Internacional
Biden recebe Zelensky na Casa Branca em meio ao aumento de cansaço com guerra na Ucrânia
Presidente ucraniano viajou a Washington em busca de mais financiamento americano no momento em que sua contraofensiva caminha a passos lentos e escândalos de corrupção acendem alerta do Ocidente
O líder ucraniano, Volodymyr Zelensky, e o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, se reuniram nesta quinta-feira na Casa Branca pela segunda vez desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022. Durante o encontro, o governo americano anunciará um novo pacote de assistência militar que inclui reforços para a defesa aérea do Pentágono, embora tenha rejeitado a entrega dos mísseis de longo alcance ATACMS (sigla para Sistema de Mísseis Táticos do Exército) solicitados por Kiev.
O presidente ucraniano classificou o encontro como "muito importante" a repórteres e agradeceu o governo americano por ajudar o país a combater o "terrorismo russo".
— Hoje estou em Washington para fortalecer nossa coalizão em defesa das crianças ucranianas, das famílias, de nossos lares, da liberdade e da democracia no mundo. E comecei meu dia no Congresso dos EUA para agradecer a seus membros e ao povo americano por seu grande e enorme apoio — disse Zelensky.
Durante a coletiva conjunta entre os líderes, Biden disse que se certificaria de que o mundo continuaria ao lado da Ucrânia na guerra.
Zelensky voou para Washington após participar da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, com uma recepção mais tímida do que a anterior — símbolo do crescente cansaço em relação ao conflito devido aos avanços inexpressivos no campo de batalha e às recentes denúncias de corrupção envolvendo recursos doados pelo Ocidente.
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Antes de se reunir com Biden, Zelensky foi ao Pentágono, sede do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, onde conversou com o secretário de Defesa, Lloyd J. Austin III, e visitou o memorial dedicado às vítimas do 11 de setembro.
Em seguida, Zelensky se encontrou com parlamentares, incluindo o presidente da Câmara, o republicano Kevin McCarthy, no Capitólio — a chave para a manutenção do apoio financeiro do país. Na terça-feira, o líder da Casa adotou um tom duro ao questionar a prestação de contas dos recursos destinados a Kiev, em um aceno à ala mais extremista do partido que se opõe à ajuda à Ucrânia.
— Onde está a prestação de contas pelo dinheiro que já gastamos? — disse McCarthy a repórteres na terça. — Qual é o plano para a vitória? Acho que é isso que o público americano quer saber.
Nos bastidores, porém, a postura foi mais amena. Segundo o deputado Michael McCaul, republicano do Texas, McCarthy perguntou a Zelensky o que ele precisava para vencer a guerra, além de pedir que ele endereçasse as preocupações do Congresso americano sobre a responsabilidade nas contas e compartilhasse um plano para a vitória — instrumentos que usaria para convencer seus correligionários a continuarem apoiando a Ucrânia.
A visita ocorre em um momento em que as pesquisas detectam um cansaço crescente com a guerra entre o público americano, que está centrado nos problemas internos, e enquanto dezenas de republicanos dizem que se opõem às doações a Kiev.
O presidente ucraniano teme um enfraquecimento do apoio fundamental dos EUA, sobretudo, no caso da vitória de um candidato republicano na eleição presidencial ano que vem.
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Lentidão na contraofensiva
De acordo com John Kirby, o porta-voz da Casa Branca, Biden tenta obter de Zelensky uma “perspectiva de campo de batalha” sobre a guerra durante a reunião. O apoio à Ucrânia é uma peça central da política externa do presidente americano, que continuou a fornecer ajuda usando fundos previamente aprovados, e o secretário de Defesa anunciou esta semana que os tanques americanos M1 Abrams chegariam em breve à Ucrânia.
Em paralelo aos encontros diplomáticos nos EUA, Moscou lançou um bombardeio nesta quinta-feira com mísseis contra várias cidades, incluindo Kiev, em um dos ataques simultâneos com maior distribuição territorial, deixando dois civis mortos.
Em contrapartida, o governo ucraniano anunciou que atingiu uma base aérea russa na Crimeia. "Na noite de 21 de setembro, as Forças de Defesa da Ucrânia lançaram um ataque combinado à base aérea militar na cidade de Saky, na temporariamente ocupada Crimeia", diz o aviso publicado pelos militares nas redes sociais.
Em um momento de desgaste e guerra de atrito no solo, os ataques aéreos se tornaram a principal ferramenta ofensiva de Moscou e Kiev para atingir posições além das linhas inimigas. A Ucrânia tem feito lobby para que os EUA forneçam mísseis ATACMS, que John Kirby, o porta-voz da Casa Branca, disse não estar fora de questão.
O ATACMS, que pode atingir alvos a 300 km de distância com uma ogiva contendo cerca de 375 quilos de explosivos, poderia ajudar Kiev a recuperar a Crimeia, uma parte do país que a Rússia conquistou em 2014. Mas os Estados Unidos expressaram receios sobre uma escalada.
— Estamos tentando evitar a Terceira Guerra Mundial — disse Biden.
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Lançada em junho, a contraofensiva ucraniana foi retardada pelas sólidas linhas de defesa russas, e um rápido avanço das tropas de Kiev parece improvável.
— A Rússia provavelmente aproveitará este tempo para cavar ainda mais [trincheiras] e construirá novas fortificações para se preparar para a primavera — disse Margo Grosberg, diretor dos Serviços Secretos da Estônia, em entrevista ao portal The Insider.
— Está claro, inclusive para aqueles que apoiam a Ucrânia com maior convicção, que essa guerra pode durar até 2024, ou mesmo 2025 — comentou à AFP Mick Ryan, um general australiano reformado.
Corrupção
A reunião desta quinta acontece em meio a sinais de atrito na unidade ocidental, principalmente partindo da Polônia, um dos aliados de primeira ordem de Kiev, que anunciou que suspenderia futuros envios de armas para o país vizinho na quarta-feira. A decisão ocorre após tensões deflagradas pela decisão do governo polonês de proibir importação de grãos ucranianos para proteger seus próprios agricultores.
Além das rusgas com velhos aliados e do avanço lento da contraofensiva ucraniana, que mina a convicção de que o país será capaz de retomar totalmente os seus territórios, uma onda de críticas sobre a corrupção de autoridades ligadas às Forças Armadas e ao governo de Kiev corroeram a confiança ocidental. Zelensky tomou ações enérgicas sobre o tema nos últimos meses, demitindo uma série de oficiais e trocando o comando da Defesa.
A corrupção oficial foi um tabu durante o primeiro ano de guerra, à medida que os ucranianos se uniam em torno do seu governo em uma luta pela sobrevivência nacional. Mas a destituição do ministro da Defesa, Oleksii Reznikov, no início do mês elevou a questão ao mais alto nível da política ucraniana em um momento crucial da guerra, quando a Ucrânia depende fortemente dos aliados ocidentais para assistência militar.
A certa altura deste ano, cerca de US$ 980 milhões (cerca de R$ 4,8 bilhões) em contratos de armas perderam as datas de entrega, de acordo com dados do governo, e alguns pré-pagamentos de armas desapareceram em contas estrangeiras de intermediários, segundo relatórios apresentados ao Parlamento.
Reportagens da mídia ucraniana também apontam para pagamentos com valor superfaturado de suprimentos básicos para o Exército. Jornalistas investigativos mostraram que o Exército pagou 17 hryvnia (ou R$ 2,29) por unidade de ovo – muito acima dos preços vigentes, de acordo com uma reportagem do Dzerkalo Tyzhnia.
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