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Banho de mar à fantasia
No domingo anterior ao carnaval a Avenida da Paz lotava de gente de toda espécie e classe social. A partir das oito da manhã começavam a aparecer as troças, as fantasias, as críticas, os blocos, as Escolas de Samba para o grande desfile do Banho de Mar à Fantasia coordenado pela COC – Comissão Organizadora do Carnaval da Prefeitura de Maceió. Nas imediações do Clube Fênix um palanque dava guarida para uma banda tocar músicas de carnaval e o povo na rua pulava e dançava até mais tarde no maior calor. Depois de passar pela Comissão Julgadora, alguns caiam no mar, um mergulho com fantasia no corpo, na água límpida transparente da Avenida.
Iniciava o desfile oficial perante o palanque com os jurados escolhidos pela COC para entregar as taças de campeão. Primeiramente vinham as críticas e troças com a irreverentíssima turma do Bráulio Leite, Santa Rita, Rubens Camelo, Vadinho, Alipão, João Moura, Napoleão. Esses não perdoavam governo e governantes. Depois vinham fantasias. Tarzan e sua esposa eram o casal devorador de prêmios, saíam sempre de Tarzan e Jane durante o carnaval, porém no Banho de Mar à Fantasia variavam como casais famosos: Sansão e Dalila; Marco Antônio e Cleópatra. Havia um grande folião, Fusco, militar da aeronáutica sempre gozava um enredo de um filme da época. Certa vez, o filme do momento era “Amar foi minha ruína”, Fusco fantasiou-se de moça grávida, e nas costas, um cartaz: “Amar foi minha ruína”. Lincoln Jobim um especialista, fantasiava-se de Seu Fortes, um louco conhecido na cidade, maltrapilho, à sua volta alguns cachorros, Lincoln era um artista, imitava Seu Fortes melhor que o próprio.
O desfile finalizava com a competição entre os blocos carnavalescos: Vulcão, Bomba Atômica, Pitanguinha vai à Lua, Vou Botar Fora, Cara Dura, Cavaleiro dos Montes, Amigo da Onça, disputa era acirrada.
Depois de passar pelo palanque dos jurados e receberem prêmios, os blocos continuavam arrastando as multidões pela avenida, atravessavam a ponte do Salgadinho e perto do coreto entravam na Rua Silvério Jorge, onde o general Mário Lima, em sua casa, esperava cada bloco com bate-bate de maracujá, cerveja gelada e um bom tira-gosto para os músicos. O bloco tocava 4 ou 5 frevos, depois seguiam em frente; outro bloco já estava na porta. Minha casa era uma festa, amigos dançavam, faziam o passo na enorme varanda durante o restante da tarde.
Acompanhávamos os blocos na entrada e saída, uma alegria entre os amigos, figuras das mais conhecidas entravam no embalo, como as badaladas cronistas, Lilian Rose e Maria Cândida, o deputado Guilherme Palmeira, a fina flor da burguesia alagoana, Almir Furtado, Edson Frazão, Marta Mendonça, delegado Aurino Malta, misturavam-se com o povão, era a democracia carnavalesca. Atrás dos blocos misturavam-se engenheiros e serventes, médicos e enfermeiras, capitão e soldado, filhas de Maria e prostitutas. Os blocos terminavam de tocar em minha casa ao anoitecer, antecipando o carnaval. Namoros feitos, outros desfeitos, a alegria do carnaval tomava conta da juventude.
À noite o povão voltava para suas casas. Cansados, os blocos recolhiam seus estandartes esperando o carnaval chegar.
Certa vez, Arnaldo, aluno do NPOR, passou todo frajola por mim e outro amigo, dois guerreiros cansados. Ele deu um sorriso de superioridade mostrando sua companheira abraçada pela cintura. Era Guiomar, uma das empregadas domésticas mais disputadas da região. Ele dirigiu-se à praia agarrado na cintura fina da monumental mulata. A inveja é o pior sentimento do mundo. Eu e o amigo, depois de algum tempo, também descemos à areia fofa da praia, fomos nos achegando em direção onde Arnaldo amava Guiomar. Eles entretidos não perceberam, estávamos bem perto. Ao ver o casal abraçado, rolando na praia, lambuzando-se de areia, demos um grito para assustar nosso amigo e a bela Guiomar: “É a Polícia!!!!”. Arnaldo nu, completamente melado de areia, levantou-se gritando incontinente: “Sou tenente do Exército Brasileiro, sou tenente do Exército!” Só percebeu a brincadeira quando demos uma gostosa gargalhada. Logo nos retiramos, deixando os dois pombinhos se amarem. Ao olhar para trás percebi dois vultos na água calma e morna do mar, tirando a areia do corpo, a última fantasia, a derradeira do Banho de Mar à Fantasia.
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