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A eleição de 1950

03/07/2022
A eleição de 1950

Logo depois do Brasil perder a partida final para o Uruguai por 2 x 1 em pleno Maracanã no ano de 1950, outras tragédias aconteceram em Alagoas. Silvestre Péricles era um governador honesto, mas, arbitrário e até violento em suas imposições políticas. Estavam marcadas eleições gerais para o dia 3 de outubro. Silvestre lançou seu candidato a governador, Campos Teixeira. Naquela época não havia pesquisa, mas ele dizia ter mais de 80% dos votos. Os caciques da oposição, da UDN, com eleição garantida para deputado, não se arriscaram a candidatar-se contra Campos Teixeira. Foi quando apareceu um jovem jornalista, com ousadia e audácia topou a candidatura afirmando que ganharia a eleição para governador do Estado lutando contra Silvestre. Arnon de Mello entrava assim para história das Alagoas. Candidato à Constituinte de 1945, Arnon perdeu; teve 1.300 votos. Atrás de Silvestre (6.105), Rui Palmeira (3.232), Freitas Cavalcanti (2.388). Na frente de Carlos Prestes (1.093), Graciliano Ramos (62).

A campanha eleitoral de 1950 foi uma das mais violentas na história das Alagoas. Como todo déspota, Silvestre não admitia crítica. Quando os jornalistas da oposição metiam o pau no governo, ele ficava brabo e dava o troco. Mandou dar surra no jornalista Donizete Calheiros, empastelar jornal, tocar fogo no caminhão dos estudantes que pichavam os muros com propaganda de Arnon. A campanha foi um período de tiros, mortes, chacina. Na cidade de Mata Grande várias pessoas de uma família morreram. O irmão de Silvestre, Senador Ismar de Góes Monteiro, seu inimigo político, levou três tiros numa tentativa de assassinato. O clima era de total intranquilidade.

Numa noite de brisa de agosto, eu estava em minha casa lendo revistas em quadrinhos, era um menino de 10 anos, experto, maloqueiro da praia da Avenida da Paz, quando bateram palmas no portão. Fui atender, me surpreendi com um grupo de homens, em torno de 10, a maioria com paletó branco e apenas uma mulher. Perguntaram pelo Coronel Mário Lima, comandante do 20º Batalhão de Caçadores. De repente meu pai chegou cumprimentando os visitantes. Era a cúpula da UDN que pedia para realizar uma reunião naquela casa, único local que acharam seguro dentro do Estado de Alagoas.

Os membros da oposição, que Silvestre chamava de “udeno-comunistas”, discutiram na sala durante toda noite. Eu menino curioso fiquei admirado, prestando maior atenção ao debate sobre as medidas a serem tomadas. O que mais me impressionou foi a atuação determinada e cheia de opiniões da única mulher do grupo, Dona Leda, esposa de Arnon. Naquela época lugar de mulher era na cozinha. Fui dormir e deixei os políticos, Rui Palmeira, Freitas Cavalcanti, Melo Mota, Carlos e Mário Gomes de Barros, Ezequias da Rocha, Oséas Cardoso, entre outros discutindo até a madrugada, com o apoio da água gelada, cafezinho, doce de mangaba, bolo, e refresco de cajá de Dona Zeca.

Essas reuniões se repetiram. Meu pai, embora comandante do Exército, tomava essa posição em receber políticos na nossa residência para evitar mais violências. Ele comunicou o fato ao governador.

Arnon estava crescendo na capital e no interior o que levava os governistas ao desespero. A eleição se aproximava e a garantia das tropas do Exército solicitada pela oposição não chegava no 20º BC. O General Góes Monteiro, irmão de Silvestre, eminência parda da República, candidato a Senador em Alagoas, segurava a ordem de envio de tropas para assegurar a eleição em Alagoas.

Foram expedidos radiogramas para a 7ª Região Militar–Recife, informando que estavam sendo preparadas fraudes e violências durante a eleição.

Só às 2 horas da manhã de 3 de outubro, dia da eleição, chegou o radiograma para o Exército garantir as eleições em Alagoas. O 20º BC permanecia de prontidão com a tropa organizada para ser distribuída nos municípios. Havia um problema: não existia viatura suficiente para o deslocamento imediato dos soldados para todo Estado. O coronel Mário Lima requisitou caminhões, camionetes que passavam em frente ao quartel; embarcaram todos os soldados para o interior. O Exército garantiu a eleição. Ao apurar os votos, Arnon de Mello teve 56.962 contra 36.338 de Campos Teixeira.

No mês de novembro, em uma inspeção do general comandante da 7ª Região à guarnição de Maceió, o coronel Mário Lima acompanhou o general na visita de praxe ao governador. Na saída, Dona Constança, mãe de Silvestre, sentada em uma cadeira de balança, provocou: “Esse Exército de merda fez meu filho perder a eleição”. Os militares fingiram não ouvir. Sorrindo desceram as escadas do Palácio dos Martírios.