Um documento histórico preservado fora do Brasil, no acervo da biblioteca da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, pode se tornar peça-chave para revelar aos brasileiros um capítulo pouco conhecido — e por muito tempo negado — da história nacional: a existência de comunidades negras vivendo em liberdade durante o período colonial.

Trata-se da versão original manuscrita do Brasilia Qua Parte Paret Belgis (“A parte do Brasil que pertence aos neerlandeses”), elaborada pelo matemático e naturalista alemão George Marggraf. O documento reúne nove mapas das Capitanias e Câmaras do Brasil Neerlandês, período que corresponde à invasão e ocupação holandesa no Nordeste brasileiro, entre 1630 e 1654.

O mapa foi localizado pelo cartógrafo histórico Levy Pereira e, desde então, passou a despertar o interesse da comunidade acadêmica brasileira. Atualmente, o material serve de base para um grupo multidisciplinar de pesquisadores que reúne arqueólogos, geógrafos, historiadores e antropólogos da Universidade Federal de Alagoas (UFAL – Campus Sertão) e da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).

A partir da análise detalhada do documento, os pesquisadores buscam identificar vestígios do que podem ter sido os quilombos mais antigos da região do Quilombo dos Palmares, área histórica situada entre os atuais estados de Pernambuco e Alagoas. A hipótese é de que o mapa registre territórios ocupados por populações negras livres muito antes dos registros oficialmente reconhecidos pela historiografia tradicional.

Caso confirmadas, as descobertas podem ampliar significativamente a compreensão sobre as formas de resistência, organização social e autonomia das populações negras no Brasil colonial, reforçando a importância do Quilombo dos Palmares como símbolo de liberdade, mas também revelando que essa experiência pode ter sido ainda mais antiga e complexa do que se imaginava até hoje.