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Um jogo de cartas marcadas
Se tem um troço que atravanca por demais qualquer tentativa de discussão minimamente séria, a respeito de qualquer coisa que realmente mereceria a nossa atenção, é essa pressa insana que toma conta de nossa alminha sebosa, que quer porque quer tomar uma posição, favorável ou contrária, em relação a qualquer fumacinha de treta que apareça em nosso horizonte digital.
Sei que é uma obviedade ululante, mas vivemos em um tempo onde o óbvio deve ser dito em alto e bom som, do alto dos telhados de nossas casas conectas: tomada de posição precipitada e acalorada sobre qualquer coisa não é, de maneira alguma, sinônimo de tomada de consciência de coisa nenhuma, muito menos a expressão de um exercício de reflexão.
Aliás, lembremos e, se possível, tentemos não esquecer: reação automática e irascível a um fato, que apenas tomamos ciência por meia dúzia de buzinadas midiáticas, é uma atitude radicalmente oposta a qualquer forma de autonomia reflexiva.
Reflexão, por definição, demanda tempo e paciência. Compreensão e tomada de consciência também exigem isso.
Autonomia alguma é capaz de florescer num coração que vive agitado, ansioso para gritar ao mundo que essa ou aquela seria a sua posição em relação a isso ou aquilo para, desse modo, sinalizar [uma suposta] virtude para a galerinha da nossa panelinha de aloprados “criticamente críticos” preferidos.
Na verdade, toda vez que procedemos desse jeito, acompanhando freneticamente os movimentos das volúpias midiáticas, acabamos nos reduzindo à condição de massa de manobra, mesmo que acreditemos, candidamente, que estamos agindo [como se diz] de forma tremendamente crítica.
Aliás, essa é a ideia, não é mesmo? Todo indivíduo manipulado, instrumentalizado até o tutano, por definição, não sabe e não acredita, de jeito algum, que ele seria apenas e tão somente um peão alienado num jogo de fantoches travestidos de cidadãos atuantes.
Enfim, até quando continuaremos a tomar posição em relação a eventos cujas informações que foram recebidas por nós são tão apaixonadas quanto desencontradas, até quando? Só Deus sabe.
Provavelmente continuaremos por muito tempo com essa nossa mania, de ficarmos sentenciando e condenando publicamente pessoas que apenas conhecemos de ouvir falar, sem realmente procurarmos compreender, com um mínimo de clareza, o que de fato está rolando e, possivelmente, apenas iremos parar com isso no dia em que a tal da vergonha na cara florescer garbosamente em nossas ventas.
Fim de causo.
Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela – professor e cronista – Instagram: @dartagnanzanela
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