Internacional

Xi e Biden se encontrarão na semana que vem para tentar estabilizar laços após um ano de tensões

Encontro deverá abordar temas espinhosos entre as duas potências, como a ilha de Taiwan, e ocorre após um ano recheado de tensões; expectativa dos analistas é baixa em relação a avanços significativos

Agência O Globo - 10/11/2023
Xi e Biden se encontrarão na semana que vem para tentar estabilizar laços após um ano de tensões
Xi e Biden - Foto: Reprodução

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o presidente da China, Xi Jinping, planejam se reunir na próxima quarta-feira, na Baía de São Francisco, na Califórnia, em uma tentativa de estabilizar as recentes tensões entre as superpotências rivais — ainda que a conversa envolva temas espinhosos.

O anúncio foi feito formalmente pelo governo americano nesta sexta-feira. Os Estados Unidos sediam este mês a cúpula do Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, que inclui a China e outros 20 países. O Ministério das Relações Exteriores da China confirmou a ida de Xi ao evento, informando que ele viajará para São Francisco de 14 a 17 de novembro.

"O nosso objetivo será tentar tomar medidas que estabilizem de fato as relações entre os Estados Unidos e a China, eliminar alguns pontos de desentendimento e abrir novas linhas de comunicação", disse um alto funcionário do governo americano à AFP, sob condição de anonimato.

Este será o segundo encontro entre os dois líderes desde que Biden assumiu o cargo, em janeiro de 2021, e a sétima conversa entre eles desde então. Também será a primeira visita de Xi aos Estados Unidos desde 2017.

O interesse pelo encontro já havia sido manifestado por Biden em agosto. A última vez que os líderes das maiores potências mundiais se encontraram pessoalmente foi durante a reunião do G20 em novembro do ano passado, em Bali, onde concordaram em trabalhar para diminuir a tensão entre os países.

Os funcionários garantem que Biden entrará na conferência com expectativas concretas e afirmam que não esperam uma longa lista de resultados, segundo a CNN.

A conversa deverá abordar, por exemplo, o restabelecimento da comunicação militar entre as duas potências, além de conversas sobre os principais conflitos internacionais — a guerra na Ucrânia e o conflito entre Israel e Hamas. Pequim tem uma relação comercial e diplomática próxima ao Irã, um país que ajuda a apoiar o grupo terrorista Hamas e outras milícias armadas no Oriente Médio, enquanto Biden deverá sublinhar a Xi que os Estados Unidos responderão a qualquer expansão da guerra causada por Teerã.

Na questão do meio ambiente, a conversa deve tocar áreas para uma cooperação frente às mudanças climáticas. Temas como o tráfico de drogas internacional e direitos humanos também entrarão na pauta.

Biden também espera abordar as disputas em torno do Mar do Sul da China. Nesta sexta-feira, as Filipinas acusaram Pequim de "assédio perigoso" na região. O incidente ocorre duas semanas depois que um barco da guarda costeira chinesa e um navio chinês colidiram com embarcações filipinas. O encontro foi um dos mais hostis em mais de 20 anos de disputa pela área.

Outro tema central é Taiwan, região autônoma que a China considera como parte de seu território. A ilha deverá realizar eleições no início do ano que vem, e as autoridades americanas disseram que Biden falará abertamente sobre suas preocupações de que Pequim não interfira no pleito. Espera-se também que Biden advirta o homólogo contra a interferência nas próprias eleições americanas, também no ano que vem.

Biden e Xi se conhecem bem desde quando ambos eram vice-presidentes, mas uma série de declarações recentes do presidente americano irritaram Pequim. Em agosto, Biden afirmou que a China era uma "bomba-relógio", referindo-se a seus problemas econômicos, e classificou Xi como um "ditador". Também restringiu o investimento dos EUA em setores de alta tecnologia na China e proibiu a exportação de microchips de última geração, medida que Pequim considera uma violação dos princípios do livre comércio. A cúpula realizada em agosto entre Biden e os líderes da Coreia do Sul e do Japão também foi um dos pontos de atrito entre as potências.

Durante reunião do Conselho de Segurança da ONU em setembro, porém, Biden fez menções às disputas com Pequim de maneira branda, destacando que a competição com a China não tirou dos EUA a capacidade de cooperar em temas de interesse comum, como a regulação da inteligência artificial.

Contornando a tensão

O último encontro entre os líderes, em Bali, também foi rigidamente planejado. Desde então, os dois chefes de Estado não se falaram e o ano passado pôs as relações à prova. Em fevereiro, um balão espião chinês que sobrevoou os Estados Unidos antes de ser abatido por um caça americano desencadeou uma crise diplomática. Poucos meses depois, a China recusou um convite para uma reunião, em Cingapura, entre o secretário de Defesa americano, Lloyd Austin, e o então ministro da Defesa chinês, Li Shangfu. Recentemente, novas tensões vieram à tona, em torno de questões como a espionagem chinesa e as restrições dos EUA às exportações de tecnologia para a China.

Os conselheiros de Biden afirmam que os pontos de conflito serão abordados, mas que os países entendem a importância de fortalecer os laços entre as duas maiores economias do mundo. Biden já enviou este ano vários altos funcionários — incluindo o secretário de Estado, Antony Blinken, a secretária do Tesouro, Janet Yellen, e a secretária de Comércio, Gina Raimondo — à China para tentar deixar claro que, embora os Estados Unidos queiram proteger a segurança nacional, não pretendem cortar os laços econômicos.

Nesta quinta-feira, o embaixador da China nos Estados Unidos, Xie Feng, disse em vídeo, durante o Fórum de Hong Kong sobre as Relações EUA-China, que Pequim queria garantias de que "Washington não pretende mudar o sistema da China, não quer nova Guerra Fria e não apoia a independência de Taiwan".

"As relações sino-americanas ainda enfrentam grandes desafios e há um longo caminho a percorrer para estabilizar e melhorar as relações", disse Xie no evento.

Avanços realistas

Para especialistas, a reunião não deve produzir avanços significativos nas questões mais espinhosas, como Taiwan, a questão dos direitos Humanos na China e a exportação de tecnologia americana.

"Não haverá nada que leve a relação a uma direção diferente", disse Oriana Skylar Mastro, membro do Instituto Freeman Spogli de Estudos Internacionais da Universidade de Stanford, ao New York Times.

Para além do encontro com Biden, espera-se também que Xi concentre grande parte do seu tempo na Califórnia mostrando aos líderes da indústria americana que o país está aberto aos negócios. O presidente chinês deverá falar com os principais executivos americanos num jantar com pratos a US$ 2 mil (cerca de R$ 10 mil), como parte de um "Summit de CEOs" que ocorrerá em paralelo ao evento principal. (Com New York Times)