Variedades
Gabriel Leone prepara álbum com repertório emocional

No disco que Guilherme Arantes lançou em 1976, entre duas faixas que viraram hits, Meu Mundo e Nada Mais e Cuide-se Bem, o ator Gabriel Leone se fixou em outra: Antes da Chuva Chegar. Uma canção bastante imagética, com um clima de tempestade se aproximando e versos que falam em "rua deserta e forrada de folhas caídas que voam ao léu" para, no refrão, chamar atenção para o que o mesmo vento apresenta antes de a chuva cair.
Antes da Chuva Chegar é uma das canções que Leone escolheu para seu primeiro álbum, Minhas Lágrimas, que será lançado pela gravadora Som Livre, em data ainda a ser definida. Ela tem o que Leone busca também quando escolhe um personagem: uma boa história para contar.
Embora cantar não seja uma novidade em sua carreira - Leone, de 32 anos, começou sua trajetória como ator no teatro musical -, esse será seu primeiro trabalho pensado como tal: um disco com faixas com as quais ele pode se mostrar sem um personagem constituído em função de um roteiro, mas com uma costura de sentimentos que ele deseja expressar com sua voz.
"É uma aventura, mas com o estofo de ator que tenho, de interpretar. Eu sou um intérprete, tenho essa ferramenta de trabalhar com o texto e achar as medidas para cada música", afirma Leone, querendo abraçar som e imagens no novo trabalho, amadurecido ao longo dos últimos sete anos. "Jamais faria algo por fazer ou puramente comercial", completa.
O Estadão acompanhou com exclusividade uma tarde de gravação do disco, em um estúdio no bairro da Bela Vista, em São Paulo, e ouviu outras três canções: Bolero de Satã, parceria de Guinga e Paulo César Pinheiro; Choro das Águas, de Ivan Lins e Vitor Martins; e Cara Limpa, de Paulo Vanzolini. As faixas ainda estavam com a voz-guia, que serve como base para a banda e os arranjos.
Com produção de Marcus Preto, que já trabalhou com nomes como Gal Costa, Erasmo Carlos e Jota.pê, e do músico Tó Brandileone, do grupo 5 a Seco, o álbum ainda traz faixas como Nós Dois, de Celso Adolfo; Assim Sem Mais, de João Bosco, Antonio Cicero e Waly Salomão; e Êta Nóis, de Luhli e Lucina - esta última deve ganhar dueto com Ney Matogrosso, que gravou a faixa nos anos 1980. Juliana Linhares também foi convidada para participar. Em todas, há um elemento comum: o drama.
LADO B. Leone assume que se trata de um álbum triste. "Sim, tem esse peso, que fala muito com a minha profissão, com o ator que eu me encaminhei para ser. Bolero de Satã, por exemplo, é uma paixão recente, de um autor (Guinga), que mudou minha forma de ouvir música", diz.
Além do drama, há outro detalhe: as faixas são o que se chama de "lado B" dos artistas. Um exemplo: em vez de escolher Açaí, hit de Djavan, Leone selecionou Segredo, canção menos conhecida do compositor. "Ele é bem nerd, nesse sentido. Às vezes, me traz canções que eu nem conhecia", diz o produtor Marcus Preto.
Depois da seleção das faixas, foi preciso dar uma "cara" ao disco, e costurar autores tão distintos. "É um disco de MPB raiz, mas com um pé no rock", define Leone. "Sou um roqueiro. Mas, brincamos aqui no estúdio que eu gosto, na mesma medida, de Fagner e Led Zeppelin. Sinto dessa forma. Meu coração escuta os artistas da MPB com a mesma paixão e interesse que os do rock. Sou fruto dessa mistura. E o disco sintetiza isso", explica.
TEATRO MUSICAL. O rock faz a cabeça de Leone desde os tempos do colégio, quando formou com amigos uma banda dedicada ao gênero. Com a aproximação com o teatro, e a dificuldade de achar testes para peças, Leone encontrou seu caminho em audições para musicais. Fez Os Miseráveis, Rapsódia - O Musical, Garotos e Chacrinha, O Musica - nesse último, interpretou o cantor Roberto Carlos, personagem a que voltou a dar vida no filme Minha Fama de Mau, em 2019.
Na televisão, Leone cantou na abertura da série Os Dias Eram Assim, da TV Globo, na qual também atuou. Quando apresentou a série Milton e o Clube da Esquina, produzida pelo Canal Brasil em 2020, dividiu os vocais da música Um Girassol da Cor do Seu Cabelo com Milton Nascimento. No cinema, interpretou músicas inéditas da parceria Arnaldo Antunes e Odair José no filme Meu Álbum de Amores, no qual era Odilon Ricardo, um cantor de música brega dos anos 1970.
Mais recentemente, Leone esteve no longa de produção americana Ferrari (2023) e protagonizou a série Senna (2024), da Netflix, trabalhos que lhe deram projeção internacional como ator. E tudo indicava que ele apostaria suas fichas nessa porta que se abriu. Leone quer atuar, mas também quer cantar. Para ele, tudo cabe neste momento.
O ator integra ainda o elenco de O Agente Secreto, filme do cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho. O longa, que se passa nos anos 1970, no contexto da ditadura militar, tem Wagner Moura como protagonista. Vencedor de dois prêmios em Cannes, de melhor diretor para Kleber Mendonça Filho, e de melhor ator para Moura, o filme já começa a ser ventilado como possível candidato ao Oscar 2026. Na produção, Leone interpreta Bobbi, personagem ligado ao regime militar e definido pelo ator como "silencioso". Leone elogia a capacidade do diretor em criar coadjuvantes verdadeiramente interessantes.
O Agente Secreto está previsto para estrear em 6 de novembro. "É um roteiro realmente incrível. Independentemente dos prêmios, que foram merecidos, é uma sensação sem igual, de orgulho", diz. "Essa é a sensação que eu quero ter quando pegar o vinil do meu disco e colocá-lo para tocar na vitrola", completa Leone, retornando para o ponto de partida da conversa: a música.