Internacional

Além das guerras em Israel e Ucrânia, veja outras guerras e conflitos vividas no mundo

Instabilidade política em países como a Síria, Iêmen, República Democrática do Congo e Haiti deixaram milhares de mortos e seguem em andamento

Agência O Globo - 20/10/2023
Além das guerras em Israel e Ucrânia, veja outras guerras e conflitos vividas no mundo

Entrando no 14º dia da guerra entre Israel e o grupo extremista armado Hamas, o conflito já é um dos mais graves da História da região, que enfrenta escassez de suprimentos e levou ao deslocamento de milhares de palestinos e uma força-tarefa para evacuar estrangeiros. Enquanto isso, no continente vizinho, a invasão russa à Ucrânia completa mais de um ano e meio sem resolução, com o apoio de atores internacionais e da Organização das Nações Unidas (ONU) na tentativa de encontrar um caminho para um cessar-fogo.

Mas, apesar de a guerra em Israel estar sob os holofotes, existem hoje vários países envolvidos em conflitos armados ao redor do mundo — muitos deles há várias décadas.

Síria

A guerra civil síria, que começou em 2011, já deixou mais de 400 mil mortos, arrasou cidades e envolveu vários países estrangeiros. Mais de 200 mil pessoas estão desaparecidas e, além dos milhares de mortos, o conflito provocou um grande êxodo, reduzindo a população síria de 21 milhões, em 2010, para 17 milhões em 2019.

Antes dos terremotos que deixaram milhares de mortos na Síria e na Turquia, no começo deste mês, o país já era o que tinha o maior número de deslocados no mundo: são 15 milhões de pessoas que precisam de ajuda humanitária, após 12 anos de guerra civil.

A guerra começou depois que manifestações pró-democracia eclodiram na cidade de Deraa, no Sul, inspiradas pela Primavera Árabe, em março de 2011. Quando o governo do presidente Bashar al-Assad usou força letal para esmagar a dissidência, protestos exigindo sua renúncia eclodiram em todo o país. As manifestações, inicialmente pacíficas, se transformaram em uma guerra civil de grande escala.

Com mais de 40 mil mortos, sobreviventes do terremoto ainda são encontrados sob escombros entre Turquia e Síria.

Iêmen

Nove anos após o início na guerra no Iêmen, que já deixou 233 mil mortos, mais da metade deles por desnutrição e ausência de serviços de saúde e infraestrutura, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) estima que 21,6 milhões de pessoas — o equivalente a dois terços da população precisarão de ajuda humanitária e proteção em 2023.

Desde 2014, o país vive mergulhado num conflito entre os rebeldes xiitas houthis, próximos ao Irã, e as forças do governo, apoiadas por uma coligação militar liderada pela Arábia Saudita. Uma trégua de seis meses no conflito foi iniciada em abril de 2022, o que permitiu uma redução das vítimas civis. Agora, o governo iemenita e os houthis tentam negociar um prolongamento do fim das hostilidades, que expirou em outubro do ano passado.

A ausência de uma trégua oficial e a frágil situação política e de segurança, no entanto, deixam a população num limbo. Hoje, os houthis controlam a capital, Sanaa, e grandes extensões de território no Norte e Oeste do país.

Segundo a ONU, 5 milhões de iemenitas estão à beira da fome, e 2,3 milhões de crianças menores de cinco anos sofrem de desnutrição aguda, incluindo 400 mil que correm o risco de morrer sem tratamento. Em nove anos de guerra, mais de 10 mil crianças morreram como consequência direta dos combates.

Sudão

Desde 2003, o Sudão enfrenta um conflito na região de Darfur, com um levante de rebeldes não-árabes da região, que alegavam marginalização pelo governo. Nos 20 anos de embates, foram registradas cerca de 300 mil mortes e mais de 2 milhões de pessoas deslocadas.

Em resposta, o governo mobilizou milícias conhecidas como Janjaweed para atacar os rebeldes e civis suspeitos de apoiar os rebeldes. Os Janjaweed foram acusados ​​de cometer crimes de guerra, incluindo violação, tortura e homicídio. Em 2019, eclodiram protestos em todo o país, resultando na derrubada do presidente Omar al-Bashir, que estava no poder há três décadas.

