Alagoas

FPI do São Francisco visita Pau Ferro, a mais nova comunidade quilombola certificada em Alagoas

Reconhecimento oficial abre portas para acesso a direitos e políticas públicas

Redação com Ascom MPAL 24/08/2025
FPI do São Francisco visita Pau Ferro, a mais nova comunidade quilombola certificada em Alagoas
Foto: FPI

Preservando sua memória através da história oral por mais de um século, Pau Ferro, em Jacaré dos Homens, recém-certificado pela Fundação Palmares, foi a mais nova comunidade quilombola visitada pela Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco.

Reconhecida há pouco mais de 20 dias, a visita da equipe Comunidades Tradicionais e Patrimônio Cultural marcou o início de um novo capítulo para as 78 famílias que vivem no povoado: além do reconhecimento histórico, a comunidade passa agora a ter acesso a políticas públicas específicas voltadas para povos e comunidades tradicionais.

Durante a atividade, representantes de diversas instituições dialogaram com moradores sobre direitos e caminhos para acessar benefícios sociais e produtivos. Entre os pontos destacados, o esclarecimento pelo articulador estadual do Projeto Dom Hélder Câmara (PDHC III), vinculado ao Ministério de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Humberto Santos, sobre o Cadastro Ambiental Rural (CAR) coletivo e o Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF). “Agora que saiu a certificação quilombola, essa população deve buscar o CAR coletivo e o CAF, que podem ser feitos de forma simplificada por comunidades quilombolas, dispensando a exigência de propriedade individual da terra. O documento abre as portas para programas de crédito, assistência técnica e apoio à produção”, destacou Humberto Santos.

“Esse reconhecimento fortalece a identidade do povoado e garante acesso a políticas públicas que antes eram distantes. O próximo passo é que a própria comunidade defina se deseja dar entrada no processo de titulação de terras junto ao Incra”, reforçou o procurador da República Eliabe Soares, titular do ofício de comunidades tradicionais do MPF em Alagoas.

Pau Ferro já possui uma forte associação de produtores de leite, além de uma associação de moradores que promove a produção de bolos para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). A comunidade também recebeu um trator do Dnocs, mas ainda enfrenta carências de equipamentos agrícolas, como colheitadeira e ensiladeira, que poderiam ampliar a produtividade de milho e feijão, tão típicos na região.

Desafios em infraestrutura e serviços básicos


Apesar da força organizativa, os moradores relataram desafios em serviços essenciais. A falta de água é uma das principais preocupações: mesmo no inverno há dias em que o abastecimento falha. A comunidade depende da Companhia de Abastecimento de Alagoas (Casal), mas no verão precisa contar com carros-pipa enviados pelo município a cada 15 dias, ao longo de vários meses de desabastecimento.

Para Max Luiz, assessor de Governança e Transparência, da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh), essa situação precisa ser melhor analisada para que alternativas sejam encontradas. “Levar água de qualidade até as casas dessas famílias durante todo o ano é garantir dignidade e condições reais de permanência no território".

Cada residência possui uma fossa seca, e o serviço de coleta de lixo ocorre semanalmente, sem necessidade de queima de resíduos.

Na saúde, a população precisa se deslocar até a comunidade quilombola vizinha de Caititus, a cerca de 2 km, onde o posto funciona apenas um dia por semana e com poucos horários. A ausência de um posto de saúde em Pau Ferro é considerada uma necessidade, assim como a regularização do abastecimento de água é considerada uma urgência.

Na educação, a oferta se restringe à etapa infantil, embora o transporte escolar seja considerado satisfatório. Outro ponto de destaque foi a expectativa em torno de um projeto habitacional pelo programa Minha Casa Minha Vida Rural (MCMVR), que deve contemplar inicialmente 50 famílias. Atualmente, quatro casas de taipa ainda estão em uso na comunidade.

O coordenador da equipe Comunidades Tradicionais e Patrimônio Cultural, Ivan Farias, antropólogo do MPF, destacou que a união entre os quilombolas é a marca mais importante dessa comunidade recém-certificada pela Fundação Cultural Palmares, reforçando que a união os fará prosperar conjuntamente.

O Incra ressaltou que comunidades quilombolas com território demarcado e os mesmos direitos de assentamentos da reforma agrária, como acesso a créditos federais e, em etapas mais avançadas da titulação, direito a unidades habitacionais. Para os representantes da equipe de Comunidades Tradicionais e Patrimônio Cultural, o passo mais importante será a formalização do processo de regularização junto ao Incra.

Comunidades Tradicionais na FPI


Diferentemente de outras equipes da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco em Alagoas, a equipe de Comunidades Tradicionais e Patrimônio Cultural presta-se não à fiscalização dessas comunidades, mas à sua proteção e preservação. A defesa dos modos tradicionais de vida do povo da bacia do Rio São Francisco, que tem uma relação de dependência da terra, de onde tira seu sustento, é importante para todo o ecossistema. O fortalecimento dessas comunidades passa diretamente pelo acesso a políticas públicas e programas de geração de renda.

Participaram das atividades no Quilombo Pau Ferro: representantes do MPF, Incra, MDA, Semarh, Rede Mulheres de Comunidades Tradicionais (RMCT), Instituto Hori e da ONG Agendha – Assessoria e Gestão em Estudo da Natureza, Desenvolvimento Humano e Agroecologia. Tudo com o acompanhamento dos procuradores da República Eliabe Soares, titular do ofício de Comunidades Tradicionais do MPF em Alagoas, e Érico Gomes, membro do núcleo de Meio Ambiente do MPF em Alagoas e um dos coordenadores gerais da FPI no estado.