Internacional
Conheça a 'biofábrica' de mosquitos na Colômbia que combate a dengue e a desinformação
Apesar da desinformação gerada nas redes sociais sobre o experimento, a incidência de dengue na região foi reduzida em 95% em relação à década anterior com os mosquitos modificados

Em uma "biofábrica" de mosquitos em Medellín, segunda maior cidade colombiana, alguns mosquitos escapam de suas gaiolas e picam os visitantes. Embora idênticos ao mosquito transmissor da dengue, eles são inofensivos e fazem parte de um ambicioso experimento no país para combater a doença. Há uma década, o Programa Mundial de Mosquitos (WMP, em inglês) vem substituindo a população local de mosquitos Aedes aegypti por insetos "biologicamente modificados" para evitar a transmissão da dengue, que causou pelo menos 4.500 mortes na América Latina este ano. A incidência de dengue, que era de 144,7 casos anuais por 100 mil habitantes antes do experimento, passou para 6,4 casos anuais por 100 mil habitantes desde 2021.
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— Estamos usando a vida para preservar a vida — disse o biólogo Nelson Grisales à AFP, que caminha com sua filha de dois anos no laboratório que dirige na cidade.
Graças a uma bactéria e à alteração do DNA dos insetos, os resultados são promissores: a incidência da dengue no departamento de Antioquia, que fica no noroeste, foi reduzida em 95% em relação à década anterior, segundo as autoridades sanitárias dessa região de 4,4 milhões de habitantes. Uma vitória apesar da campanha de desinformação nas redes sociais, que alega que Bill Gates, um dos financiadores, usa esses mosquitos para propósitos obscuros.
Bactérias vs vírus
Em termos de semelhança, os mosquitos criados em laboratório não transmitem a dengue, uma doença endêmica em áreas tropicais que causa febres, dores de cabeça, vômitos, dores musculares e, nos casos mais graves, hemorragias fatais. Ao contrário de suas contrapartes selvagens, eles contêm a bactéria Wolbachia, que "cria uma barreira e impede a transmissão da dengue", explica à AFP Beatriz Giraldo, outra bióloga do WMP.
A descoberta foi feita por Scott O'Neill, um cientista australiano que tem sido um dos principais líderes na luta contra a doença desde o início da década de 1990. Em sua pesquisa, ele encontrou essa bactéria presente em metade de todas as espécies de insetos, mas não no Aedes aegypti. O'Neill percebeu que, ao infectá-lo com a Wolbachia, ele poderia interromper a transmissão da dengue
— Eles extraíram a Wolbachia do mosquito e a injetaram em milhões de ovos do Aedes aegypti até conseguir estabelecer uma colônia capaz de se reproduzir com a Wolbachia por muitas gerações — diz Grisales à AFP.
Problema crescente
As evidências apoiam os mosquitos modificados, que nascem em "gaiolas" feitas de malha de plástico e são transportados em frascos para áreas afetadas pela dengue. Lá, eles cruzam com mosquitos selvagens e, à medida que se reproduzem, substituem a população local.
Os primeiros insetos WMP na Colômbia foram liberados em 2015 no município de Bello, localizado na área metropolitana de Medellín. A incidência de dengue passou de 144,7 casos anuais por 100 mil habitantes antes do experimento para 6,4 casos anuais por 100 mil habitantes desde 2021.
Antes de Medellín, o feito havia sido realizado em Jacarta, na Indonésia, e em Niterói, no Brasil, com resultados igualmente satisfatórios. A iniciativa também está sendo implementada na cidade colombiana de Cali e, em breve, em El Salvador.
— Tudo isso está se acelerando à medida que o problema da dengue se acelera — diz Grisales.
A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) alertou neste ano que a América Latina e o Caribe terão sua "pior temporada de dengue" com cerca de 9,3 milhões de casos e pelo menos 4.500 mortes de janeiro a junho.
A combinação do fenômeno El Niño e da mudança climática favorece a propagação desse mosquito de climas quentes que se reproduz na água. A agência de saúde da União Europeia alertou que os casos de dengue também estão aumentando na Europa devido às temperaturas mais altas.
Desinformação
O laboratório tem sido alvo de teorias conspiratórias associadas à imagem de Bill Gates. No ano passado, um grupo de pessoas protestou na sede do laboratório contra o fundador da gigante americana Microsoft. A convocação surgiu nas redes sociais, onde há dezenas de postagens acusando o WMP de espalhar "febre amarela" ou "malária".
— Eles dizem, por exemplo, que os mosquitos que estamos liberando têm chips para controle mental por parte de Bill Gates — diz Grisales à AFP..
Segundo o biólogo, o laboratório está sendo alvo de uma campanha de difamação.
Por enquanto, o projeto funciona como uma iniciativa particular autorizada pelos governos locais, mas Grisales espera que em breve se torne uma "política pública".
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