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Líder democrata no Senado dos EUA pede saída de Netanyahu: 'Israel não pode sobreviver se tornar-se um pária'

Fala, criticada por republicanos e pelo embaixador israelense, sinaliza uma impaciência crescente em Washington com a permanência do premier (e aliados) no poder

Agência O Globo - 14/03/2024
Líder democrata no Senado dos EUA pede saída de Netanyahu: 'Israel não pode sobreviver se tornar-se um pária'

Líder da maioria democrata no Senado, o judeu Chuck Schumer apontou nesta quinta-feira o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, como um grande obstáculo para a paz no Oriente Médio e pediu uma nova liderança no país, que neste mês completou cinco meses de guerra com o grupo terrorista palestino Hamas, que controla a Faixa de Gaza desde 2007.

— Acredito de coração que sua [Netanyahu] maior prioridade é a segurança de Israel — disse Schumer, a autoridade eleita judia de mais alto escalão nos Estados Unidos, durante um discurso no plenário. — No entanto, também acredito que o primeiro-ministro se perdeu ao permitir que sua sobrevivência política tivesse precedência sobre os melhores interesses de Israel.

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Citando o número de mortos em Gaza, que seria de quase 31 mil, segundo autoridades locais, Schumer afirmou que Netanyahu "tem estado demasiado disposto a tolerar o número de vítimas civis em Gaza, o que vem reduzindo o apoio a Israel em todo o mundo para mínimos históricos".

— Israel não poderá sobreviver se tornar-se um pária — afirmou.

Apesar de muitos legisladores democratas já terem criticado a liderança de Netanyahu e sua coligação governamental de ultradireita, com o próprio presidente Joe Biden tendo descrito a ofensiva militar de Israel em Gaza como “exagerada”, o pronunciamento contundente de Schumer — efetivamente instando à substituição de Netanyahu — correspondeu ao posicionamento mais duro já adotado por uma autoridade nos EUA desde o início do conflito.

Também foi o mais recente reflexo da crescente insatisfação entre os democratas, especialmente os progressistas, com a condução da guerra por Israel, o que criou um dilema estratégico e político para Biden. Os republicanos vêm tentando capitalizar essa dinâmica, aproximando-se de Netanyahu enquanto os democratas o repudiam.

Em resposta a Schumer, o líder da minoria republicana na Casa, o senador Mitch McConnell, disse no plenário que era “grotesco e hipócrita” para os americanos “que hiperventilam sobre a interferência estrangeira em nossa própria democracia pedir a remoção do democraticamente líder eleito de Israel”. Ele descreveu a iniciativa como “sem precedentes”.

— O Partido Democrata não tem um problema anti-Bibi — disse McConnell, referindo-se a Netanyahu pelo apelido. — Tem um problema anti-Israel.

Nesta quinta-feira, Schumer, que representa Nova York, estado com mais de 20% da população judia dos EUA, teve o cuidado de afirmar que não pretendia ditar qualquer resultado eleitoral, prefaciando suas duras críticas a Netanyahu com uma longa defesa de Israel — que os judeus americanos “amam até os ossos”, afirmou.

Ele também adotou a posição normalmente adotada por defensores de Israel de que há uma “percepção imprecisa” da guerra que atribui demasiada culpa às forças israelenses pelas mortes de civis em Gaza, sem se concentrar suficientemente na forma como o Hamas utiliza os civis como escudos humanos. Além disso, reconheceu que seria difícil para israelenses traumatizados contemplar a possibilidade de uma solução de dois Estados neste momento.

Mas foi implacável em suas críticas a Netanyahu, chamando o primeiro-ministro de um dos principais obstáculos para alcançar a paz no Oriente Médio, juntamente com o Hamas, os “israelenses da direita radical” e Mahmoud Abbas, o presidente da Autoridade Nacional Palestina, que, afirmou, também deveria ser substituído.

— A coligação de Netanyahu já não satisfaz as necessidades de Israel depois de 7 de outubro — disse Schumer, referindo-se aos quase 1,2 mil mortos e às quase 240 pessoas feitas reféns durante o ataque do Hamas no sul de Israel. — O mundo mudou radicalmente desde então, e o povo israelense está sendo sufocado neste momento por uma visão de governo que está presa no passado.

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Schumer defendeu que a única solução para o conflito era a criação de dois Estados, "um Estado palestino desmilitarizado, lado a lado com Israel em iguais medidas de paz, segurança, prosperidade e dignidade", e que Netanyahu, ao negar a ideia de um Estado palestino, ameaça o próprio futuro de Israel. Ele foi além, e disse que "uma nova eleição é a única forma para permitir um processo decisório saudável e aberto sobre o futuro de Israel, no momento em que muitos israelenses perderam a confiança na visão e direção do governo", afirmando acreditar que a maioria "reconhecerá a necessidade de mudança".

A fala foi a segunda do senador sobre a guerra desde o dia 7 de outubro. O conflito o fez pensar de maneira mais profunda e discutir mais abertamente sua fé judaica e sua herança, assim como os dilemas morais e políticos apresentados pela guerra aos judeus em Israel e nos EUA. Em novembro, condenou o aumento do antissemitismo no país, ligando a situação aos ataques de Israel contra o Hamas. Na ocasião, se dirigia aos membros de seu próprio partido: Schumer alertou que alguns liberais e jovens estão "inconscientemente ajudando" o antissemitismo em nome da justiça social.

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Agora, seus alvos foram Netanyahu e os membros de extrema direita da coalizão governista, que para Schumer estão deixando de lado os valores judaicos. Para ele, se o premier permanecer no cargo, "os EUA não terão outra escolha a não ser adotar um papel mais ativo para moldar a política israelense usando nossa influência para mudar o curso atual".

Em resposta, Schumer ouviu do embaixador israelense nos EUA, Michael Herzog, que "Israel é uma democracia soberana", e que "não ajuda em nada, no momento em que Israel está em guerra contra uma organização terrorista genocida, o Hamas, comentar sobre a cena política interna de um aliado democrático". Rival de Netanyahu, o ex-premier Naftali Bennett disse que, apesar das diferenças, "se opõe à intervenções políticas externas em assuntos internos" do país, e que são uma "nação independente, não uma república de bananas".

Layla Elabed, coordenadora de campanha de um grupo antiguerra que promoveu um voto de protesto contra Biden nas primárias do partido no Michigan, disse que Schumer "está começando a mudar, mas muito devagar e com pouca substância sobre quais ações Biden pode tomar agora para interromper a ultrajante quantidade de mortes de civis em Gaza".