Internacional
Playboy, cantor de funk, importador de neve falsa e agora preso: as várias faces do líder deposto no Gabão
Ali-Bongo Ondimba estava no poder desde 2009, após suceder seu pai, Omar, que governou o país por mais de quatro décadas; família é acusada de manter um 'regime cleptocrático'
“Façam barulho por mim”, apelou ali-Bongo Ondimba, de 64 anos, em um vídeo divulgado nesta quarta-feira, horas depois que os militares anunciaram na TV estatal sua destituição como presidente do Gabão por suposta “alta traição contra instituições do Estado”, desvio de fundos, corrupção ativa e até tráfico de drogas. No poder desde 2009, ele foi colocado em prisão domiciliar após o golpe e um de seus filhos foi preso por traição.
— Eu sou ali-Bongo Ondimba, presidente do Gabão. Estou enviando uma mensagem a todos os amigos que temos em todo o mundo para dizer-lhes que denunciem as pessoas que prenderam a mim e a minha família — pediu no vídeo. — Meu filho está em algum lugar, minha esposa está em outro e eu estou na residência [presidencial], mas não sei o que está acontecendo. Estou pedindo a vocês que façam barulho por mim.
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A imagem divulgada nesta quarta-feira, de um mandatário fraco apelando a qualquer membro da comunidade internacional que o possa ajudar, é muito distante do imaginário criado em torno do ali-Bongo nos últimos 14 anos: alguns o enxergam como um príncipe playboy mimado que viu como seu direito de nascença governar o Gabão; enquanto outros o consideram um ex-cantor de funk que assumiu o lugar do pai para perpetuar o governo de sua família, há mais de 55 anos no poder.
Há ainda aqueles que o têm como um reformador, um chefe de Estado que procurou diversificar a economia do país — fortemente baseada na exportação de petróleo, madeira, minério de ferro, ouro e diamante — e impulsionar seu status internacional com uma agenda ambiental ambiciosa — as Nações Unidas consideram o Gabão um líder global nas pautas climáticas devido ao seu compromisso de longa data em preservar suas florestas, tornando-se, em 2021, o primeiro Estado a receber pagamentos pela redução de emissões.
Controvérsias desde nascença
Ali-Bongo nasceu Alain Bernard Bongo no vizinho Congo em fevereiro de 1959, e só adotou o nome Ali em 1973, quando ele e o pai se converteram ao Islã — os únicos da família a fazê-lo —, uma decisão amplamente vista como forma de atrair investimentos de países muçulmanos para o Gabão. Mas até seu nascimento foi controverso. Rumores, que Ali Bongo sempre negou, persistiram durante anos de que ele foi adotado no sudeste nigeriano na época da guerra civil (1967-70).
Ele tinha oito anos quando seu pai assumiu o controle do Gabão, em 1967, e já no ano seguinte foi enviado para uma escola particular no sofisticado subúrbio parisiense de Neuilly. Mais tarde, formou-se em direito na Sorbonne — uma longa temporada no exterior que levou muitos no Gabão a considerá-lo um estranho.
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Seu pai, Omar Bongo, foi um dos aliados mais próximos da França após o fim da ocupação colonial, em 1960, e sua família possui um extenso portfólio de imóveis e outros bens materiais que está sendo investigado por magistrados anticorrupção — a lista inclui 70 contas bancárias, 39 apartamentos, duas Ferraris, seis Mercedes Benz, três Porsches e um Bugatti, segundo o Africa Facts Zone, um dos principais veículos de checagem de fatos do continente africano.
Neve falsa no Natal
Ali-Bongo chegou à Presidência em 2009, após a morte do pai, que governou o país por mais de quatro décadas. Mas a carreira política não era algo com que ele sonhava necessariamente. Quando jovem, suas paixões limitavam-se ao futebol e à música — uma característica herdada da mãe, a cantora gabonesa Patience Dabany — e ele chegou a lançar um álbum em 1977, quando tinha apenas 18 anos, produzido por Charles Bobbit, empresário da lenda do funk americano James Brown.
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A carreira musical, no entanto, durou apenas quatro anos após o lançamento de “A brand new man”. E então ali-Bongo voltou-se para a política. Enquanto seu pai era presidente, foi ministro dos Negócios Internaconais, entre 1989 e 1991, e depois assumiu a pasta da Defesa por 10 anos, entre 1999 e 2009, ano em que foi eleito presidente do Gabão com 42% dos votos.
— Conquistei meu lugar, não caiu no meu colo — declarou ali-Bongo na ocasião da vitória eleitoral, embora nos anos seguintes tenha sido alvo de diversas críticas e denúncias de fraude nas disputas.
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A família Bongo também é acusada por grupos de direitos humanos e políticos da oposição de ter transformado o Gabão em um “regime cleptocrático”, saqueando seus recursos naturais, riqueza petrolífera e florestas tropicais, além de desviar dinheiro público e administrar o país como se fosse uma propriedade privada — ali-Bongo, certa vez importou neve falsa para o Palácio Presidencial, para que sua família pudesse ter um Natal como o dos filmes americanos.
Segundo dados do Banco Mundial, 33,4% da população do Gabão vive na pobreza, apesar de o país ser rico em petróleo e de ter uma população de apenas 2,4 milhões de pessoas.
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