Internacional
Hoje pró-anexação, há 10 anos Maduro defendia 'paz e diplomacia' para resolver questão de Essequibo
Referendo sobre anexação do território hoje controlado pela Guiana acontece neste domingo, com amplo apoio da população venezuelana
Venezuelanos votam em referendo convocado para este domingo a anexação do território de Essequibo, região rica em petróleo que faz parte da vizinha Guiana e que Caracas reivindica como seu. A campanha massiva promovida pelo regime de Nicolás Maduro tomou as ruas e as escolas do país, em uma tentativa de vincular a imagem do presidente a um tema que une seus apoiadores e a oposição. Porém, há uma década, com uma opinião totalmente diferente, o líder da Venezuela, dizia que a questão era um "legado do colonialismo britânico e espanhol" que tentava pôr as "duas nações irmãs" em conflito, e que seu país respeitaria o direito internacional acerca do assunto.
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A ocasião era 31 de agosto de 2013, quando Maduro fazia sua primeira visita de Estado à Guiana, à época liderada pelo presidente Donald Ramotar. Em uma coletiva de imprensa, ao ser questionado sobre a briga de mais de cem anos pelo território do Essequibo, o então recém-eleito Maduro rejeitou a ideia de que ainda havia qualquer questionamento sobre a região, e afirmou que a disputa territorial era uma "herança do colonialismo", originada em conflitos entre suas potências colonizadoras europeias.
— Ninguém [pode] nos manipular e ninguém pode erguer bandeiras do ódio e tocar os tambores da guerra. Precisamos ser irmãos (...). Escolhemos o caminho de [Hugo] Chávez: dizer a verdade, buscar a paz e cumprir o direito internacional — dizia Maduro, mencionando seu antecessor, que governou a Venezuela por 14 anos.
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Maduro ainda enfatizou nessa coletiva que, apesar de as questões de fronteira "serem complexas", a Venezuela optou por "abordá-las por meio de paz e diplomacia". Ele também ressaltou a importância de evitar o caminho do ódio, do "chauvinismo e do racismo" na História de seus países, buscando a preservação "do corpo moral das duas nações".
— Quero dizer que esta disputa não é responsabilidade dos povos independentes de hoje. (...) Essas são as feridas abertas da América Latina — disse o venezuelano, referindo-se ao livro de Eduardo Galeano, "As veias abertas da América Latina", de 1971.
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Dez anos mais tarde, a opinião sobre o território mudou de tom. Mesmo após a decisão da Corte Internacional de Justiça (CIJ), na sexta-feira, que acatou o pedido da Guiana para uma intervenção sob a alegação de ameaça à integridade territorial, o governo venezuelano reafirmou que o referendo seria realizado, com Maduro prometendo "defender Essequibo".
As determinações da CIJ foram resultado de um requerimento da Guiana, apresentado em 30 de outubro, em que o país denunciava a consulta popular como uma ação destinada a conquistar validação interna para dar suporte à decisão de Maduro de aplicar medidas unilaterais para anexar o território.
Em resposta, o governo venezuelano declarou que a Guiana saiu perdendo ao apelar ao CIJ, alegando que o mais alto órgão judicial da ONU não tem competência para interferir nas suas decisões domésticas.
A Venezuela reivindica a soberania sobre a região de Essequibo há décadas. A zona de 160 mil km², rica em petróleo e recursos naturais, equivalente a 2/3 do território da Guiana, e abriga 125 mil dos 800 mil habitantes do país.
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Entenda o conflito
A disputa territorial pelo Essequibo, que na prática é administrado por Georgetown, remonta ao século XIX. De um lado, a Guiana se atém a um laudo arbitral de 1899, no qual foram estabelecidas as fronteiras atuais. Do outro, a Venezuela se apoia em sua interpretação do Acordo de Genebra, firmado em 1966 com o Reino Unido, antes da independência guianesa, em que Londres e Caracas concordam em estabelecer uma comissão mista "para buscar uma solução satisfatória", já que o governo venezuelano considerou o laudo de 1899 "nulo e vazio".
No acordo, no entanto, Londres apenas reconheceu esse posicionamento de Caracas, mas não respaldou sua interpretação de que o laudo arbitral de 1899 não tinha validade.
Sem solução, a questão foi parar nas mãos da CIJ em 2017, por definição do secretário-geral da ONU, António Guterres, que se valeu da prerrogativa estabelecida pelo próprio Acordo de Genebra no caso de as partes não chegarem a um entendimento.
A briga ganhou novos capítulos após descoberta, em 2015, de grandes reservas de petróleo na região. A Guiana iniciou licitações para explorar campos petrolíferos em águas rasas e profundas em 2022, o que Caracas rejeitou, considerando-as ilegais.
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