Geral

A falácia do advogado de Cachoeira

19/07/2012

  Minha coluna nesta semana não será minha! Deixo-a inteiramente aos cuidados do colega de infância, Bergson Toledo Silva, delegado aposentado da Polícia Federal e filho do notável tabelião Benedito Almeida, de Igaci.  Fico feliz em trasladar o texto enviado pelo colega advogado que, fazendo uso da crítica apresentada pelo jornalista Augusto Nunes, na Revista VEJA, nos oferece uma lição de vida e de profissão, vivida e praticada pelo saudoso e imortal Heráclito Fontoura Sobral Pinto (1893-1991), o mais famoso advogado dos comunistas. 

Em seu artigo, “Direto ao Ponto”, Augusto Nunes contesta o Dr. Márcio Thomaz Bastos, que, num momento de profunda infelicidade, afirmou à Folha de São Paulo: “Serei eu o juiz do meu cliente?” E disse mais: “Por princípio, creio que não! Sou advogado constituído num processo criminal. Como tantos, procuro defender com lealdade e vigor quem confiou a mim tal responsabilidade”. Ora, diz o jornalista Augusto Nunes, isso é conversa fiada. Esse discurso de moralidade e de ética está relacionado com o preço cobrado pela “missão” de defender o maior contraventor penal do país, Carlinhos Cachoeira, cuja cifra está na ordem de 15 milhões de reais. Um bom dinheiro para um belo discurso…
Portanto, contrariando o advogado criminalista, Márcio Thomaz Bastos, ex-Ministro da Justiça (no Governo de Lula) e ex-Presidente do Conselho Federal da OAB (no período da Constituinte em 1988), o jurista mineiro Sobral Pinto, com sua notória sabedoria cristã e jurídica, teria dito em Carta escrita em outubro de 1944: “O primeiro e mais fundamental dever do advogado é ser o juiz inicial da causa que lhe levam para patrocinar. Incumbe-lhe, antes de tudo, examinar minuciosamente a hipótese para ver se ela é realmente defensável em face dos preceitos da Justiça. Só depois de que eu me convenço de que a Justiça está com a parte que me procura é que me ponho à sua disposição”.
Em 16 de outubro de 1944, ao ser procurado pelo poeta e empresário Augusto Frederico Schmidt (editor dos livros de Carlos Drummond de Andrade, de Graciliano Ramos, entre outros), o advogado Heráclito Fontoura Sobral Pinto recusou o patrocínio de uma causa judicial, de natureza trabalhista, em favor do amigo. Augusto Schmidt ficou indignado. Mas, a regra de Sobral Pinto também se aplicava aos velhos amigos: “Não seria a primeira vez que, procurado por um amigo para patrocinar a causa que me trazia, tive de dizer-lhe que a Justiça não estava do seu lado, pelo que não me era lícito defender seus interesses”.
Por isso, na sua carta de 1944, acrescenta Sobral Pinto: “A advocacia não se destina à defesa de quaisquer interesses. Não basta a amizade ou honorários de vulto para que um advogado se sinta justificado diante de sua consciência pelo patrocínio de uma causa. (…) O advogado não é, assim, um técnico às ordens desta ou daquela pessoa que se dispõe a comparecer à Justiça. (…) O advogado é, necessariamente, uma consciência escrupulosa ao serviço tão só dos interesses da Justiça, incumbindo-lhe, por isto, aconselhar àquelas partes que o procuram a que não discutam aqueles casos nos quais não lhes assiste nenhuma razão”.
Portanto, como argumentou o quase centenário Sobral Pinto, “advogado é o juiz inicial da causa”. Não pode agir como comparsa.
Mas, como Heráclito Fontoura Sobral Pinto continua atual, por ter sido um exemplo de homem público e de advogado brilhante, vale publicar outras “pérolas” da sua convicção moral e ética: Eis aqui outros textos inerentes à advocacia, ditadas pelo mineiro imortal, que deveriam ser reproduzidas nos pórticos e nos auditórios das faculdades de Direito: “É indispensável que os clientes procurem o advogado de suas preferências como um homem de bem a quem se vai pedir conselho. (…) Orientada neste sentido, a advocacia é, nos países moralizados, um elemento de ordem e um dos mais eficientes instrumentos de realização do bem comum da sociedade”… Pensemos nisso! Por hoje é só.