Internacional

COP28 busca cobrir lacuna de até US$ 387 bilhões para adaptar planeta a novo clima

Conferência discute criar metas globais de adaptação; ONU diz que financiamento disponível para essa finalidade tem que ser multiplicado, no mínimo, por dez

Agência O Globo - 03/12/2023
COP28 busca cobrir lacuna de até US$ 387 bilhões para adaptar planeta a novo clima
COP28 busca cobrir lacuna de até US$ 387 bilhões para adaptar planeta a novo clima - Foto: reprodução

Além de buscar reduzir emissões de gases do efeito estufa, a Conferência do Clima de Dubai, a COP28, prossegue nesta semana com a missão de entregar também um plano para lidar com os impactos do aquecimento global. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), os recursos anuais sendo empregados nisto precisam ser multiplicados, no mínimo, por dez.

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Na semana passada, o encontro conseguiu concluir a criação de um fundo para “perdas e danos” que reuniu, para um período não definido, mais de US$ 550 milhões. Esse montante, porém, é destinado apenas a países que venham efetivamente a sofrer impactos incontornáveis da mudança climática.

A trilha da adaptação sob o Acordo do Clima de Paris, que corre separadamente, não tem metas oficiais, mas o Pnuma estima uma carência de financiamento de US$ 215 bilhões a US$ 387 bilhões por ano.

Esses números são uma ordem de grandeza acima do fluxo de financiamento atual. Na COP26, países ricos prometeram repassar US$ 40 bilhões anuais aos mais pobres até 2025, especificamente para adaptação, promessa ainda não cumprida. O fluxo de financiamento está em US$ 21 bilhões/ano agora.

Maior custo-benefício

Esses recursos, dizem ambientalistas, seriam para uma linha de enfrentamento com maior custo-benefício na crise do clima, porque buscam prevenir impactos, em vez de compensar os países atingidos depois.

Um grupo de diplomatas trabalha sob a Convenção do Clima da ONU (UNFCCC) para criar parâmetros para seus Objetivos Globais de Adaptação (AGG). A ideia é ter para este tema um norte como o que o Acordo de Paris já possui para “mitigação”, que é frear o aquecimento antes que a temperatura do planeta aumente mais de 1,5°C.

Mesmo que o mundo esquente menos que isso, há uma série de impactos, como elevação do nível do mar, aumento na ocorrência de chuvas extremas, ampliação de secas e outros eventos extremos que já estão “contratados” pela Humanidade.

Se o planeta não quiser esperar tragédias acontecerem para remediar depois, a trilha da adaptação precisa avançar na COP. Lidar com esses problemas requer construir estrutura como galerias pluviais, sistemas de irrigação e quebra-mares. Tudo isso custa dinheiro.

Mas criar um arcabouço de Metas Globais de Adaptação é tão importante quanto difícil. A COP28 começou sem uma visão clara de quais parâmetros precisam compor essas metas, além de simplesmente pôr uma etiqueta de valor financeiro para essas carências.

— Algumas questões já estão sendo colocadas. Na COP27, saiu uma agenda de adaptação propondo como meta até 2030, por exemplo, tirar 4 bilhões de pessoas da condição de vulnerabilidade climática — explica o geógrafo Diosmar Filho, da Associação de Pesquisa Iyaleta, um grupo da sociedade civil dedicado a acompanhar o debate internacional sobre adaptação.

Entregar resiliência climática a quase metade da população mundial não vai ser fácil, em parte porque é um desafio dificultado pela fragmentação do problema.

— A adaptação precisa ser feita em escala global, mas envolve uma escala muito nacional, doméstica, que cabe a cada país — diz Diosmar.

O Pnuma calcula que 85% dos países do mundo tenham seus planos próprios de adaptação, mas muitos daqueles que não têm estão no espectro mais pobre do planeta, muitos sem nem sequer recursos adequados para fazer um diagnóstico de vulnerabilidade.

O Brasil possui um plano próprio, lançado ainda em 2016, na gestão Dilma Rousseff, mas nunca chegou a uma fase efetiva de implementação. Quando se levam em conta fluxos internacionais de recursos para investir no setor, o Brasil não é um país tão carente quanto a maioria das nações africanas, nem deve depositar em um fundo tanto dinheiro quanto países europeus.

A questão mais premente que o Brasil precisa equacionar em seu plano é a de justiça climática, porque os impactos serão muito diferenciados, e a população mais carente é aquela mais desprotegida dos impactos da crise do clima.

— Nesse aspecto, a adaptação é muito mais complicada que a mitigação, porque se você atuar numa cidade e não na outra, num bairro e não no outro, num país e não no outro, não se resolve o problema — diz Andre Ferretti, gerente de economia da biodiversidade da Fundação Boticário, que acompanha as negociações como observador na COP há alguns anos. — A expectativa é de que a decisão da COP28 tenha alguma menção a essa justiça social, que basicamente é uma diretriz para que se priorizem os mais vulneráveis.

Mapeamento

O fluxo de financiamento de países ricos para os pobres é vital, mas precisa ser acompanhado de um mapeamento de onde e como aplicar o dinheiro. Isso envolve decisões soberanas de cada país, o que também complica a equação.

O Pnuma calcula que a adaptação à mudança do clima custará entre 0,6% e 1,0% do PIB dos países em desenvolvimento, dependendo da vulnerabilidade. Se o trabalho de adaptar não for feito, a conta passará para a frente de perdas e danos e será muito maior e mais dolorosa, com custo também em vidas humanas.

O Pnuma estima que nos últimos 20 anos, o preço da mudança climática, que já cresceu 1,0°C, foi de US$ 500 bilhões só nos 55 países mais vulneráveis. Mas esse valor tende a aumentar ainda mais enquanto o planeta se aproxima dos 2,0°C excedentes, o que força o investimento em mitigação acelerar também.

Com recursos limitados, diz a ONU, o mundo precisa calcular como distribuir investimentos entre mitigação, adaptação e perdas & danos. Quanto mais cedo a definição dos Objetivos Globais de Adaptação, mais chande de as verbas aplicadas serem eficazes.