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A vingança da viúva
Malaquias estava sentado trabalhando, conferindo os carimbos de certidões, de repente sentiu-se mal, suando frio, gritou para seus colegas.
– Socorro! Estou com dor no peito. Estou com…
Não terminou a frase, sua cabeça pendeu, caiu de bruços em cima do birô. Deitaram Malaquias no chão, afrouxaram a roupa, uma jovem fez respiração boca-a-boca. Quando a ambulância chegou, já estava morto.
Malaquias era um homem sério, austero, decente, funcionário exemplar da Rede Ferroviária. Tinha 48 anos, 26 dedicados ao serviço, nunca faltou um dia à repartição. Um homem formal, não bebia, nunca fumou. Tinha um físico magro de dar inveja aos amantes da malhação. Mas seu coração era fraco devido a uma picada do besouro barbeiro da época de sua bela e divertida infância na amada cidade de União dos Palmares.
Todos esses predicados enchiam de orgulho à esposa. Lúcia de Fátima afirmava convicta: -“Homem sério e decente é Malaquias, por ele ponho a mão no fogo”. Os amigos concordavam. Apenas algumas amigas mais íntimas, diziam para si mesma que Fátima poderia queimar as mãos. Malaquias tinha apenas um problema com a família: gostava de pescaria. Em fim de semana, muitas vezes, viajava com amigos para pescar no litoral das Alagoas.
O campo santo Parque das Flores estava cheio de amigos e curiosos. O defunto era popular, foi candidato a vereador por cinco vezes seguidas. Em uma eleição chegou a ter 456 votos. Ele se orgulhava quando deputados pediam seu apoio em época de eleição.
Lúcia de Fátima estava arrasada, muita comoção no cemitério. Os amigos abraçavam, consolavam. Por conta do estado emotivo, ela não percebeu que uma senhora desconhecida chorava além do normal. Muitos notaram quando uma mocinha de seus treze anos aproximou-se do caixão depositou uma rosa, teve acesso de choro e chamou Malaquias de pai. Essa senhora tirou a jovem discretamente.
Ao terminar a missa de sétimo dia, a viúva foi procurada Pela senhora, morena, bonita, cabelos escorridos, olhos irritados vermelhos.
-Dona Fátima, eu me chamo Berenice, preciso falar com a senhora, assunto de seu interesse, aliás, de nosso interesse.
A viúva, que estava abraçada à sua única filha, Rosilene, de treze anos, convidou-a para tomar café em sua casa com os amigos. Os parentes mais próximos tomaram o lauto café da manhã, lembrando Malaquias que deveria estar no céu àquela hora.
Depois que todos saíram, Fátima chamou a senhora para conversar na varanda. Berenice entrou no assunto, direta, sem preparar a viúva:
– Dona Fátima a senhora precisa saber agora, não se pode adiar. Eu e Malaquias há muito tempo temos uma relação amorosa. Tenho duas filhas com ele. A mais velha, Rosali, é essa que está na sala conversando com sua filha. São irmãs, incrível, nasceram quase no mesmo dia.
Fátima arregalou os olhos, desnorteada com a imprevisível notícia. Foi um choque como se tivesse levado um coice no estômago. Não admitiu. Não podia acreditar. Respondeu aos berros para Berenice.
– Mentirosa, ponha-se para fora! Não manche o nome de meu marido!
A amante sem fazer barulho disse apenas com firmeza:
-A Senhora precisava saber. Eu aceitei a relação de ser amante porque amava Malaquias. Ele não era um santo, como a senhora pensa. Tome meu cartão, telefone-me quando acalmar. Meu advogado vai procurar a senhora.
Saiu levando sua filha que havia adorado a nova amiga, sua meia irmã.
Pela tarde, Genilda, uma amiga, bateu à porta. Fátima atendeu se lamentando, chorando:
– Descobri a traição! Eu era corna e não sabia!
Genilda teve um choque. Começou a chorar e inesperadamente confessou com voz baixa.
– Desculpe Fátima! Agora que você descobriu, quero dizer que não tive culpa. Malaquias quando me via começava a falar aquelas coisas bonitas. Era um finório na lábia. Juro que dei a primeira vez porque prometeu parar com aquelas cantadas. Peço perdão, pelo amor de Deus.
Fátima ficou afônica, atônica e estarrecida com a nova descoberta. Botou Genilda para fora de casa. Chorou o resto do dia. Inconformada com as histórias amorosas do marido ficou reclusa em sua casa. Passou um tempo sem receber ninguém, com vergonha de ter sido uma idiota. Uma incontrolável raiva de Malaquias apoderou-se de sua alma. Rasgou todos seus retratos.
Na noite da missa do 30º dia, ela reapareceu, escandalizando. Entrou na Igreja com um vestido vermelho, bem decotado e justo, transparecendo suas bonitas pernas. Chocou mais ainda, quando, no final da missa, convidou as amigas para dar uma volta na noitada da cidade.
A partir dessa noite Fátima se liberou. Deu e dá para quem quer. Recusou um colega de trabalho, Julião, que fez uma chantagem entregando-lhe um bilhete discretamente. – “Eu vi ontem o Ronaldo entrando à noite em sua casa. Quero também uma noitada de amor. Senão conto para todo mundo. Assinado: Você já sabe”. Ao ler a chantagem procurou Julião, ao vê-lo, rodou a bolsa e tacou-lhe na cara. Falou alto para todos ouvirem.
– Eu dou para quem quiser. Menos para você seu babaca!
E saiu às gargalhadas.
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