Brasil
Hacker diz que Bolsonaro pediu ação contra urnas e prometeu indulto como o de Daniel Silveira
Em depoimento, Walter Delgatti Netto confirmou ter encontrado o ex-presidente durante um café da manhã no dia 10 de agosto
O hacker Walter Delgatti Netto começou, na manhã desta quinta-feira, a prestar depoimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, no Congresso Nacional. Ele está preso preventivamente por invadir o sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e inserir um mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). À Polícia Federal, Delgatti disse que o crime foi encomendado pela deputada federal Carla Zambelli (PL-SP).
Após apresentar detalhes do sua vida pessoal e de sua trajetória profissional, o hacker Walter Delgatti Netto passou a ser perguntado sobre pela relatora senadora Eliziane Gama (PSD-MA) sobre as reuniões feitas com a deputada Carla Zambelli. Ele confirmou os encontros e disse ter trabalhado nas redes sociais da parlamentar, participando de grupos de WhatsApp com seus assessores.
Delgatti Netto disse ter se reunido com Jair Bolsonaro (PL) durante um café da manhã que durou cerca de uma hora e meia, no dia 10 de agosto, no Palácio da Alvorada. No encontro, em que Zambelli também estava presente, ele disse o ex-presidente o questionou sobre a possibilidade de invadir as urnas eletrônicas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em caso de ser pego, Bolsonaro teria assegurado que lhe concederia um indulto:
— Sim, recebi. Inclusive, a ideia ali era que eu receberia um indulto do presidente. Ele havia concedido um indulto a um deputado federal. E como eu estava com o processo da Spoofing à época, e com as cautelares que me proibiam de acessar a internet e trabalhar, eu visava a esse indulto. E foi oferecido no dia.
No depoimento à CPMI, o hacker disse ainda que, em outro ocasião, Jair Bolsonaro teria pedido para ele assumir a autoria por um grampo contra Alexandre de Moraes. Essa conversa, segundo ele, teria acontecido por telefone em posto de gasolina e teria sido intermediada também por Zambelli.
— Bolsonaro disse pra mim: "Fique tranquilo. Caso alguém te mande prender, eu mando prender o juiz" — contou.
Questionado pela relatora, Delgatti Netto afirmou ter estado no ministério em cinco ocasiões diferentes. Ele contou também que foi convidado para estrelar a campanha presidencial de Bolsonaro. O intuito à época seria colocar em xeque a segurança do sistema eleitoral:
— Uma das ideias, no dia 7 de setembro, eles pegarem uma urna emprestada da OAB e eu colocasse um aplicativo meu e mostrar para a população que é possível apertar um voto e sair outro.
Nesta quarta-feira, em novo depoimento, Delgatti Netto teria apresentado conversas que comprovariam o pagamento de R$ 40 mil por assessores da parlamentar, para a invasão da plataforma. A convocação de Delgatti foi pedida pelos deputado Rogério Correia (PT-MG), Duarte Junior (PSB-MA), Jandira Feghali (PcdoB-RJ), Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), Rubens Pereira Junior (PT-RJ), além da relatora senadora Eliziane Gama (PSD-MA).
De acordo com o advogado Ariovaldo Moreira, embora tenha conseguido um habeas corpus do STF para permanecer em silêncio a fim de não se autoincriminar, Delgatti Netto deverá responder a perguntas feitas por deputados e senadores, nesta manhã.
Há duas semanas, Delgatti Netto foi alvo de um mandado de prisão preventiva, no interior de São Paulo. Já Zambelli e dois de seus assessores foram alvos de mandados de busca e apreensão, em Brasília. De acordo com as investigações, funcionários da parlamentar teriam sido os responsáveis por efetuarem transferências por PIX para contas do hacker como pagamentos pelos serviços prestados por ele.
À PF, Delgatti Netto afirmou ter interesse em contribuir com o inquérito e apontou um pendrive, que estava atrás de um quadro na parede de seu flat, com todos os códigos fonte do CNJ. Em depoimento, o hacker contou que a invasor começou em setembro de 2022 e, até janeiro desse ano, ele ainda tinha acesso ao sistema do Conselho.
Delgatti Netto disse que sabia de “bug” no site que permitia acesso a arquivos secretos que armazenagem chaves e tokens. Ele contou ter feito buscas na internet pelo domínio “jus.br”, tendo encontrado o usuário e a senha de um robô utilizado para solucionar problemas na plataforma e que nem sequer precisava de confirmação em duas etapas.
“(…)o declarante passou a ler todos os comentários e entender como funcionava o sistema, valendo-se do descuido (ou da confiança na plataforma) dos servidores; QUE o código criado para manipular o robô não continha uma segunda camada de segurança e também não salvava logs e, ainda, podendo criar novos usuários e fazer alterações nos códigos etc; QUE ainda no 'GIRA', passou a acompanhar o dia a dia de 3.500 desenvolvedores, inclusive o grupo de 5 ou 6 que administrava todo o sistema do CNJ, e a analisar os códigos”, falou, em um trecho do depoimento.
O hacker informou que, após três meses analisando “linha por linha de cada código”, se deparou com um usuário e senha que davam acesso a Intranet do CNJ. “QUE as senhas do sistema do CNJ eram muito frágeis, a exemplo de '123mudar', 'cnj123' e 'p123456', ou seja, de fácil dedução”, disse Delgatti Netto.
Aos investigadores, o hacker relatou ainda que, em alguns bancos de dados da plataforma, ficou demonstrado “descuido por parte dos administradores, haja vista possibilitar combinações em outros sistemas”. Delgatti Netto também afirmou que, após a invasão, outros servidores o xingaram e ele teve seus acessos foram bloqueados em seguida.
“A metodologia narrada por WALTER DELGATTI NETO/ VERMELHO mostra-se verossímil quando analisada em conjunto com os relatórios elaborados pela Polícia Federal e pelo CNJ e confirma a autoria do ataque”, concluiu o inquérito, enviado ao STF.
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