Entre Pinhas e Laranjas
Graciliano Ramos, em sua célebre amargura literária, declarou certa vez que de Palmeira dos Índios só sentia falta das pinhas. Não era difícil imaginar o porquê. As pinhas, com sua doçura peculiar, são a única coisa que o tempo e as agruras da vida política local não conseguem azedar. Ah, Graciliano, quem diria que, décadas após sua partida, essa cidade que você governou com retidão e severidade seria lembrada não pelas pinhas, mas por outro fruto tropical que ganhou protagonismo por aqui: a laranja.
E não estou falando daquelas doces, suculentas, que adornam sucos matinais. Não, essas laranjas são outras. São frutos azedos, bichados, que no pé, tem um enxame de marimbondos prontos para ferroar qualquer um que ouse se aproximar demais. Uma praga agrícola? Que nada! Estamos falando de uma política de praga.
É que em Palmeira dos Índios, terra de escritores e contradições, a sucessão de poder virou coisa de família — quase um "negócio de pomar". Quando o ex-prefeito Júlio Cezar decidiu que sua sucessora seria Luisa Duarte, os críticos mais perspicazes notaram um estranho acaso. Luisa, apesar da posse do cargo, parecia ter menos autonomia do que o ventilador da Câmara dos Vereadores na noite de sessão: girava conforme o comando remoto do sobrinho ilustre. Nomeada prefeita, mas considerada por muitos uma mera "laranja", ela facilmente retribuiu o favor, nomeando Júlio como secretário de governo com poderes que fariam o Graciliano franzir ainda mais o cenho do que de costume.
E assim, o que era para ser uma gestão municipal tornou-se um espetáculo de marionetes. Júlio, com a habilidade de uma experiência ventríloqua, fez a plateia questionar quem de fato ocupava o cargo. Luisa, a prefeita de direito, parecia mais interessada em garantir que os cordões estivessem bem firmes do que em governar de fato.
Mas a ironia não termina aí. Numa cidade onde as pinhas eram outrora o orgulho local, as laranjas de hoje são símbolos de escândalo. Só que essas não adoçam nem refrescam. Pelo contrário, seu sabor amargo reflete uma política que, como os frutos bichados, é inservível para o consumo humano.
Imagine, caro leitor, se Graciliano fosse chamado a opinar sobre a safra atual. Ele, que não poupava palavras nem para criticar as próprias agruras da vida, talvez escrevesse algo ácido, mas brilhante, sobre os novos frutos de Palmeira. Certamente encontraria no caldo azedo da política local inspiração para um capítulo extra de Memórias do Cárcere, atualizando os presos políticos por eleitores decepcionados.
E assim seguimos, entre pinhas que adoçam a memória e laranjas que amargam a realidade. Palmeira dos Índios continua sendo um pomar de contradições, uma terra onde os frutos sempre têm para contar — mesmo que nem sempre sejam doces.