos oficiais de seu turno haviam se apresentado para o serviço. Segundo ele, por vezes somente nove guardas tentavam controlar todos os detentos, que, disse, eram 950 – ainda que a instalação fosse construída para abrigar 637.

Bob Horton, um porta-voz das prisões do Alabama, confirmou ao Guardian o depoimento de Stidham, afirmando que havia “superlotação e falta de pessoal”. Ele descreveu a situação como um problema “intratável que se originou na década de 1970 e floresceu por décadas devido à negligência”. Pontuou, no entanto, que não havia uma pessoa ou entidade para responsabilizar, já que acontecia “há décadas”.

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Nos anos 60, a recém-construída prisão Holman representava um avanço em relação às cadeias anteriores. Tinha duas cercas de arame e seis torres, que deveriam dar aos guardas uma visão constante de todos os ângulos. Com os anos, porém, apenas duas passaram a ser ocupadas. Segundo Horton, o problema começou com as leis “linha-dura”, aquelas defendidas por políticos que não queriam parecer brandos, mas que também não podiam se dar ao luxo de construir novas prisões.

'Um banho de sangue'

As regulamentações podem exigir que dois oficiais transportem um prisioneiro, mas, por conta da falta de pessoal, por vezes há somente um disponível. Em outras situações, um guarda fica na porta de um dormitório com 115 detentos – e, caso um grupo de prisioneiros agrida outro, é trabalho desse guarda intervir para proteger a vítima. Stidham, no entanto, mostrou dezenas de facas feitas na prisão. Elas variavam de pequenas lâminas feitas de ripas de cama de metal a um enorme caco de vidro. Ele questionou: “Você entraria no dormitório?”.

O pastor Kenneth Glasgow, que trabalhava com prisioneiros, disse ao Guardian que todos os dias havia “um banho de sangue” no local. Ele, que também cumpriu pena muitos anos antes, disse que as prisões do Alabama pioraram desde então. Glasgow afirmou que, em 2016, havia apenas “sete oficiais para uma prisão de mil homens”, o que criava “um ambiente hostil”. Além disso, contou, “todos em Holman têm facas, e assim que você chega, eles dizem que é melhor arrumar uma”.

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Em março do mesmo ano, os detentos se rebelaram, esfaqueando um guarda. Quando o diretor, na época Carter Davenport, respondeu, eles o esfaquearam também. Incendiaram o dormitório e fizeram patrulhas nos corredores carregando espadas. O diretor e o guarda sobreviveram, e esquadrões especiais de segurança tentaram sufocar o motim. Pouco depois, outro tumulto eclodiu e um prisioneiro esfaqueou outro. Foi quando Stidham decidiu se demitir.

Meses depois, em setembro, ele soube que um de seus oficiais, Kenneth Bettis, de 44 anos, se recusou a dar a um prisioneiro uma bandeja extra de comida, e o detento o esfaqueou na têmpora. Enquanto Bettis estava no hospital, uma nova greve ocorreu na prisão – e detentos de outras cadeias dos EUA passaram a planejar atos semelhantes. Alguns dias depois, o guarda atacado morreu no hospital, e os oficiais decidiram faltar ao trabalho como protesto. Entre eles, três nunca mais voltaram.