Geral
Saxofonista da banda de Ivete Sangalo é de Alagoas
O músico alagoano, de Santa Luzia do Norte, Geraldo Manoel de Souza Júnior, mais conhecido como Júnior Maceió, teve o primeiro contato com o saxofone com apenas 11 anos e aos 13 já tocava profissionalmente. Depois de passar por várias bandas e bares noturnos de Maceió, ele foi morar no Ceará e depois na Bahia. Em Salvador, Júnior tocou com vários artistas, como Carlinhos Brown, Jau Peri, e com o grupo Harmonia do Samba. Atualmente, é integrante da banda da cantora Ivete Sangalo, e paralelamente, se prepara para lançar o seu primeiro disco autoral e instrumental, o “Together y Misturados”. Em entrevista exclusiva ao jornal Tribuna do Sertão, Júnior Maceió fala de seu trabalho, das dificuldades da carreira musical, mas também das alegrias que a profissão proporciona.
Tribuna do Sertão- (T.S) Qual foi o seu primeiro contato com a música?
Júnior Maceió (J.M): Comecei na música aos 11 anos, mas desde pequeno já tinha uma veia musical apurada. Minha mãe, dona Elizete, ouvia muita coisa boa. A gente ouvia os discos de Roberto Carlos e eu ficava impressionado com os arranjos, principalmente os de sopro. Achava lindo aquilo ali, me fascinava. Meus tios também eram envolvidos com a música. Meu tio Manu era sargento do exército, morava em Natal e todo ano ele vinha passar as férias e trazia muitas partituras de chorinho, de frevo, eu ficava louco com as novidades (risos). Ele fez um chorinho pra mim, chamado “Júnior Sax”, a coisa mais linda. E tenho outro tio, chamado José Francisco, sargento da Polícia Militar de Alagoas, e ele me levava para ver os ensaios da banda da polícia, as apresentações, as procissões. E na minha cidade, Santa Luzia do Norte, a maior parte da população é feita de músicos. E foi na Associação Musical Independente que aprendi tudo com o meu padrinho, o maestro Euclides Moreira, que escolheu o sax para ser o meu instrumento. E não posso deixar de falar do Pedrão, que na época tinha um programa de shows de calouros, com jurados, muito conceituado, e me deu a oportunidade de apresentar o meu trabalho para as pessoas. (T.S) Em quais bandas você tocou em Alagoas? (J.M) Eu comecei nas orquestras de frevo, em Santa Luzia. Fazia os bailes de carnavais, os carnavais de rua, com as charangas em época de campanha política, em cima dos caminhões, durante os comícios. Já ganhava os meus cachês com apenas 13 anos. Tocava, também, em serestas com a banda Armação, mas as pessoas da cidade batizaram o nome da banda de “sem futuro” (risos). Animávamos muito as festas, mas não foi muito pra frente não, mas era muito divertido. Toquei em uma banda de baile de chamada Eclipse, lá de Coqueiro Seco. A gente ia tocar nas cidades de caminhão, na chuva, embaixo da lona, para proteger os instrumentos. Em Maceió, toquei em várias bandas de forró como a Paixão de Peão, Companhia do Forró, Conexão Forró e fiz muito barzinho. Até ser convidado pelo Adelson Salvador, também de Santa Luzia, para tocava na Big Band do maestro Ivanildo Rafael. Era uma responsabilidade muito grande. A maioria dos músicos era das forças armadas, caras experientes e eu era o mais novinho, o xodó da banda. Foi ali que de fato meu horizonte musical se abriu. Aprendi muito, o maestro era muito exigente. Ele também foi uma influência musical muito grande. Devo muito a ele e à orquestra. Fomos representar o Brasil no Festival de Montreux, na Suíça, em 97, e foi maravilhoso. (T.S) Você passou um tempo morando no Ceará. Como foi essa experiência? (J.M) Antes de sair de Maceió, fui com a Conexão Forró abrir o show da banda “Cachorro da Molesta”. Eu já tinha aquela coisa de artista, de performance, e tinha investido em um microfone sem fio, pois o sax que eu tocava era da banda. E o dono da “Cachorro”, o Luiz Fidélis, gostou de mim. Minha mãe, que é professora, não