Em outubro de 2021, porém, militares deram um golpe de Estado e tomaram o poder após prender o então primeiro-ministro interino, Abdallah Hamdok, em outubro de 2021. Desde então, o país é governado por uma junta militar, em que passou a ter conflitos internos entre o presidente e o vice-presidente, em disputa por poder.

No centro dos confrontos estão o líder da Forças Armadas Sudanesas, Abdel Fattah al-Burhan, e o comandante das Forças de Apoio Rápido (RSF, na siga em inglês) paramilitares, Mohamed Hamdan Dagalo.

República Democrática do Congo

Deslocados da guerra fogem para a cidade de Goma, leste da República do Congo. Milhares começaram a fugir depois que soldados se retiraram para Kanyarushinya, um acampamento informal de mais de 40.000 pessoas no distrito norte de Goma — Foto: ALEXIS HUGUET/AFP

Deslocados da guerra fogem para a cidade de Goma, leste da República do Congo. Milhares começaram a fugir depois que soldados se retiraram para Kanyarushinya, um acampamento informal de mais de 40.000 pessoas no distrito norte de Goma — Foto: ALEXIS HUGUET/AFP

A República Democrática do Congo (RDC) é um dos países mais pobres do mundo. No Leste do país, área mais violenta, cerca de 120 milícias atuam nas províncias de Kivu do Norte, Kivu do Sul e Ituri. No último ano, os ataques se intensificaram apesar da presença de 18 mil soldados das forças de paz da ONU. Os conflitos provocaram a migração de mais de 521 mil pessoas desde março do ano passado.

Hoje, o grupo rebelde que está no centro da violência atual é o Movimento 23 de Março, ou M23. A RDC, as Nações Unidas e os Estados Unidos acusaram Ruanda de apoiar o grupo, o que é negado repetidamente pelo governo ruandês. Os ataques do M23 escalaram após o governo congolês não honrar um acordo de 2009 que deveria integrá-los ao Exército. Como consequência, o grupo tomou cidades e vilas inteiras e, segundo ONGs de direitos humanos, bombardeou áreas civis e militares.

O ressurgimento do M23 aumentou as tensões entre o Congo e Ruanda e a ameaça de uma guerra generalizada na região. Autoridades congolesas acusam Ruanda de querer saquear os recursos minerais da nação, ao mesmo tempo em que protestos ocorrem em cidades do Leste. A hostilidade entre os países também levou a um aumento do discurso de ódio e da discriminação contra falantes da língua Kinyarwanda, falada em Ruanda, dentro da RDC, alertaram as Nações Unidas.

A Etiópia enfrenta uma guerra civil desde 2020, com a tomada da região de Tigré, comandada pela Frente para a Liberação do Povo do Tigré (TPLF), pelas forças militares etíopes, em novembro de 2020. O conflito se espalhou para outras regiões do país, que tem um histórico de atritos por ser um país fragmentado etnicamente.

Durante os quase três anos da guerra civil, pelo menos 600 mil morreram, de acordo com o porta-voz da União Africana, o presidente da Nigéria Olusegun Obasanjo. O conflito foi acentuado por uma crise econômica, papel de países vizinhos no confronto e a fragilidade da democracia do país. Apesar de o governo central da Etiópia ter declarado um cessar-fogo na região do Tigré e aberto diálogo com a TPLF, ainda não há estabilidade no país.

Afeganistão

Os ataques de 11 de Setembro de 2001, que deixaram quase 3 mil mortos nos EUA, desencadearam uma série de guerras e intervenções no Oriente Médio, a chamada "Guerra ao Terror", que tinha como alvo principal Osama bin Laden, líder da al-Qaeda. Após ultimatos ao Talibã para que entregasse bin Laden, grupo extremista que então governava o Afeganistão, a coalizão internacional liderada pelos EUA começou a bombardear o país, tirou o grupo extremista do poder e expulsou a al-Qaeda temporariamente.

