Internacional

‘Evite ficar bêbada’: comentários do marido de Meloni sobre prevenção ao estupro causam indignação na Itália

Casos recentes de estupro coletivo provocaram comoção no país; campanha de protesto nas redes sociais impulsionou o slogan 'eu não sou carne'

Agência O Globo - 30/08/2023
‘Evite ficar bêbada’: comentários do marido de Meloni sobre prevenção ao estupro causam indignação na Itália
Primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni - Foto: Reprodução

Comentários feitos pelo marido da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, durante um programa de televisão provocaram uma onda de indignação na Itália. O jornalista Andrea Giambruno, que tem uma filha com Meloni, sugeriu que as mulheres devem evitar ficar bêbadas para prevenir o estupro. O caso gerou uma exurrada de críticas nas redes sociais e reação dura da oposição à premier de extrema direita.

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Giambruno fez os comentários polêmicos durante um debate sobre casos recentes de estupro coletivo que chocaram os italianos, em seu programa na rede Rete 4 — canal do conglomerado de mídia erguido pelo ex-primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi. Um dos especialistas convidados, o codiretor do jornal Libero Pietro Senaldi, respondeu a uma pergunta sobre como as mulheres podem se defender de agressões sexuais dizendo que deveriam “tentar não perder a consciência”. O jornalista então concordou e completou:

— Se for dançar, você tem todo o direito de beber, claro, mas se você evita ficar bêbada e perder a consciência, talvez não se envolva em problemas, porque depois há risco de encontrar o lobo — disse Giambruno.

A fala causou revolta em representantes da sociedade civil e políticos de oposição que consideram que a opinião contribui para culpabilizar as vítimas. A porta-voz do Partido Democrático (PD) na Câmara dos Deputados, Chiara Braga, de oposição, pediu que Meloni rechace as declarações do companheiro.

— Não aceitamos nenhuma forma de ambiguidade. Meloni deveria se distanciar dessas palavras que insinuam uma vez mais que às vezes a culpa também é das mulheres. É inaceitável — disse a deputada.

A senadora Cecilia D’Elia, também do PD e porta-voz da Conferêcia de mulheres Democráticas também levantou a mesma crítica.

— As agressões são sempre um pouco culpa delas. Não saiam sozinhas, não vão onde está escuro, não se vista de modo provocante. Agora, Giambruno explica também que “se não ficar bêbada, não te estupram” — declarou com ironia.

A influencer Chiara Ferragni, muito popular entre os italianos, lembrou uma publicação no Instagram que as mulheres não tem problemas com lobos e sim com os homens, de acordo com a BBC.

Giambruno se defendeu dizendo que não cometeu nenhum erro e classificou a reação às declarações como “polêmica completamente surrealista”.

— Ninguém neste lugar justificou os atos (de estupro), ao contrário, se utilizaram termos muito precisos como abominável e os agressores foram chamado de feras — justificou o jornalista.

'Eu não sou carne'

Meloni não comentou publicamente o caso, mas anunciou que irá nesta quinta-feira a Caivano, onde ocorreu o estupro coletivo de duas meninas de 13 anos que são primas. Seis adolescentes são acusados de terem cometido a agressão.

Em outro caso que chocou o país, sete homens, entre eles um menor, são apontados como os autores do estupro coletivo de uma jovem de 19 anos, na Sicília. A jovem estava embriagada e foi carregada até um parque onde os agressores a violentaram em turnos e filmaram o crime. Depois da denúncia, a vítima passou a ser insultada pelas redes sociais e acusada de ter tido relações sexuais consentidas com os violadores. Na terça-feira, ela foi internada em um centro onde vai receber apoio psicológico. “Estou cansada, já não posso suportar mais” desabafou.

O estupro na Sicília deu início a um movimento de indignação incomum na Itália, que ganhou corpo com o engajamento de celebridades. Uma uma campanha de protesto vem crescendo, desde então, e impulsionando o slogan “eu não sou carne” nas redes sociais. (Com El País)