queria que eu fosse porque eu estudava na antiga escola Técnica, e estava no terceiro ano do curso de eletrotécnica. Só que na minha cabeça eu nunca seria técnico em eletrônica. E fui pra Juazeiro do Norte, no Ceará, e fiquei lá por um ano. O cachê dava para pagar as contas, apenas isso. Minha mãe tinha que me ajudar em algumas coisas, ralei muito. Estar fora de casa não era fácil, a vida lá fora não foi nada fácil. Eu pensava em uma coisa e acabou sendo outra. Mas sempre fui muito corajoso, e graças a Deus, driblava as dificuldades. Depois, voltei para Santa Luzia, passei um tempo e fui para Salvador. (T.S) Quando você foi morar em Salvador já tinha alguma proposta de banda para tocar? Como foi sua chegada à capital baiana? (J.M) Um amigo de Coqueiro Seco, o Ivanilson, que também é músico e baterista, enxergou o meu talento, segundo ele (risos). Ele viajava muito para Salvador, porque também trabalhava com telecomunicação, e lá se encontrava sempre com o alagoano Nogueira, que também é saxofonista. O Nogueira, que nessa época tocava na Timbalada, falou que eu fosse, que tinha chances por lá, mas nada certo. Um outro amigo, o Joaquim, de Pilar, deu minhas referências ao Nogueira. Eu estava desempregado, em Santa Luzia, e vendi um sax velho e viajei com apenas 300 reais. O Nogueira me apresentou ao Tucano, outro alagoano, e também saxofonista, de Pilar, e me levou para morar lá com ele, em um quarto e sala. Lá eu lavava, passava, arrumava, minha mãe mandava uns 20 reais, que chegavam pelos Correios. Eu ficava muito feliz com aquilo. Em Salvador toquei muito por cachê de três reais, cinco reais, às vezes pela comida. Foi muito difícil. Superei isso e hoje dou mais valor, ainda, a tudo de bom que estou passando. Devo tudo o que eu sou ao passado, às dificuldades que passei. Devo, principalmente, ao Nogueira, ao Tucano, ao Ivanilson e ao Joaquim. Sem eles, não chegaria onde estou e não estaria até hoje em Salvador. (T.S) Com quem você tocou, em Salvador? (J.M) Depois da fase de circuitos em barzinhos, a primeira banda que toquei em Salvador foi a “Boquinha da Garrafa”. Depois, fui para a Patchbum, e a cantora era Cláudia Leitte. Depois, passei pala Companhia do Pagode, Salsalitro, Braga Boys e Colher de Pau. Fui ganhando mercado e as pessoas foram conhecendo o meu trabalho. Até que o Marcelus Leone, hoje saxofonista do Saulo, começou a me chamar pra substituí-lo em shows e gravações de bandas que ele tocava. E foi quando ele me pediu pra gravar com o “Harmonia do Samba”, porque ele precisava fazer uma turnê com o Netinho. Fiquei na maior felicidade. Conheci todos da banda e em pouco tempo, o Bimba, diretor musical do Harmonia, me ligou e me convidou para fazer parte da banda. Eu queria gritar de felicidade (rsrsrs). Em 2008, eu sai do Harmonia, porque estava tudo desgastado. Foram sete anos lá. Deve ter sido a crise dos sete anos (risos). Fiquei desempregado e tive que recomeçar do zero. E veio uma proposta para ir pro Rio de Janeiro, tocar com o Rodriguinho, que era da banda “Os Travessos”. Mas eles desistiram do projeto que incluía o sopro no trabalho. (T.S.) Você pensou em desistir e voltar para Alagoas, ou mesmo ir para outro estado? (J.M) Pensei em alguns momentos de dificuldade. Mas aí veio o convite para tocar com o Carlinhos Brown. Foi um período incrível. Viajamos para o Marrocos, China, a Europa toda e vários países da América do Sul. Uma fase muito boa. A Bahia me acolheu de forma bacana. Os artistas têm o maior respeito por mim e eu por eles. É uma troca. Nesse meio tempo apareceu o Jau Perí. Produzimos vários trabalhos juntos e Brown foi diminuindo as demandas de shows. Paralelo ao Jau, eu fui tocar na Orquestra Rumpilezz, que é do Letieres Leite, na época saxofonista da Ivete Sangalo. A Rumpillez é uma orquestra incrível, é um trabalho muito rico, que mistura