Economia

Richard Dubois: o homem que quer ‘comprar’ Brasília

02/02/2020

Em 2014, durante a Copa do Mundo, o empresário Richard Jean Marie Dubois trabalhava como auditor da PwC Brasil, em um prédio que ficava em frente ao estádio de Brasília, o Mané Garrincha. Da janela, via o símbolo maior dos “elefantes brancos” erguidos para o torneio, com custo de R$ 1,7 bilhão aos cofres públicos. “Eu sabia que havia um potencial de negócios muito grande aqui.”

Quase seis anos depois, na semana passada, a arena passou a ser administrada integralmente pelo grupo de Dubois, que tem dominado as privatizações de diversos espaços da capital federal. Além do estádio, ele arrematou o autódromo de Brasília e apresentou propostas para levar a Torre de TV Digital, a rodoviária e o metrô da cidade.

O apetite do “homem que está comprando Brasília” levou nada menos que dez governadores do País a procurarem Dubois para apresentarem propostas de concessão de espaços públicos. O empresário avaliou e já descartou negócios como o estádio do Pacaembu e o autódromo de Interlagos, em São Paulo, mas se mostrou interessado na administração do Maracanã, no Rio.

Com mais de dez anos de trabalho em consultorias que ajudaram a formatar concessões do governo federal em diversas áreas, Dubois abriu uma empresa própria – a RNGD Consultoria de Negócios – no fim de 2015. O capital inicial, diz ele, veio do que ganhou no mercado financeiro. “Já tinha ajudado muita gente a ganhar dinheiro, e resolvi correr um pouco mais de risco.”

Ele bateu à porta do então governador do DF, Rodrigo Rollemberg (PSB), para sugerir um programa amplo de concessões. Mesmo assim, o processo levou mais de quatro anos para ser concluído e o contrato só foi assinado na gestão do atual governador, Ibaneis Rocha (MDB). “Vi que Brasília era a cidade com mais oportunidades de negócios. Há empresários brilhantes aqui, mas eles são poucos. São Paulo e Rio de Janeiro têm uma competição maior.”

Além de um projeto de R$ 22 milhões para recuperar o estádio – já sucateado após seis anos de uso público -, a concessão de 35 anos do Mané Garrincha prevê investimentos de mais de R$ 300 milhões em seu entorno, com a construção de um “boulevard” de compras e lazer. O empreendimento é a maior aposta para retorno financeiro com a operação da arena.

A empresa de Dubois também faz parte do consórcio que chegou a vencer a disputa pela Parceria Público-Privada (PPP) para reconstruir o autódromo internacional Nelson Piquet, localizado ao lado do estádio e fechado desde 2015. A parceria de 35 anos previa investimentos de mais R$ 73 milhões, com aportes de R$ 14 milhões pelo governo distrital, mas o Tribunal de Contas do DF impediu a assinatura do contrato, alegando falhas na modelagem do processo.

Na última quinta-feira, 30,Dubois foi surpreendido por uma decisão do governador Ibaneis, que inabilitou o consórcio, suspendendo a PPP. Dubois diz que o episódio “causou estranheza” e que está analisando como recorrer da decisão.

O empresário não se contenta apenas em gerir os dois principais equipamentos esportivos da cidade. A RNGD apresentou proposta pela concessão da Torre de TV Digital e seu entorno. Pretende explorar a área para promover eventos com a mesma empresa do estádio a um “custo marginal”. Também entregou ao governo estudos técnicos para a concessão da rodoviária do Plano Piloto e para assumir a gestão do metrô de Brasília, sem incluir no projeto a expansão das linhas existentes.

A RNGD disputa ainda a operação de um aeroporto executivo na capital federal. Essa PPP, porém, tem andado a passos mais lentos. “Não somos tímidos e encabulados, mas também não fazemos loucura nenhuma. Sempre tomamos as decisões olhando as planilhas. A decisão é baseada em grana. Se o negócio não for bom, não entramos”, completa.

Outsider

Fontes da área de infraestrutura chamam a atenção para algumas características da atuação de Dubois. Em primeiro lugar, o fato de as concessões disputadas por ele não serem realizadas no ambiente da B3, vista como referência para esse tipo de processo. Todas as licitações do governo do Distrito Federal são tocadas pela Terracap, companhia imobiliária estatal que já esteve envolvida em diversos casos de corrupção no passado. Além disso, em muitos processos a RNGD acabou como única interessada ou única habilitada para a licitação.

Para esses especialistas, também é de se notar a ausência de um grande capital por trás dos negócios do empresário. Normalmente, os grupos que disputam esse tipo de concessão partem de patrimônios na casa das dezenas de milhões de reais. Somado a isso, as fontes apontam a falta de grandes bancos como garantidores dessas operações. Dubois preferiu não comentar esses questionamentos.

Visto como um outsider no setor, Dubois também não é conhecido dentro do Ministério da Infraestrutura – seja pelos secretários ou pelo ministro Tarcísio de Freitas.

Apesar do apetite crescente pelas concessões de governos estaduais, ele diz não ter no radar os projetos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) de Jair Bolsonaro. “Há muitas ideias maravilhosas, mas faltam pedaços: modelagem, risco, engenharia, exigências. É difícil encontrar um projeto que pare de pé”, critica.

Justamente pelo histórico conturbado de algumas concessões no passado que foram irrigadas com recursos de instituições oficiais, Dubois afirma que os consórcios formados para as disputas não são financiados com recursos de bancos públicos. A montagem da empresa e os primeiros anos do negócio foram bancados com capital próprio, diz.

“Recusei diversas propostas de sociedade. Coloquei o meu pescoço a prêmio e mantive o time nesses primeiros anos com dinheiro do meu bolso”, diz. “O mercado privado está buscando projetos consistentes e bem desenhados. Não estamos inovando em nada. Estamos fazendo o que os Estados Unidos e a Europa já fazem há 20 anos, que é apresentar projetos com bom retorno sobre o capital investido. Os bancos de investimento enxergam um alto potencial nesse mercado.”

Na visão dele, com a derrocada de grandes empreiteiras pegas na Operação Lava Jato, abriu-se espaço para novas empresas entrarem nesses negócios. “Os dinossauros morreram. Agora, os pequenos mamíferos estão tomando conta do ecossistema.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Autor: Eduardo Rodrigues
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