Internacional

Presidente sul-africano diz que prender Putin durante cúpula do Brics seria 'declaração de guerra'

África do Sul pediu autorização ao Tribunal Penal Internacional (TPI) para não cumprir mandado de prisão do presidente russo por crimes de guerra

Agência O Globo - 19/07/2023
Presidente sul-africano diz que prender Putin durante cúpula do Brics seria 'declaração de guerra'
presidente sul-africano Cyril Ramaphos - Foto: Reprodução

Prender Vladimir Putin seria uma declaração de guerra à Rússia, afirmou o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa, em um documento publicado nesta terça-feira pela justiça sul-africana, em pleno debate nacional sobre a visita do presidente russo durante a próxima cúpula do Brics — acrônimo formado pelas iniciais de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Putin foi convidado para o encontro que acontece entre os dias 22 e 24 de agosto, em Joanesburgo, mas é alvo, desde março, de um mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes de guerra. O governo sul-africano — que enfrenta uma batalha judicial em casa — pediu autorização ao TPI, com sede em Haia, para não prender o presidente russo.

Entenda: Putin é o quarto chefe de Estado a receber ordem de prisão do Tribunal Penal Internacional

Guga Chacra: Putin não será preso enquanto estiver no poder

O TPI acusa Putin pela "deportação ilegal" de crianças ucranianas após a invasão da Ucrânia, o que o Kremlin nega. Como país que integra o TPI, a África do Sul teria, em teoria, que prender o presidente russo ao entrar em território sul-africano. Este se tornou um grande dilema diplomático para o governo de Ramaphosa, que se recusa a condenar a Rússia desde o início da guerra.

O caso entrou na esfera judicial local, depois que o principal partido de oposição no país — a Aliança Democrática (DA) — procurou os tribunais para forçar o governo a garantir que o líder russo seja detido e entregue ao TPI se colocar os pés na África do Sul. Em documento que faz parte do processo e foi publicado nesta terça-feira, Ramaphosa chamou o pedido do partido de "irresponsável".

"A Rússia indicou claramente que qualquer prisão de seu presidente equivaleria a uma declaração de guerra. Não seria coerente com nossa Constituição arriscar envolver o país em uma guerra com a Rússia", escreveu.

O texto diz ainda que a detenção de Putin pode ameaçar "a segurança, a paz e a ordem do Estado", especificou Ramaphosa no documento assinado em junho e classificado inicialmente como confidencial, antes de ser divulgado pelo tribunal.

De acordo com a agência de notícias Reuters, o pedido do governo sul-africano ao TPI se baseia no artigo 97 do estatuto de Roma, que fundou o tribunal, que prevê que os países signatários possam pedir autorização para não cumprir um mandado alegando problemas que impeçam sua execução.

Por sua vez, Moscou ainda não confirmou oficialmente a ida de Putin à cúpula. A África do Sul mantém laços estreitos com a Rússia, desde os tempos do Apartheid, quando o Kremlin apoiou Nelson Mandela e seu partido — atualmente no governo — na luta contra o regime de segregação racial.

Parceiro em guerra

Esta será a 15ª cúpula do Brics e acontece em um momento em que o grupo voltou a estar sob os holofotes globais, com pelo menos 13 países na fila para adesão. Nem o fato de um dos integrantes estar em guerra e sob sanções internacionais diminuiu o interesse de nações como Argentina, Irã, Arábia Saudita, Egito e Indonésia, atrás de financiamento e oportunidades comerciais.

A China, maior economia do grupo, e a Rússia pretendem usar a ampliação do clube para elevar sua força geopolítica, na contramão dos interesses do Brasil e da Índia, que defendem um congelamento do bloco.

Em guerra e instável: Rússia é entrave para bloco e banco do Brics

O presidente russo busca apoio dos países do Brics para contornar as sanções impostas pelo Ocidente, que tiveram forte impacto em sua economia e capacidade de financiamento internacional. Mesmo o Novo Banco de Desenvolvimento (conhecido no Brasil como banco dos Brics) foi obrigado a congelar repasses e abertura de novas linhas de crédito para o país (que é um dos fundadores da instituição, junto às outras quatro nações do bloco). Brasil e Índia não apoiam esse tipo de concessão a Moscou e preferem uma posição de neutralidade, pois têm grandes interesses em manter boas relações com europeus e americanos.

O Brics hoje corresponde a 26% do PIB mundial e a 40% dos habitantes do planeta, enquanto o G7 — que reúne as economias mais industrializadas — a 49% e 10%, respectivamente.