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Quase um conselho

01/07/2022
Quase um conselho

A primeira semana de aula pode ser resumida através da imagem de alunos sorridentes se reencontrando com os seus iguais, com seus companheiros de caminhada, num misto um tanto confuso de emoções, que acaba por tomar conta de seus corações nesse momento.

Com esse olhos cansados, e do alto de minha barba e cabelos grisalhos, posso dizer com sobriedade que já vi muitos desses momentos onde bons amigos se reveem no colégio depois de um tempo, onde todos, cada um do seu jeito, e junto com os membros da sua “panelinha”, contam alegremente as venturas e desventuras que foram vividas por eles no período das férias, prosa essa que é seguida pela proposição de planos que eles pretendem executar nos próximos dias do ano letivo que está iniciando. Enfim, é um trem bonito de se ver. Bonito mesmo, mas que passa, bem rapidinho.

Todavia, não é a respeito desses momentos de regozijo que proponho-me a escrevinhar. Não senhor. Isso, talvez, fique para outra ocasião. Como ensinador que tento ser, gostaria de compartilhar, por meio dessas linhas tortas, um conselho que, creio eu, seja de suma importância para todo caboclinho que realmente deseja progredir em seus estudos e crescer em espírito e verdade.

Dito isso, vem comigo: é imprescindível que nunca nos esqueçamos que o fundamento da nossa inteligência é a nossa capacidade de atenção. Quanto mais nós procuramos exercitar essa capacidade, mais iremos ampliar o nosso poder de compreensão e, obviamente, quanto mais nós desleixarmos desse propósito, mais disperso seremos e, consequentemente, isso acabará por limitar de forma severa nossa capacidade de entendimento.

Para tanto, é de suma importância que nos confessemos, de forma humilhante, diante do tribunal da nossa consciência. Confessemos que, para nossa retumbante infelicidade, pouquíssimas vezes, para não dizer nenhuma vez no correr de um ano, nós procuramos exercitar o nosso poder de concentração e, para “compensar”, entregamo-nos garbosamente ao desfrute que nos é propiciado pelas redes sociais com seu fluxo contínuo e infindável de estímulos que vão condicionando a nossa percepção a centrar-se apenas por alguns segundos em algo aqui, ou acolá, que apenas excita superficialmente os nossos sentidos, limitando severamente nossa capacidade de concentração.

Isso mesmo. Mídias eletrônicas, de um modo geral, provocam, como um efeito residual devastador, a perda do nosso poder de concentração e, se nossa capacidade de prestar atenção é a base de sustentação e ampliação da nossa inteligência, a exposição excessiva a essas bugigangas eletrônicas arrebenta, sem dó, em trocentos pedaços a nossa inteligência, deixando-nos inquietos, ansiosos e hipersensíveis, limitando à nossa disposição para ficarmos um longo período de tempo centrados na realização de uma leitura ou na resolução de uma série de questões e problemas.

Ora, onde impera o desassossego, onde reina a inquietude, o entendimento e a compreensão não conseguem fazer morada.

Não é à toa que, segundo estudos recentes – concluídos em 2020 – constatou-se que a capacidade de concentração dos seres humanos está sendo reduzida de forma severa. Isso mesmo cara pálida. Atualmente, em média, uma pessoa consegue se concentrar por apenas oito segundos. Oito segundos maluco! Já parou pra pensar o que isso significa?

Abre parênteses: na categoria capacidade concentração, uma pessoa perde para um peixinho dourado, que é capaz de se concentrar em algo por nove segundos. Fecha parênteses.

Além disso, junto com a diminuição do poder de concentração, temos o desperdício de tempo, esse bem precioso que nos é confiado por Deus para que façamos um bom uso dele. Apenas a título de ilustração, o brasileiro, em média, dedica três horas e quarenta e dois minutos por dia às redes sociais. Velho! São quase quatro horas por dia literalmente jogadas na privada da vida. Detalhe: estamos em terceiro lugar no ranking desse quesito. Perdemos apenas para os Filipinos e para os Colombianos.

Aliás, perguntemos a nós mesmos: quantas e quantas vezes, ao terminar de ler a página de um livro, nós tivemos a clara sensação de que não captamos literalmente nada do que acabamos de ler? Quantas e quantas vezes, após terminarmos a leitura de um parágrafo, nós não fomos capazes de sintetizar o que os nossos olhos acabaram de solver? Quantas? Pois é.

Infelizmente, ignoramos olimpicamente que a inteligência, de todos os bens que podemos dispor em nossas mãos, é o único, repito, o único que quanto mais a gente perde, menos falta sentimos e, reconheçamos ou não, quanto menor se torna nossa capacidade de concentração, mais significativa é essa perda e, mais difícil fica a reversão desse mal adquirido.

Enfim, o tempo passa, passa bem rapidinho, mas ainda há tempo para lutarmos contra esse mal que insiste em nos subjugar.

 

Escrevinhado por Dartagnan da Silva Zanela – professor e cronista ([email protected])