ritmos africanos com o jazz, e que está conhecida no mundo inteiro. É diferente de tudo que se vê por aí. Nisso, a agenda da Rumpillez começou a chocar com a da Ivete. O Letieres pediu para sair, eu fui indicado e estou lá até hoje (há cinco anos). (T.S) Qual o seu maior sonho, como artista? (J.M) Na verdade, os dois maiores sonhos da minha vida era tocar com a Ivete e com o Djavan. Um sonho eu já realizei (risos). A minha ida para a banda da Ivete foi algo muito especial. Tocar com a Ivete é algo surreal. Além da musicalidade, o poder que ela tem de dominar as coisas, como ela conduz a carreira dela, a banda, a parte musical. Ela opina em tudo, na letra, no arranjo, na iluminação, no figurino. Ela sabe o que quer, ela é muito bem resolvida. Além do mais, é uma pessoa maravilhosa, de coração enorme e por quem eu tenho o maior carinho. E sinto que ela também tem por mim, por eu ter uma onda musical, ela tem muito respeito por mim, além de um carinho especial. Ela enxergou a minha vertente de solista e tem me colocado muito lá na frente, para tocar, me dá espaço. De vez ela me faz cada surpresa, puxa uma música não sei de onde, não sei de que tom, e chama: “Maceió”, e me manda fazer improviso. Em minha opinião, ela é a maior artista desse país. Não estou dizendo que ela é a maior cantora, apesar de que ela é uma excelente cantora, mas é a maior artista porque reúne várias características em uma pessoa só. Ivete canta bem, atua bem, se posiciona bem politicamente, ela é especial. É uma pessoa abençoada, que Deus colocou a mão e disse: “Você tem a missão de fazer o bem e levar alegria para as pessoas”. E é isso que ela faz, cumpre muito bem esse papel. E agora mãe, ela se tornou mais carinhosa e mais amorosa ainda com todo mundo. Só tenho que agradecer a Deus por estar compartilhando a minha música com essa pessoa tão fantástica que é a Ivete. (T.S) Você também vai lançar o seu primeiro trabalho solo, autoral e instrumental, o “Together y Misturado”. Qual a proposta desse trabalho? (J.M) Together y Misturado”, é uma mistura de ritmos nordestinos, frevo, baião, como faz o nosso mestre maior, o alagoano Hermeto Pascoal. E eu não poderia fugir dessa vertente. Então, misturei tudo isso com o funky, como o de James Brown, com o pop e o jazz. Sou muito fã de jazz. Em2008, eu e o alagoano Márcio Diniz, baterista, ganhamos um prêmio de jazz, da Rádio Educadora de Salvador, com a música instrumental, um frevo, “Cheia de Pantim”. Ainda sobre o disco, faço uma homenagem a Alagoas. Regravei a música Ponta de Lápis, do Roberto Barbosa e nesse meio fiz um arranjo, como música incidental, de “Pagode Alagoano”, de Clemilda, e lá no meio, “Maceió” ,que fala: ‘ai, ai, que saudade ai que dó, viver longe de Maceió’, de Lourival Passos, além de um trechinho do hino de Alagoas. Misturei tudo (risos). Na verdade, eu quis popularizar a música instrumental, cativar as pessoas e mostrar para que o jazz não é música para dormir. O CD sai ainda este ano, mas já tem uma aceitação bacana. Quem é músico vai gostar e quem não é vai curtir. Em cada show sempre convido um cantor e um instrumentista. No disco, tenho a Deise, do Fat Family, como participação especial, e a outra parceria é o Gileno Santana, um grande trompetista baiano da nova geração. Já tocou com o Hermeto, mora em Portugal há muitos anos e já está no segundo disco solo. O disco está bem bacana. Acho que vocês vão gostar. Em breve, quando estiver pronto, espero levar o disco para ser lançado em Maceió. O disco foi gravado e mixado no studio do Xandy, do Harmonia, mas vai ser masterizado em Los Angeles. No momento, ele vai ser lançado nas plataformas digitais, mas tem uma gravadora aí (risos) que quer lançar o disco. Estou torcendo para isso, porque se acontecer vai ser lançado mundialmente. Eu tenho fé em Deus de que isso vai acontecer.
