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Violenta disputa por terras deixa cinco mortos na Argentina; veja depoimentos

Tiroteio ocorreu durante assembleia para discutir venda e distribuição de terras ocupadas ilegalmente

Agência O Globo - 16/01/2024
Violenta disputa por terras deixa cinco mortos na Argentina; veja depoimentos
Arma - Foto: Arquivo/Agência Brasil

Uma violenta disputa por terras envolvendo membros das comunidades paraguaia, peruana e boliviana de um populoso subúrbio a oeste de Buenos Aires deixou cinco mortos e seis feridos, informaram fontes judiciais nesta segunda-feira.

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O episódio ocorreu no domingo, durante uma assembleia de famílias convocada para discutir a venda e distribuição de terras ocupadas ilegalmente em González Catán, a 35 km da capital, segundo a AFP.

O Ministério Público ordenou diversas operações na madrugada desta segunda-feira para prender os três supostos autores dos disparos, de origem paraguaia, segundo a agência estatal Télam.

As vítimas são quatro homens, entre 23 e 29 anos, e um adolescente de 16 anos.

Testemunhas relataram à imprensa que várias mães conseguiram retirar crianças que acompanhavam suas famílias, muitas originárias do Peru e da Bolívia, antes do início dos disparos, inicialmente para o alto e depois, contra pessoas.

Manuel Adorni, porta-voz do presidente argentino de extrema direita, Javier Milei, descreveu o episódio como "doloroso e lamentável".

González Catán, localizada no município de La Matanza, é a cidade mais populosa da Grande Buenos Aires, com 1,83 milhão de habitantes.

Leia depoimentos dos sobreviventes dos ataques

O jovem Maximiliano, de 27 anos, não tem dúvidas. "Queriam nos matar. Foi um massacre. Estamos com raiva," disse à La Nación.

Ele afirma que os supostos "delegados" da área ameaçam as pessoas que se instalaram no local e pedem o pagamento de 100 mil pesos por um "lote" de 10 por 30 metros.

— Eles vieram me pressionar duas ou três vezes. Estamos aqui há um ano. Não sei como eles obtiveram as terras. Enganaram muita gente. Não tenho para onde ir, diz ele.

Quase 24 horas após o ataque a tiros, no qual a Justiça tenta identificar três atiradores, Maximiliano conta os detalhes do tiroteio.

— Ontem a confusão começou porque tentaram nos silenciar, nós que estamos pedindo melhorias. Na reunião, iriam escolher um tesoureiro. As pessoas pediam a criação de uma cozinha comunitária. Os delegados não queriam que a prefeitura se envolvesse.

O rapaz afirma que o ataque a tiros durou cerca de uma hora:

— Nós, vizinhos, tivemos que socorrer as vítimas. Nem a polícia nem a ambulância vieram.

Outro testemunho do ataque, um cidadão boliviano de 42 anos que prefere não se identificar, afirma:

— Eles não se importaram com nada [os atiradores]. Na reunião, havia crianças e mulheres. Tudo aconteceu por uma disputa pelo controle do bairro. Queremos mais presença do Estado.

Outro jovem argentino, de 27 anos, afirma que em julho do ano passado pagou 500 mil pesos por um "lote" de 12 por 30 metros. O dinheiro foi entregue aos "paraguaios", como ele os chama, e ele relata que recebeu um "contrato de compra e venda".

— Eles nos pressionavam para construir. Nos ameaçavam de nos expulsar. Nos ameaçavam com armas. Estamos assustados. Os lotes eram mais caros com vista para a pedreira com água, — diz o jovem que prefere não se identificar ao La Nación

Sobre o ataque, ele relata:

— A reunião era para trocar os delegados e organizar a iluminação. As pessoas estavam cansadas dos delegados paraguaios. Então, eles começaram a atirar. A batalha durou cerca de uma hora.

M., de 29 anos, é boliviana. Seu marido está internado na UTI. Quando os tiros começaram, ela se defendeu com pedras. Agora ela luta por sua vida.

— Os delegados paraguaios contrataram pessoas mal-intencionadas. Temos medo de viver aqui.

Ela conta que se instalou no local há cinco meses, quando soube da ocupação, e pagou 25 mil pesos pelos trâmites que os "advogados" deveriam fazer. O dinheiro foi entregue aos "delegados paraguaios".

Outra mulher de nacionalidade boliviana, que também por medo prefere não se identificar, conta que no terreno invadido vivem pessoas da Bolívia, Paraguai, Peru e Argentina. Ela relata que "comprou um lote" por 1000 dólares. Como as outras pessoas, o dinheiro foi entregue aos "delegados paraguaios".

—Os paraguaios nos cobram por tudo: luz, ruas e segurança. Agora queriam cobrar 5 mil por mês pela segurança. Nos ameaçavam com despejo. Vendiam o terreno mais de uma vez. Queremos construir uma casinha, meu pai é deficiente. Eles queriam que ficássemos permanentemente no lote e explicávamos que tínhamos que trabalhar. Diziam que havia advogados e papéis, mas nunca vimos um papel, — relata a mulher, sem esconder seu medo.