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Armênia diz que quase metade da população de Nagorno-Karabakh fugiu após ofensiva do Azerbaijão

Mais de 50 mil pessoas deixaram o enclave e buscaram abrigo no território armênio; Aumenta temor de uma crise de refugiados

Agência O Globo - 27/09/2023
Armênia diz que quase metade da população de Nagorno-Karabakh fugiu após ofensiva do Azerbaijão

A Armênia afirmou nesta quarta-feira que quase metade da população de Nagorno-Karabakh abandonou a região desde a ofensiva relâmpago do Azerbaijão na semana passada, que sufocou o ímpeto independentista dos separatistas armênios. Mais de 50 mil pessoas fugiram do enclave e buscaram refúgio na Armênia, segundo números atualizados divulgados pelas autoridades de Ierevan.

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A operação militar do Azerbaijão no enclave deixou mais de 400 mortos entre os dois lados. Até a semana passada, 120 mil armênios viviam Nagorno-Karabakh, reconhecido pela comunidade internacional como parte do Azerbaijão. Ao mesmo tempo, quase 100 pessoas foram declaradas desaparecidas após a explosão de um depósito de combustíveis na noite de segunda, outra tragédia no enclave com pelo menos 68 mortes confirmadas e 290 feridos.

No domingo, o Azerbaijão abriu para circulação a única estrada que liga Nagorno-Karabakh à Armênia, quatro dias após a rendição dos separatistas e da assinatura de um acordo de cessar-fogo que deu a Baku o controle da região. A Armênia, majoritariamente cristã, e o Azerbaijão, predominantemente muçulmano, travaram duas guerras na região de Nagorno-Karabakh desde o colapso da União Soviética em 1991.

Em meio ao êxodo, os guardas de fronteira do Azerbaijão tentam detectar supostos "criminosos de guerra" entre os refugiados, afirmou à AFP uma fonte do governo de Baku. Nesta quarta-feira, um ex-líder separatista armênio, Ruben Varadanyan, que comandou o governo separatista de Nagorno-Karabakh de novembro de 2022 a fevereiro deste ano, foi detido quando seguia para a Armênia pela rodovia, anunciaram autoridades do Azerbaijão.

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Crise de refugiados

A cidade fronteiriça de Goris, onde a maioria dos refugiados faz a sua primeira parada, está quase irreconhecível. Centenas de carros invadiram as ruas, onde reina o caos. A polícia não consegue direcionar o trânsito e muitos refugiados passam a noite em seus veículos, sem ter o que comer. A maioria explicou que não tinha onde dormir ou para onde seguir na Armênia.

Alekhan Hambardzyumyan, de 72 anos, dormiu em sua van. Ele disse que escapou por pouco de um bombardeio quando foi procurar seu irmão, ferido na frente de batalha em 20 de setembro. Seu filho morreu nos últimos combates, que deixaram 213 mortos entre os separatistas armênios. Do outro lado, o Azerbaijão informou que 192 soldados e um civil morreram na operação militar.

— Quero ir para Ierevan, mas não sei o que o Estado pode me oferecer — desabafou Hambardzyumyan

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O primeiro-ministro armênio, Nikol Pashinyan, disse estar disposto a acolher 40 mil refugiados no país de 2,9 milhões de habitantes. Mas até o momento o governo conseguiu alojar apenas 2.850 pessoas — o que aumenta o temor de uma nova crise humanitária.

— A Armênia não tem recursos para administrar a crise dos refugiados e não o conseguirá sem ajuda externa — avaliou o analista político Boris Navasardyan em entrevista à AFP. — [A situação] Terá graves repercussões no cenário político, em meio ao descontentamento generalizado — previu.

Influência de Moscou

Nos últimos dias foram registradas manifestações em Ierevan contra o primeiro-ministro, a quem parte da população acusa de adotar uma atitude passiva em relação ao Azerbaijão. Nikol Pashinyan também precisa lidar com a Rússia, que tem uma importante base militar na Armênia, embora a influência de Moscou no Cáucaso tenha diminuído desde a invasão da Ucrânia.

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O líder armênio culpou implicitamente Moscou por não ter oferecido apoio suficiente. O premier declarou que as atuais alianças de Ierevan, especialmente com a Rússia, são "ineficazes", o que foi contestado pelo Kremlin.

O presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, prometeu que os direitos dos armênios que decidirem permanecer no enclave, anexado ao país em 1921 pela União Soviética, serão "garantidos".

Na terça-feira, o chefe da diplomacia americana, Antony Blinken, fez um apelo e pediu proteção para os civis. Nesta quarta, a chanceler alemã, Annalena Baerbok, pediu a Baku que autorize a entrada de observadores internacionais no enclave.