Brasil
Em pronunciamento, Bolsonaro defende uso da cloroquina contra covid-19
Em pronunciamento transmitido em cadeia nacional na noite desta quarta-feira (08/04), o presidente Jair Bolsonaro voltou a defender o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento da covid-19.
Esse foi o quinto pronunciamento de Bolsonaro em meio à pandemia do coronavírus e, assim como nos anteriores, foi acompanhado de panelaços em grandes cidades brasileiras.
Pela primeira vez, o presidente também usou um pronunciamento na TV para se solidarizar com as famílias brasileiras que perderam membros na pandemia. Essa manifestação ocorre quase um mês e meio depois do registro da primeira morte por coronavírus no Brasil. Até o momento, 800 pessoas morreram de covid-19 no país.
“Após ouvir médicos, pesquisadores e chefes de Estado de outros países, passei a divulgar, nos últimos 40 dias, a possibilidade de tratamento da doença desde sua fase inicial”, disse Bolsonaro.
Em seguida, ele citou o caso do cardiologista Roberto Kalil, do Hospital Sírio-Libânes, que tomou cloroquina após ser diagnosticado com covid-19. O médico contou que tratou dezenas de pacientes com o remédio. “Essa decisão poderá entrar para a história como tendo salvo milhares de vidas no Brasil. Nossos parabéns ao Dr. Kalil”, disse Bolsonaro no pronunciamento.
Mais cedo, em entrevista ao programa “Brasil Urgente”, da TV Bandeirantes, Bolsonaro também defendeu que a hidroxicloroquina seja usada em pacientes com a covid-19 ainda em fase inicial, antes mesmo que a doença seja oficialmente diagnosticada, já que o teste pode demorar alguns dias.
Tanto no pronunciamento quanto na entrevista, o presidente contrariou o Ministério da Saúde, que na terça-feira recomendou, com ressalvas, que o remédio seja usado apenas em casos graves, e desde que o médico que receitá-lo se responsabilize.
Em outros momentos do pronunciamento, Bolsonaro voltou a criticar governadores que impuseram medidas amplas para forçar o isolamento social com o objetivo de conter a pandemia. No entanto, desta vez ele evitou o mesmo tom agressivo de pronunciamentos anteriores.
“Vivemos um momento ímpar em nossa história. Ser presidente é olhar o todo e não apenas as partes. Nosso objetivo principal sempre foi salvar vidas”, disse.
Bolsonaro também afirmou que sua equipe de ministros deve estar alinhada com ele.
“Tenho a responsabilidade de decidir sobre as questões do país de forma ampla, usando a equipe de ministros que escolhi para conduzir os destinos da nação. Todos devem estar sintonizados comigo”, disse o presidente.
Essa fala ocorre após dias de tensão entre Bolsonaro e o titular da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que chegou a ser alvo de um processo de fritura promovido pelo presidente, irritado com o protagonismo do ministro em meio à pandemia. No último domingo, Bolsonaro chegou a afirmar que alguns membros do seu governo estavam “se achando” e se comportando como “estrelas”, num claro recado a Mandetta.
Uma pesquisa Datafolha divulgada na semana passada apontou que 76% dos brasileiros aprovam o trabalho de Mandetta na condução da crise do novo coronavírus. Já a avaliação de Bolsonaro foi significativamente mais baixa: 33%.
Ainda no pronunciamento, Bolsonaro voltou a distorcer uma fala do diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, para criticar medidas dos governadores.
Bolsonaro disse que os mais pobres não podem deixar de se locomover para “buscar o seu pão de cada dia”.
Mas, assim como já havia ocorrido no final de março, Bolsonaro omitiu a sequência da fala de Ghebreyesus em que ele cobrava que os governos adotem medidas para garantir assistência econômica à população mais vulnerável durante a crise. Ao omitir a segunda parte novamente, Bolsonaro tentou sugerir que o diretor-geral da organização defendeu, como vem fazendo o presidente, um retorno da população ao trabalho.
Cloroquina
Nas últimas semanas, Bolsonaro vem promovendo constantemente o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina contra a covid-19. São compostos usados no tratamento da malária e de algumas doenças reumáticas. O presidente chegou a se referir aos fármacos como a “cura” para o coronavírus.
No entanto, faltam estudos amplos que atestem sua eficácia. Os compostos também podem provocar efeitos colaterais, como danos renais e hepáticos. Médicos e o Ministério da Saúde vêm advertindo sobre o risco de automedicação e recomendam que os remédios só sejam usados sob supervisão médica. A Organização Mundial da Saúde (OMS) também recomenda cautela no uso do produto.
Mesmo com a ausência de estudos amplos sobre a eficácia dos compostos, Bolsonaro e seu círculo transformaram o tema em mais uma pauta de extrema direita da sua campanha de “guerra cultural” nas redes sociais.
Contas ligadas à família Bolsonaro vêm acusando as pessoas que pedem prudência na adoção generalizada dos remédios ou que levantam dúvidas sobre a eficácia de ser “a favor do vírus” ou de apresentar questionamentos apenas para sabotar o presidente.
Além de Bolsonaro, o presidente americano Donald Trump também vem demonstrando um entusiasmo similar em relação à cloroquina. Ambos os presidentes adotaram tal postura após terem inicialmente minimizado a pandemia.
O tema também gerou tensão entre Bolsonaro e seu ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.
O ministro tem evitado demonstrar o mesmo entusiasmo de Bolsonaro com a cloroquina. Há duas semanas, Mandetta disse que o fármaco não é uma “panaceia” e advertiu contra a automedicação.
Em uma coletiva, ele criticou indiretamente Bolsonaro, ao afirmar que se “sairmos com a caixa na mão e falar ‘pode tomar’, nós podemos ter mais mortes por mau uso de medicamento do que pela própria virose”. Antes dessa fala, Bolsonaro havia aparecido em público segurando caixinhas do remédio. O presidente também se incomodou com a demora do Ministério da Saúde em apresentar um protocolo claro para o uso da cloroquina em pacientes com covid-19.
Na segunda-feira, Mandetta disse ter sido pressionado por dois médicos para que o Ministério publique um protocolo para administração do remédio. O episódio ocorreu após reunião com Bolsonaro. Mandetta se recusou, argumentando que falta embasamento científico para tomar tal decisão.
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