Mas a tentativa de construir um Exército afegão confiável se transformou em um fiasco com uma conta de US$ 83 bilhões: foram de 60 mil mortes entre as forças de segurança afegãs e quase o dobro de mortes civis. Nos EUA, mais de 2,3 mil militares americanos morreram e mais de 20 mil ficaram feridos.

Após quase 20 anos de guerra, as forças americanas se retiraram do Afeganistão em agosto de 2021, abrindo espaço para a volta do Talibã. À época, o grupo extremista, que governou o Afeganistão entre 1996 e 2001, se mostrava disposto a rever algumas de suas posições passadas e se abrir para o mundo. Um ano e meio depois, o Talibã se mostrou o mesmo de sempre: manteve o veto à participação de mulheres na sociedade e a perseguição de minorias étnicas e religiosas.

Líbia

O país do Norte da África enfrenta uma aguda guerra civil desde 2011, com a derrubada do ex-presidente Muammar Gaddafi no contexto da Primavera Árabe. O conflito envolve atores governamentais, milícias e facções políticas, que disputam o poder em embates marcados pela violência, pela instabilidade política e pelo envolvimento de atores estrangeiros.

As principais partes no conflito são o Governo de Acordo Nacional (GNA) reconhecido pela ONU e o Exército Nacional Líbio (LNA), liderado pelo general Khalifa Haftar, que é apoiado por vários países estrangeiros. O conflito levou a milhares de mortes e de deslocamentos, com implicações regionais e globais. Apesar dos numerosos esforços internacionais para resolver o conflito, a guerra civil continua sem resolução, com eventuais surtos e ataques.

Mianmar

O país enfrenta uma grave crise desde o golpe de Estado de fevereiro de 2021, quando uma junta militar derrubou o governo da Prêmio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, e decretou um estado de emergência em vigor até os dias de hoje.

Desde então, mais de 2.900 pessoas morreram na repressão militar contra os dissidentes e mais de 18 mil foram detidas. Suu Kyi, de 76 anos, foi condenada a um total de 33 anos de prisão, em um processo que grupos de defesa dos direitos humanos tacharam de "farsa".

No segundo aniversário do golpe, no começo deste mês, a junta militar que governa o país prolongou por seis meses o estado de emergência, o que implica no adiamento das eleições que estavam marcadas para agosto.

Somália

O país africano vive uma guerra civil desde 1991, após o colapso do governo central do país, e agora está envolto em disputa por poder envolvendo diversos atores como o Governo Federal de Transição (GFT), a União dos Tribunais Islâmicos (UCI) e o grupo militante al-Shabaab.

O conflito levou à violência generalizada, ao deslocamento e a crises humanitárias, e continuam até hoje. A União Africana e as Nações Unidas destacaram forças de manutenção da paz para a Somália para apoiar o GFT e combater o al-Shabaab, mas o não foi encontrado um desfecho para a crise vivida no país há décadas.

Haiti

O Haiti vive uma crise política de enormes proporções desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse, morto dentro de casa em Porto Príncipe, em julho de 2021. Ariel Henry, que assumiu após o magnicídio, tem sua legitimidade no posto questionada de forma recorrente, e a ausência de eleições paralisou o Legislativo. Desde então, o país vive um vazio político que deu às gangues ainda mais poder.

Os grupos armados controlam hoje mais de 60% da capital, Porto Príncipe, onde cerca de 4,7 milhões de pessoas enfrentam fome aguda. Um levantamento da ONU divulgado no ano passado deu a dimensão do impacto da violência promovida pelas gangues: só em 2022, mais de 1.400 pessoas foram mortas e mais de mil foram raptadas ou feridas.

Sem Parlamento em atividade na prática, o Tribunal de Justiça também não funciona por falta de juízes, cujos nomes devem ser aprovados pelo Legislativo. Há ainda as disputas entre a Polícia Nacional e o Exército, que não conseguem combater as gangues nas ruas. No ano passado, a ONU descreveu uma "catástrofe humanitária" em curso no país.

Em janeiro deste ano, três haitiano-americanos e um colombiano foram extraditados para os Estados Unido por seu papel no assassinato de Moïse.