Mundo Científico

Rã japonesa resiste ao veneno da 'vespa assassina' e pode inspirar novos tratamentos para dor

Pesquisa revela que anfíbio suporta múltiplas picadas da vespa-mandarina sem danos, abrindo caminho para avanços no estudo da dor e inflamação.

Agência O Globo - 17/12/2025
Rã japonesa resiste ao veneno da 'vespa assassina' e pode inspirar novos tratamentos para dor
Imagem ilustrativa gerada por inteligência artificial - Foto: Nano Banana (Google Imagen)

Um estudo publicado em 3 de dezembro na revista científica Ecosphere revelou que a rã-de-lagoa-de-manchas-pretas-japonesa (Pelophylax nigromaculatus) é capaz de devorar a vespa-mandarina (Vespa mandarinia), conhecida como “vespa assassina”, sem apresentar efeitos adversos. A pesquisa foi conduzida pelo ecologista Shinji Sugiura, da Universidade de Kobe, no Japão, e ganhou destaque na revista Smithsonian.

O experimento envolveu 45 rãs, cada uma exposta a uma vespa de três espécies diferentes: vespa-mandarina, vespa-amarela e vespa-da-cloaca. Apesar de receberem picadas na boca, língua e olhos, os anfíbios não morreram nem apresentaram sinais de intoxicação.

Os resultados mostraram que 79% das rãs consumiram a vespa-mandarina, enquanto 87% e 93% delas ingeriram as outras duas espécies testadas. Em nenhum dos casos houve regurgitação das presas ou danos aparentes, mesmo diante de ferroadas consideradas letais para outros animais.

Resistência incomum ao veneno

Segundo Sugiura, a resistência observada nas rãs é rara quando comparada a mamíferos de porte semelhante. “Um rato pode morrer com uma única picada, mas as rãs não apresentaram nenhum dano, mesmo após serem picadas repetidamente”, afirmou o pesquisador à Smithsonian. O estudo teve início após a identificação de restos de vespas em estômagos de rãs, somada a evidências anteriores de tolerância desses anfíbios a venenos de outros himenópteros.

A explicação científica mais aceita sugere que anfíbios apresentam maior tolerância a toxinas porque muitas espécies produzem seus próprios venenos. Brian Gall, biólogo do Hanover College citado pela Smithsonian, observou em estudos semelhantes que sapos-americanos conseguem ingerir insetos altamente venenosos sem sofrer efeitos nocivos, graças à forma como engolem as presas e ao muco que as envolve.

Para Sugiura, o veneno da vespa-mandarina parece ter evoluído principalmente para afastar aves e mamíferos, seus predadores mais comuns, e não anfíbios. Isso explicaria por que a rã japonesa não é afetada por ataques fatais para outros animais.

A vespa-mandarina, considerada a maior do mundo, ganhou notoriedade após ser detectada na América do Norte. Identificada há cerca de seis anos na Colúmbia Britânica e no noroeste do estado de Washington, foi alvo de campanhas de erradicação e declarada eliminada dos Estados Unidos em dezembro de 2024. Uma única picada pode matar um rato, e grupos do inseto são capazes de destruir colmeias inteiras.

Além de ampliar o entendimento sobre relações entre predadores e presas, a descoberta pode ter implicações futuras na medicina. Sugiura afirmou à Smithsonian que pretende investigar os limites dessa tolerância e se os anfíbios resistem a outros venenos. Compreender os mecanismos fisiológicos envolvidos pode, no futuro, contribuir para o desenvolvimento de tratamentos contra dor e inflamação em humanos.