Internacional
Uma pessoa morre a cada quatro dias sem ser julgada nas prisões de El Salvador
Enquanto o presidente Nayib Bukele proclama ao mundo o sucesso da sua estratégia de segurança pública, histórias de tortura e morte atrás das grades são cada vez mais comuns
Uma pessoa morreu a cada quatro dias sem julgamento nas prisões salvadorenhas desde o início do regime de emergência, decretado pelo presidente Nayib Bukele, em março de 2022. No total, 188 detidos teriam morrido sob custódia do Estado no período, de acordo com um relatório da Assistência Jurídica Humanitária (SJH na sigla em espanhol), com base em centenas de entrevistas com familiares de presos, advogados e fontes internas do sistema penitenciário, do Ministério Público e da Polícia Nacional.
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As mortes, esclarece Ingrid Escobar, do SJH, correspondem apenas a pessoas que estão em fase de investigação e não foram julgadas, desde o início do regime extraordinário. É uma lista diferente das 400 mortes de pessoas já condenadas, número que o governo reconhece.
O documento confirma centenas de queixas de organizações internacionais sobre a deterioração da democracia e dos direitos humanos no país desde que Bukele tomou posse, em junho de 2019.
O avô de Juan José (nome fictício) é uma das possíveis vítimas. O agricultor, de 67 anos, foi detido em de 2022, quando a família saía para trabalhar em uma fazenda. Todos foram levados para a Penitenciária de Izalco, uma das prisões mais utilizadas pelo governo Bukele. Ninguém teve notícias dele desde junho de 2022, quando ele foi separado do grupo. A família e os advogados que cuidam do caso suspeitam que o avô de Juan José esteja morto.
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— Era um homem de 67 anos que chegou à prisão com doenças como hipertensão e diabetes — disse um advogado ao site Infobae. — Juan José nos disse que bateram muito em seu avô, que teve falta de ar duas vezes.
Pelo menos três advogados particulares designados para o caso por uma organização de assistência jurídica civil, solicitaram pareceres de peritos, audiências especiais e uma revista corporal para determinar se o avô de Juan José ainda está vivo. As autoridades judiciais salvadorenhas, a maioria das quais normalmente decidem a favor dos casos apresentados pelo Ministério Público — controlado pelo Executivo —, recusaram categoricamente.
O relatório do SHJ classifica 40% das mortes em prisões como homicídios e atribui 31% à negligência médica, como falta de cuidados adequados para doenças, infecções, sangramentos ou ferimentos. Apenas duas das mortes, segundo o documento, foram causadas por doenças terminais.
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De acordo com um alto funcionário do gabinete de segurança de Bukele, que falou ao Infobae sob condição de anonimato, o número real poderia ser de cerca de 300 vítimas fatais no período. Segundo a fonte, o Instituto de Medicina Legal realizou 250 exames em corpos de pessoas não condenadas nas prisões salvadorenhas desde o início do regime de emergência. Outras fontes, na Procuradoria-Geral da República e outras instituições, falam em até 500 óbitos.
Sem apresentar dados específicos, o ministro da Segurança de Bukele, Gustavo Villatoro, negou todos os números em entrevistas, dizendo que a grande maioria das mortes se deve “a condições médicas anteriores”.
Segundo o Instituto de Medicina Legal, também controlado por Bukele, apenas 73 pessoas morreram no sistema prisional de março de 2022 até o final de agosto deste ano. E segundo Osiris Luna, chefe das prisões salvadorenhas, “todas” as pessoas morreram de doenças que já tinham quando foram presas.
Crimes contra a Humanidade
Para a advogada Zaira Navas, da organização Cristosal, há provas suficientes para que o Estado salvadorenho e funcionários do governo Bukele possam eventualmente ser julgados por crimes contra a Humanidade.
Apesar dos números, no entanto, a política de segurança pública de Bukele, incluindo o encarceramento em massa, mortes não investigadas em prisões, possíveis torturas ou violações do devido processo legal, contam com uma popularidade altíssima em El Salvador, onde entre 80% e 90% da população apoia o presidente e suas políticas.
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Em discurso na Assembleia Geral da ONU, em Nova York, na semana passada, Bukele defendeu seus métodos.
— Reiteramos o nosso direito de tomar as nossas próprias decisões e o nosso direito de estar certos. “Mudamos as leis para garantir que os terroristas não voltassem às ruas — disse.
Até agora, o governo já libertou cerca de 7 mil pessoas das quase 72 mil presas durante o regime de emergência. Boa parte deles, afirma a Assistência Jurídica Humanitária, sofreu espancamentos e humilhações apesar de serem inocentes.
— Sei que há muitas pessoas que apoiam estas medidas, mas imagino que sejam pessoas que nunca estiveram presas, nem tiveram um familiar preso — lamenta Juan José, que ficou detido por 15 meses e foi torturado várias vezes. — Me espanto como aqueles que trabalham no governo conseguem ter a consciência tranquila quando o que fazem é matar muitas pessoas.
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