(T.S) Mesmo tocando com a Ivete Sangalo, uma artista renomada, você ainda encontra dificuldades para trabalhar com a música?
(J.M) Ainda é muito difícil viver de música neste país. Não temos uma segurança porque tudo depende de uma agenda. Só ganhamos o que produzimos e temos instabilidade financeira. Mas isso é normal, é natural. Mas enquanto estamos com as agendas cheias, temos que ser prudentes, fazer o ‘pé de meia’. Os instrumentos são caros e investimos muito nisso. Temos que ser bem relacionados, estarmos atualizados, ter boas referências, fazer trabalhos paralelos, e assim, vamos matando um leão por dia. Não basta ser só músico. Tem que cuidar da aparência, viver bem-humorado. A arte é isso. A gente já é tão discriminado que o mínimo que tem que fazer é se apresentar bem. É uma profissão de elegância. Precisa também ser um bom administrador, com foco no que quer fazer, tem que se dedicar. Em Alagoas temos muitos trabalhos bons e medianos. O nosso estado tem uma riqueza cultural muito grande. Os músicos são diferenciados, a maneira de tocar é diferente. Mas viver de música é difícil em Alagoas, na Bahia ou em qualquer lugar. E se na Bahia é difícil, imagino aí. Os lugares onde tudo acontece é no Rio e em São Paulo. Fora isso, apenas as orquestras SpokFrevo, do Recife, e a Rumpilezz, de Salvador, estão conseguindo ter sucesso, viajar pelo mundo. Falo de um trabalho diferenciado, que acho que só essas duas orquestras têm. Fora isso, tudo está meio parado, sem conexão. E se na Bahia é difícil, em Alagoas é muito mais. Tem que ter apoio, incentivo cultural do governo, das secretarias. Mas também tem que correr atrás, não ficar parado. Não é porque toco com a Ivete que eu relaxo. Continuo correndo atrás das coisas todos os dias. Mesmo com tudo isso, tenho muito orgulho da minha profissão. Sinto muito orgulho em ser músico. (T.S) Obrigada pela entrevista e fique à vontade para as considerações finais. (J.M) Quero agradecer à Tribuna do Sertão, de Palmeira dos Índios, terra maravilhosa. Já toquei muito aí. Foi muito bom falar do meu trabalho, da minha carreira e estou feliz por ter participado dessa entrevista, principalmente agora, que estou lançando esse trabalho solo, essa entrevista veio em um momento oportuno. Parabéns à Tribuna do Sertão, por levar informação com seriedade, de maneira clara, e por levar, também, coisas boas para as pessoas. Quando tiver tudo certo, espero contar com todos da Tribuna do Sertão no lançamento do meu disco, em Maceió. E quem sabe não faço um show aí, em Palmeira?
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