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Sandoval Caju
A juventude estudantil de Maceió, na segunda metade dos
anos cinqüenta, tinha um encontro marcado, às noites de quarta-feira, com o programa Palito de Fósforo, o incendiário dos auditórios, na Rádio Difusora de Alagoas. À época, a capital alagoana era bem provinciana. Havia uma carência enorme de diversões.
Não existia televisão e o rádio era o grande meio de comunicação. A popularidade do programa decorria da versatilidade artística e do senso de humor do poeta e jornalista Sandoval Caju. Paraibano de Bonito de Santa Fé, espirituoso, envolvente, carismático, em pouco tempo conquistou os maceioenses.
O auditório, às vinte horas, já estava completamente lotado. O programa tinha início quando terminava a Hora do Brasil. Todas as lâmpadas eram desligadas. Escuridão total. Abria-se a cortina do palco. Sandoval acendia um fósforo e saudava a platéia. Enquanto a iluminação voltava, palmas e vaias respondiam à saudação. O Regional dos Professores tocava “Pajuçara” e começava o show: duas horas de brincadeiras, anedotas, empulhações e músicas. O forte do apresentador era a improvisação.
O prestígio popular, conquistado através do Rádio, levou Sandoval Caju, naturalmente, à prática política. Candidato a Prefeito de Maceió, galvanizou a cidade. A candidatura, no início, foi recebida como uma piada. E, em verdade, os comícios eram verdadeiros “shows”. A estudantada começou a comparecer em massa. O sentimento de vitória dominava os adeptos de Sandoval. Surgiam contribuições de material de campanha. As concentrações aumentavam de comício para comício. O último, na Praça Marechal Deodoro, foi uma verdadeira apoteose. Sandoval chegou de terno branco, para, segundo ele, falar mais claro. Delirantemente aplaudido, iniciou o discurso invocando o testemunho do patrono da praça.
– Marechal Deodoro da Fonseca, insigne Proclamador da República, os incrédulos, os homens de pouca fé, ousam afirmar que perderemos a eleição. Quero perguntar a Vossa Excelência: esta parada é ou não é nossa?
A multidão magnetizada esperava que a estátua respondesse. Os segundos passavam. O silêncio era absoluto.
O candidato retomou a palavra.
– Quem cala, consente. Ganhamos a parada. Só poderíamos perder esta se o cupim desse na urna.
Palmas e sorriso geral.
O resultado confirmou a tendência do eleitorado. Sandoval Caju foi eleito com magnífica votação.
Levou o singular de sua personalidade para a administração pública. Temperamento irrequieto, agilizou as obras de pavimentação e construção de praças, não atendendo aos prazos e às exigências de licitação. Certa feita um construtor, recebendo ordem para pavimentar uma rua, perguntou pela concorrência, recebendo a resposta de que ela seria feita durante a execução dos trabalhos.
O importante era que começasse logo. O povo gostava da velocidade no atendimento dos pleitos. Trabalhava-se dia e noite. Cada inauguração era uma festa. As novas praças embelezavam Maceió.
Chefe da Divisão dos Impostos Predial e Territorial, recebi convite do Prefeito Sandoval Caju, para assumir a Direção-Geral da Municipalidade. Meses depois, à véspera do Ano-Novo de 1962, convidou-me para Secretário-Geral de Administração.
Permaneci no cargo até 1963, quando fui convidado, pelo Governador Luiz Cavalcante, para integrar sua equipe, assumindo, logo depois, a Secretaria da Fazenda.
Explodiu o movimento de março de 1964. Sandoval Caju perdeu os direitos políticos. Mesmo na adversidade, permaneceu com seu senso de humor. Vendo, no birô do advogado que elaborava sua defesa, a enorme papelada do processo de acusação, comentou, em tom de blague:
– Estamos no reinado do Papa João XXIII. O último Pio foi o XII. Se tudo isso for verdade, estarei preso até o reinado do milésimo Pio.
Sandoval Caju, advogado militante, viveu as ilusões do poder e a angústia do ostracismo, permanecendo, entretanto, apaixonado pela política, a mais bela e a mais volúvel das amantes. Autor dos livros O Conversador, de memórias, cujo segundo volume se encontra inédito; Embaixatriz da Simpatia, narrativa de uma visita recebida, e Sonhos e Pesadelos, de poesias, permanece vivo na memória dos alagoanos como um homem culto, cujas tiradas inteligentes sempre surpreendiam, revelando as originais idéias de que era dotado.
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