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Equador: Daniel Noboa surpreende, realiza sonho do pai e derrota correísmo

Filho de bilionário do ramo bananeiro se apresentou como de centro-esquerda — embora analistas apontem candidatura de centro-direita — e venceu favorita de Rafael Correa que liderou o 1º turno

Agência O Globo - 16/10/2023
Equador: Daniel Noboa surpreende, realiza sonho do pai e derrota correísmo

Daniel Noboa era pouco mais do que uma incógnita com um sobrenome conhecido quando surpreendeu a todos e conquistou uma vaga no 2º turno das eleições presidenciais do Equador, após a primeira votação realizada em agosto. O jovem e rico empresário voltou a chocar o mundo político neste domingo, quando venceu a candidata correísta Luisa González. Aos 35 anos, Noboa se torna o presidente mais jovem da história do país sul-americano, e impõe uma dura derrota ao dominante grupo político do ex-presidente Rafael Correa.

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Noboa venceu as eleições a frente de uma aliança formada pelo Movimento Povo Igualdade e Democracia e o partido Mover, do ex-presidente Lenín Moreno. Apesar de se autodenominar de centro-esquerda, o empresário — filho de um bilionário — notabilizou-se pela defesa da liberdade, sobretudo liberdade de empresa e liberalismo econômico, colocando-o à direita da candidata correísmo e fazendo analistas equatorianos classificarem-no como um candidato de centro-direita.

Neto de um avô que saiu da pobreza e fez fortuna com o cultivo de bananas e filho de um bilionário, Álvaro Noboa, que concorreu à Presidência do Equador cinco vezes, sem sucesso, Daniel venceu a eleição fazendo o papel do outsider (embora fosse um deputado com mandato na Assembleia Nacional). Bem articulado, formado em uma das melhores universidades dos EUA e sempre com um semblante tranquilo, o empresário chamou a atenção pelo forte discurso anticorrupção e contra a violência e o crime organizado, em um pleito que ficou marcado pelo assassinato do candidato Fernando Villavicencio. O colete a prova de balas se tornou uma peça de vestimenta obrigatória em suas aparições públicas.

Inicialmente, o plano de Noboa era concorrer à Presidência nas eleições presidenciais de 2025. Contudo, com a "morte cruzada" decretada pelo presidente Guilherme Lasso, precisou antecipar os planos. Ele terá apenas 16 meses (o resto do mandato previsto para Lasso) para tentar apresentar alguma melhora a um eleitorado fustigado pela violência do crime organizado e por dificuldades econômicas antes de tentar a reeleição em 2025.

Noboa acompanhou a apuração das urnas de sua casa de praia em Olón, na província de Santa Elena, que representou na Assembleia Nacional em 2021 - e onde disse que passaria os fins de semana brincando com seus cachorros e deixando sua esposa mais feliz caso o Equador não tivesse os problemas que o fizeram entrar para a vida política. Em um pronunciamento, ele prometeu "reconstruir um país que foi gravemente pela violência, pela corrupção e pelo ódio".

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A missão não será fácil. Noboa assumirá um país que está perto de acumular uma taxa de 40 homicídios por 100 mil habitantes, o que o tornaria a nação mais violenta da região. Enquanto isso, as perspectivas de crescimento da economia para este ano são muito inferiores às esperadas no início de 2023, e ainda piores do que as projetadas para o próximo ano, onde deve crescer apenas 0,8%.

Embora a vitória de Noboa represente uma derrota sofrida para Luisa González, que aos 45 anos tinha uma carreira política mais expressiva que a do jovem candidato, o principal derrotado na noite de domingo, para os analistas, foi Rafael Correa, figura sobre a qual a política equatoriana orbita nas últimas décadas. A morte cruzada decretada por Lasso foi fortemente influenciada por um movimento de sua Revolución Ciudadana para denunciar o presidente por corrupção, e o momento político era visto como favorável pelas lideranças do partido.

Correa estava convencido, em maio, que a vitória de seus aliados seria um passeio no parque. Ele tinha vencido as eleições locais, em fevereiro, e o descrédito do governo conservador e de direita era visto como um bom sinal para os socialistas. O começo da campanha, por outro lado, mostrou que o ex-presidente perdeu destaque nacionalmente. Se as últimas cinco eleições presidenciais haviam sido pautadas por disputas entre o correísmo e o anticorreísmo, os candidatos da oposição ignoraram o nome de Correa. Noboa, por exemplo, quase não o mencionou ou procurou apoio de inimigos declarados do rival para impulsionar a sua candidatura.

A própria Luisa González, escolhida pelo próprio ex-presidente e que garantiu que ele seria um conselheiro do governo no começo da campanha, tentou sem sucesso afastar-se no final da corrida eleitoral, em burca dos votos dos indecisos - em uma prova de que a leitura dos estrategistas era de que o eleitorado correísta puro seria insuficiente para uma vitória.

Do México, um dos poucos países que o político condenado por corrupção em seu país pode visitar sem medo de extradição, Correa viveu uma noite triste. Embora ele tenha começado a brincar no Twitter com as pesquisas de boca de urna que deram a vitória a Noboa, a realidade dos fatos logo o fez ficar em silêncio. Os resultados oficiais confirmaram o que as pesquisas já vinham mostrando: a maioria do Equador não quer mais o correísmo.

O revés arruína um plano cuidadosamente elaborado pelo ex-presidente, que vive na Bélgica desde 2017, para evitar a prisão no Equador por uma condenação por corrupção em 2020, que considera uma armação. Esse caminho envolvia posicionar um escudeiro fiel na Presidência, neste caso González, para uma vez no poder convocar uma Assembleia Constituinte e declarar inválido o referendo de 2018 que impede a reeleição. Então, ele poderia concorrer novamente.

(Com El País e La Nación)