Política
‘Não existe prisão processual de parlamentar’
Responsável pela redação do artigo 53 da Constituição Federal, que trata das prisões de membros do Congresso Nacional, o advogado José Roberto Batochio afirmou em entrevista ao 247 que a prisão do senador Delcídio Amaral (PT-MS), realizada nesta quarta-feira 25 no âmbito da Operação Lava Jato, não deveria existir. Ele destaca que a única exceção permitida pela Constituição para a prisão de deputados e senadores, a situação de flagrante, não cabe ao caso do líder do governo no Senado.
Delcídio foi preso sob a acusação de atrapalhar as investigações da Lava Jato. Segundo a Polícia Federal, gravações feitas por Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, revelam que o senador ofereceu dinheiro para que o ex-dirigente da estatal não firmasse acordo de delação premiada e sugeriu uma rota de fuga para o investigado, que está preso em Curitiba desde janeiro.
Para o ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, que autorizou a prisão de Delcídio, o caso se enquadra em “situação de flagrância”. Durante sessão da 2ª Turma do STF que referendou a decisão de Teori nesta quarta-feira, o ministro apontou indícios de que Delcídio fazia parte de uma organização criminosa, e que esta prática “permitia flagrante a qualquer tempo”.
Batochio discorda. “Trata-se de um conceito tão abstrato, tão fluido, tão aberto… que bastaria dizer então que numa determinada situação operada por duas ou quatro pessoas existe situação de flagrante permanente e perpétua a todos”, justificou, destacando, porém, total respeito aos ministros da corte. “Claro que queremos que a lei seja cumprida, mas sem excessos”, observou.
Segundo o advogado, do artigo 53 da Constituição, cuja redação se deve à Emenda Constitucional nº 35, de 2001, “extraímos conclusões praticamente incontestáveis: não existe prisão processual contra membro do Congresso Nacional. Prisão que seja decretada antes da condenação final da qual recorra a prisão. Prisão preventiva, temporária, provisória para membro do Congresso não existe, segundo o nosso sistema constitucional”.
Ele lembra que “a única e exclusiva hipótese” para que isso ocorra é quando o parlamentar é “apanhado em situação de flagrância, ou ‘com a boca na botija’, como se diz”. O advogado discorre ainda sobre o crime permanente, que pode ser usado, como um “jeitinho brasileiro, para se contornar a situação”. Neste caso, “os efeitos, os resultados, as consequências do crime se alongam. Um exemplo é o sequestro”, explica.
Para que o caso de Delcídio fosse considerado flagrante, de acordo com Batochio, o senador deveria ter sido surpreendido oferecendo dinheiro e sugerindo a rota de fuga a Nestor Cerveró, acusações apontadas pela PF. As gravações obtidas pelos investigadores com a conversa entre Delcídio, o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual, e o filho de Cerveró, segundo o advogado, não justificam a prisão, “absolutamente”.
“Ela não alonga a ação de nenhum agente no tempo [para ser considerado crime permanente]. Como é que se prova que a voz é de quem se afirma ser senão depois de uma perícia, uma análise técnica? Dizer que um gravador pode mudar a natureza de um crime espontâneo para um crime permanente é realmente forçar muito a situação”, opina.
“É surpreendente que o STF, a quem está atribuída a tarefa superior de manter, de zelar a estrita Constituição Federal Brasileira, possa ter, com todo o respeito aos ministros e concedidas todas as vênias, vislumbrado crime permanente nessa hipótese [do senador Delcídio Amaral]”, afirma Batochio. “É surpreendente que uma decisão dessas tenha sido referendada pela suprema corte. Serão os novos tempos?”, questiona.
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