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O pianista
Os enormes e aristocráticos salões do Hotel Excelsior, localizado na via Veneta, em Roma, regurgitam de turistas, diplomatas e empresários. O movimento é incessante. O frio de dezembro, na Europa, leva as pessoas a procurarem o calor e o conforto dos cafés e dos restaurantes.
Atraídos pelo mavioso som de um piano, João Tenório e eu nos dirigimos para o acolhedor bar do Hotel. O “maitre”, com dificuldade, nos consegue uma mesa. Pedimos uísque e concentramos nossa atenção no pianista. Seu físico configura-se com a suavidade da música. Mais baixo do que alto, no máximo um metro e sessenta centímetros de estatura, magro e pálido, seu rosto, de traços clássicos, tem a palidez de quem vive a noite. Ele parece não cantar, e, sim, dialogar com a música. Sua voz meiga, quase sussurrada, como que hipnotiza. Uma magia nos envolve, um estado de graça e leveza nos domina.
O rapaz que se encontra à mesa, à nossa direita, visivelmente espera alguém. De instante a instante olha o relógio e perscruta o “hall”. A angústia é a de quem espera uma mulher muito amada. Ela chega, denotando, com o olhar, apreensão em virtude do atraso. Sorri ao encontrar o rapaz. O sorriso primeiro vem dos olhos e, depois, os lábios acompanham. O bar está repleto de mulheres bonitas, mas elas ficam emudecidas diante da recém-chegada. Loura, alta, esguia, com cabelos dourados que descem em ondas sobre seus ombros, atrai os olhares. Ao retirar o casaco de peles, um corpo divino revela-se. O vestido preto, colante, delineia suas linhas perfeitas. O generoso decote mostra a maciez de sua pele. O rapaz, ajudando-a a tirar o casaco, torna-se, ao beijá-la, alvo da inveja geral dos homens.
O pianista, coincidência ou não, interrompe seu canto. Naturalmente deseja homenageá-la. Poderia ser italiana, francesa, americana ou inglesa. Deduzo, entretanto, pela graciosidade de seus gestos, que seja francesa. É conveniente explicar que sua beleza não é do gênero ”cheguei”. Pelo contrário, é a meiguice que a faz tão encantadora e atraente. Não acompanha o rapaz, que bebe conhaque, e pede Kirsch Royal. Solicita ao pianista que toque Emmanuelle, que parece ser sua canção preferida.
O casal irradia uma imagem de amor. O entrelaçamento de mãos, os beijos prolongados, as carícias trocadas prenunciam o viver de um furacão de emoções.
Roma, apesar de visitada várias vezes, perpetuou em mim aquele quadro. Sempre que penso na atmosfera romântica da cidade, visualizo aquele casal e o pianista do Hotel Excelsior. Eles aqueceram e preencheram uma fria e solitária noite do inverno europeu.
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