Internacional

Náufrago australiano: 'Eu era um homem de terno e gravata e decidi mudar minha vida'

Tim Shaddock passou mais de dois meses à deriva no mar com sua cadela; em entrevista, ele conta como decidiu deixar uma grande empresa de tecnologia e se aventurar pelo mundo

Agência O Globo - 25/07/2023
Náufrago australiano: 'Eu era um homem de terno e gravata e decidi mudar minha vida'

Tim Shaddock já foi um homem de terno e gravata que trabalhava para uma grande empresa de tecnologia. Ao perceber que esse estilo de vida não combinava com sua forma de pensar, ele mergulhou nas profundezas da natureza, nas montanhas e lugares remotos da Ásia. Então sua vida se abriu para o mar, o mesmo mar que estava prestes a destruí-lo. Em 2020, seus novos passos o levaram ao México e decidiu embarcar de La Paz, na Baja California Sur, para a Polinésia Francesa. A cerca de 2.000 quilômetros da terra firme e sem comunicação, uma tempestade arrancou sua vela, parou seu motor e o deixou à deriva no Pacífico. Pescadores de atum o encontraram no dia 12 de julho e o resgataram junto com sua cadela, Bella. Agora, da costa de Colima, no México, ele recorda os 90 dias que sobreviveu entre o céu e a água, comendo peixe cru e um pato que pousou no seu catamarã.

As ondas do Pacífico quebram o silêncio na praia de Manzanillo, capital de Colima. Shaddock (nascido em Sydney, na Austrália, de 54 anos) está lá desde a última terça-feira, hospedado em um dos hotéis que desenham a paisagem local, buscando recuperar a saúde e tentar regularizar sua situação imigratória. Ele não esquece os três meses em que ficou à deriva com sua cachorra. O marinheiro tem olhos muito azuis, usa boné e barba espessa. Ele acabou de acordar de sua soneca.

— Estou muito bem. Eu tenho me cuidado aqui. Sou muito grato ao México e a todas as pessoas que salvaram minha vida. Estou melhor aqui do que quando estava no mar — afirmou em entrevista ao El País.

A abertura ao trabalho remoto levou Shaddock a se mudar de sua terra natal, Sydney, para os Estados Unidos, quando o vírus da Covid-19 começou a causar estragos em todo o mundo. A pandemia fez com que a Austrália fechasse suas fronteiras por mais de um ano, deixando milhares de australianos de fora (“Eu fui um desses 20.000”, diz ele). Sua estada em território americano foi complicada pelas restrições de visto. E decidiu viajar para Querétaro. A partir daí, ele trabalhou à distância por uma temporada. Ele diz que conheceu Bella nas montanhas de San Miguel Allende cerca de três anos atrás. Ela era uma cachorrinha de gado:

— Ela me seguia por toda parte. E pensei: 'Não posso ter um cachorro' — disse. Mas Bella continuou a segui-lo onde quer que ele fosse.

Depois de meses pela fronteira mexicana, ele decidiu mudar sua dinâmica. Ele foi para Puerto Vallarta, em Jalisco, em um carro, no qual Bella entrou. Lá comprou o Aloha Toa, o pequeno catamarã onde fez sua casa:

— Depois que comecei a morar no barco, era muito difícil trabalhar remotamente — explicou.

Ele começou a planejar sua viagem marítima há dois anos.

— Quando comprei o barco, estava chegando o verão e a temporada de furacões. Tive que ficar lá [em Puerto Vallarta] e esperar para navegar até La Paz pelo Mar de Cortez — contou.

Nesse primeiro ano, começou a adaptar o barco para a viagem futura.

— Eu precisava ter uma maneira de garantir que usaria combustível apenas para entrar e sair do porto e navegar [com vela] o resto do tempo e da água.