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Na boa da informação
No final dos anos 90, o sociólogo catalão Manuel Castells publicou uma densa trilogia intitulada “A Era da Informação”, obra essa que me impressionou muito quando a li, também, na última década do milênio passado.
Mas não é a respeito desta obra em particular, do referido sociólogo, nem a respeito de outras de sua lavra que pretendo assuntar nessa escrevinhada, mas sim, procurarei me restringir a um tema mais modesto que, penso eu, cabe direitinho na caçamba do meu caminhãozinho de ideias. No caso, é a noção mesma de “informar”.
Hoje, para todos os lados que voltamos nossas vistas, lá encontramos alguém falando pelos cotovelos a respeito da “era da informação” e que, diante do avassalador poder de manipulação da grande mídia, e frente a maré das chamadas “Fake News”, seria um absurdo continuarmos a nos referir à presente página da história da humanidade com esta alcunha e que, o mais apropriado seria chamarmos o nosso tempo de “era da desinformação” ou, como alguns preferem, “era da pós-verdade”, ou de alguma outra tranqueira similar.
Bem, o espanto de muitos, talvez, se deva a uma boa dose de incompreensão frente ao termo “informar”, como bem nos adverte o filósofo checo-brasileiro Vilém Flusser. Em seu livro “O mundo codificado”, ele nos explica que “informar” é o ato de impor uma forma a algo e não apenas e simplesmente entregar alguma coisa em estado bruto.
Flusser nos apresenta um exemplo muitíssimo didático para nos explicar esse ponto. Imaginemos um carpinteiro. Um carpinteiro que confeccionou uma mesa. Ao fazê-la, ele está informando, dando forma de mesa à madeira. A madeira, ao cair nas mãos do bom homem, é “amorfa”, destituída de propósito; mas, com o trabalho impresso por ele sobre sua natureza, ela ganha uma forma, uma finalidade. Ela fica informada.
Quando vamos nos informar, seja a respeito das tretas políticas do momento, ou dos entreveros econômicos do nosso tempo, ou ainda sobre assuntos mais elevados como o sentido da vida e o destino da alma, estamos literalmente imprimindo uma forma à nossa vida.
Podemos fazer isso, de modo autônomo e prudente, procurando realmente selecionar de maneira ajuizada e criteriosa o que iremos permitir informar a nossa alma, ou podemos simplesmente, feito um glutão, ir consumindo tudo que nos é apresentado pela grande mídia e pelas redes sociais, sem filtro algum, sem discernimento nenhum, permitindo que terceiros possam, de forma maliciosa ou não, fixar uma forma disforme sobre a nossa personalidade, modulando o nosso campo de percepção e, deste modo, ditando a forma como iremos avaliar e pensar a vida em sociedade, o mundo e a nossa existência.
Nesse sentido, não há equívoco algum em afirmarmos que hoje vivemos na “Era da informação”, o que não significa que estamos, necessariamente, sendo bem informados e, principalmente, que estejamos sinceramente interessados em nos informar bem, em elevar a nossa forma ver e compreender a realidade.
Na real, o que todos nós queremos, na maioria das vezes, não é ampliar o nosso entendimento a respeito de nada em especial, mas apenas e tão somente garimpar aqui e acolá uma e outra informação que possa corroborar na confirmação daquilo que nós “pensamos” a respeito de um punhado de assuntos, que apenas reforce a formatação atual do nosso limitado entendimento.
Para constatar essa obviedade ululante, basta apenas que vejamos, com um olhar inclemente, como se dá o compartilhamento de informações em nossos grupos virtuais de “amigos” para constatarmos que, de um modo geral, nós amamos – como amamos - ficar reforçando a forma que foi impressa sobre o nosso discernimento, acreditando piamente que, com esse gesto, estamos arrebentando a boca da informação quando, na verdade, estamos apenas e tão somente agravando o nosso estado de alienação.
É isso. Fim de causo.
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