Internacional
Artigo: o Fórum Global sobre Refugiados revela o potencial dessa população
Em todo o mundo, já são mais de 114 milhões de deslocados forçadamente; no Brasil, há mais de 710 mil nessa situação
Em junho passado, nas comemorações em torno do Dia Mundial do Refugiado, estive em um evento no Ministério da Justiça e Segurança Pública e ouvi de um refugiado sírio que o único país que ofereceu a ele uma entrada de maneira digna foi o Brasil.
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Engenheiro de profissão, Anas chegou ao país fugindo da guerra, sem conhecer ninguém e sem falar português. Para se sustentar, passou a vender comida árabe na saída de um metrô. Com o tempo, já ciente de seus direitos, inclusive pelo acompanhamento que recebeu da Agência da ONU para Refugiados (Acnur) e seus parceiros, conseguiu revalidar seu diploma e voltar a atuar na sua área de formação.
— Foi como se uma parte da minha identidade tivesse sido resgatada — ele disse.
Histórias exitosas como a de Anas ainda são exceção, mas a busca por uma vida digna é a regra.
Quando conheço pessoas refugiadas pelo país, o que mais encontro é gratidão pela proteção internacional oferecida pelo Brasil, constante busca por oportunidades de integração local e avidez para contribuir com a sociedade de acolhida.
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O Fórum Global sobre Refugiados (GRF, na sigla em inglês), realizado nesta semana, em Genebra, é sobre essas pessoas. É um momento de discussão para encontrar soluções efetivas para os desafios impostos pelos níveis recordes de deslocamento forçado – em todo o mundo, já são mais de 114 milhões de pessoas nessa situação. No Brasil, mais de 710 mil.
O GRF é o maior encontro internacional feito sobre e com pessoas refugiadas. Seu objetivo é reunir apoios e evidenciar caminhos possíveis para que exemplos como o de Anas sejam cada vez mais frequentes nos países que acolhem pessoas deslocadas.
Para isso, é preciso engajar diferentes setores da sociedade para assumirem suas responsabilidades. Entes públicos nos níveis federal, estadual e municipal, empresas de diferentes portes e segmentos, instituições financeiras que apoiam o desenvolvimento, organizações sociais, universidades, institutos de pesquisa e instituições religiosas, em aliança com os próprios refugiados e orientados por suas demandas, são convidados a apresentarem compromissos e contribuições transformadoras, sustentáveis e eficientes.
O Brasil também estará lá com força total para expor as iniciativas desenvolvidas em apoio às pessoas em necessidade de proteção internacional.
O governo federal apresentará compromissos complementares em relação aos do ano de 2019 em diversas temáticas, como o fortalecimento do seu sistema nacional de asilo; o aprimoramento da concretização do direito à união familiar; e a regulamentação da Política Nacional sobre Migrações, Refúgio e Apatridia.
Por sua vez, o setor privado brasileiro, com o Fórum Empresas com Refugiados, articulou-se para promover compromissos relacionados à contratação e capacitação de pessoas refugiadas para o mercado de trabalho formal — com a expectativa de transformar a vida de mais de 16 mil nos próximos quatro anos.
Por meio da Cátedra Sérgio Vieira de Mello (CSVM), a academia terá um papel fundamental no GRF, apresentando compromissos como a ampliação do apoio à saúde mental para pessoas refugiadas, qualificação dos cursos de português oferecidos, fortalecimento dos serviços de assistência jurídica, e ampliação de atividades de advocacy quanto às políticas públicas locais e nacionais.
Outras instituições, como a Defensoria Pública da União (DPU), agências da ONU no país, Comitê Paralímpico Brasileiro, Sesc Rio de Janeiro e Santos Futebol Clube, também proporão compromissos para fortalecer sua atuação em prol dos direitos das pessoas refugiadas no Brasil.
Tudo isso é feito, entre outros, para que as crianças refugiadas possam ir à escola; para que as mudanças climáticas não potencializem os deslocamentos; para que os refugiados possam contribuir com seus saberes para as sociedades e economias anfitriãs. Em resumo, para que não sejam deixados para trás, em linha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e a Agenda 2030.
As pessoas refugiadas deixam de ser vulneráveis por meio de uma inserção digna, quando oportunidades condizentes com seus potenciais lhes são propiciadas. O GRF quer que os compromissos apresentados sejam implementados e inspirem todos nós a repensarmos nossos modelos de atuação para considerarmos as pessoas refugiadas o que elas verdadeiramente são: parte das soluções e apenas consequências dos problemas globais, das guerras, da violência e de violações dos direitos humanos.
Em um mundo em que assistimos ao fracasso dos governos em defender a paz e a segurança, em deixar de lado as rivalidades e as divisões e em encontrar uma voz forte e uníssona para enfrentar os conflitos de hoje, o GRF é a chance que temos de unir esforços para que histórias como a do engenheiro sírio Anas sejam cada vez mais frequentes.
Para que sejam a regra, e não a exceção.
*Davide Torzilli é representante da Agência da ONU para Refugiados (Acnur) no Brasil
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