Cidades
Condenação histórica no TRE: ex-deputado Severino Pessoa é mantido culpado por coação eleitoral em Arapiraca

Em um veredito que ressoa como um alerta contra o abuso de poder em campanhas eleitorais, o Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE/AL) manteve a condenação do ex-Deputado Federal Severino de Lira Pessoa pelo crime de Coação Eleitoral, conforme o Artigo 301 do Código Eleitoral. A decisão, proferida no Recurso Criminal nº 0600884-48.2020.6.02.0055, confirmou que o ex-parlamentar utilizou-se de grave ameaça para aliciar eleitores, coagindo-os a votar em sua esposa, Fabiana Cavalcante Pessoa, então Prefeita e candidata à reeleição, e na candidata a Vereadora Kelly Caetano de Araújo (Kelly Rocha) nas Eleições de 2020.
Os fatos que levaram à condenação ocorreram em 5 de outubro de 2020, dentro do edifício da Prefeitura de Arapiraca, o Centro Administrativo Municipal. Severino Pessoa, esposo da Prefeita Fabiana Pessoa, convocou e conduziu uma reunião com servidores públicos municipais que exerciam cargos em comissão. A denúncia e as provas colhidas revelam que, durante este encontro, o ex-deputado exigiu o apoio e o voto dos presentes para as candidaturas de sua esposa e de Kelly Rocha, deixando claro que a permanência nos cargos comissionados estaria condicionada a esse apoio.
A Promotoria Eleitoral, responsável pela denúncia inicial, e o juízo de origem, em sua sentença condenatória, haviam inicialmente classificado a conduta como Crime de Corrupção Eleitoral (Art. 299 do Código Eleitoral). No entanto, a Procuradoria Regional Eleitoral de Alagoas e o Desembargador Eleitoral Guilherme Masaiti Hirata Yendo, relator do recurso, propuseram e aplicaram o instituto da Emendatio Libelli. Com isso, a tipificação legal do crime foi alterada para Coação Eleitoral (Art. 301 do Código Eleitoral), sem que isso representasse um agravamento da pena ou um prejuízo à defesa, uma vez que as penas para ambos os crimes são idênticas, e os fatos que configuravam a coação já estavam explicitamente descritos na denúncia original.
As Vítimas e as Provas Incontestáveis
O extenso acervo probatório e os depoimentos consistentes das vítimas e testemunhas foram cruciais para a condenação. Liliane Francisca da Silva, Eduarda Isis Vicente dos Santos e Vanessa Kelly Paulino Arestides, gerentes de Unidades Básicas de Saúde (UBS), relataram ter sido coagidas.
* Liliane Francisca da Silva foi explícita ao descrever a ameaça: o deputado perguntou-lhe se ela "não entendeu" a condição de votar nas candidatas para permanecer no cargo, questionando se seria um "voto de cabresto" ou "voto casadinho". Ao recusar a "proposta indecente", Liliane foi exonerada no dia seguinte.
* Eduarda Isis Vicente dos Santos corroborou os fatos e também foi exonerada poucos dias após recusar a proposta.
* Vanessa Kelly Paulino Arestides também se recusou, e embora não tenha sido exonerada de imediato por estar de licença-maternidade, seu desligamento ocorreu posteriormente.
* Testemunhas como Anselmo Batista da Silva (cunhado de Liliane) e Cristiano Lúcio dos Santos (gerente de cemitério e servidor concursado) confirmaram a reunião, o pedido de votos e as ameaças. Cristiano Lúcio, por ser concursado, não foi exonerado, mas presenciou a ameaça de que "quem não aceitasse, era para pedir exoneração do cargo".
A defesa de Severino Pessoa alegou inexistência de provas, contradição nas testemunhas e que as exonerações seriam mero exercício de discricionariedade. Ele próprio, em interrogatório, negou ter convocado a reunião ou exigido votos, alegando ter chegado "de surpresa" e apenas "solicitado apoio eleitoral voluntário". No entanto, o Tribunal considerou suas alegações "de improvável ocorrência" e incompatíveis com as demais provas e depoimentos consistentes. A defesa, inclusive, optou por dispensar suas próprias testemunhas em juízo.
A Pena Imposta e a Relevância do Julgamento
A pena imposta a Severino de Lira Pessoa foi de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, além de 08 (oito) dias-multa. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direito: prestação de serviços à comunidade pelo prazo da condenação e prestação pecuniária no valor de 50 (cinquenta) salários mínimos, a ser destinada a uma entidade pública ou de interesse social.
O julgamento reforçou que o crime de coação eleitoral é formal, ou seja, consuma-se com o ato de constrangimento e ameaça, independentemente de a vítima ter sentido medo ou de os fins visados serem alcançados. A gravidade da conduta foi salientada pela ocorrência em prédio público, em horário de expediente, em período de campanha e pandemia, e cometida por um deputado federal com poder de intimidar. A doutrina e a jurisprudência, incluindo precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), citados na decisão, confirmam que a ameaça de perda de benefício governamental ou de emprego configura o delito, mesmo que o coator não detenha o poder direto para concretizar a ameaça.
A decisão do TRE/AL, que negou provimento ao recurso de Severino Pessoa e manteve a condenação, destaca a importância de proteger a liberdade do voto e combater o assédio profissional na esfera pública, enviando uma mensagem clara de que a integridade do processo democrático deve ser preservada contra a intimidação e o abuso de poder.
Da decisão, cabe recurso ao TSE.
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