Brasil
Fuga em Mossoró: PF investiga se presos aproveitaram barulho da reforma e usaram 'janela' das celas para se comunicar
Detentos estavam em celas contíguas, a 01 e 02, e teriam conversado por meio de pequenas aberturas na parede feitas para ventilação
A Polícia Federal (PF) trabalha com a hipótese de que os dois presos que fugiram de uma penitenciária federal em Mossoró (RN) se comunicaram por meio das "janelas" das celas e aproveitaram o som da reforma no pátio do banho de sol para arrancar a luminária sem que fossem percebidos.
Por meio desse vão, eles fizeram uma abertura na parede e iniciaram a evasão inédita no sistema penitenciário federal. Rogério Mendonça, o Tatu, e o Deibson Nascimento, o Deisinho, fugiram do presídio federal na última quarta-feira e continuam desaparecidos desde então.
Segundo as investigações, Tatu escavou diversas partes da parede (no banheiro, do lado da cama e debaixo da mesa) da cela em busca dos vergalhões que foram usados para arrancar a estrutura metálica da luminária. Deisinho, por sua vez, foi direto à mesa — o que reforçou a suspeita de que um estava coordenando o outro. Eles estavam em celas contíguas, a 01 e 02, e teriam conversado por meio de pequenas aberturas na parede feitas para ventilação.
Pasta de dente e sabonete
A dupla também usou o truque da pasta de dente e sabonete misturados com papel higiênico para disfarçar os buracos e deslizar melhor na hora de passar para o outro lado. A artimanha já é conhecida das autoridades penitenciárias, que durante as inspetorias costumam apalpar e bater nas paredes atrás de algum buraco.
A Polícia Federal quer esclarecer por que nenhum policial penal ouviu o diálogo entre os presos e por que nenhuma vistoria detectou o pó branco que caiu das escavações. A perícia aponta que o buraco não foi aberto de um dia para o outro.
Nas alas conhecidas como Vivência, as vistorias ocorrem diariamente quando o preso sai para o banho de sol. Na ala do Regime Diferencial Disciplinado (RDD), onde a dupla estava encarcerada, as inspetorias são mais complexas e, por isso, ocorrem com uma frequência menor.
Os detentos costumam tirar o colchão e deixar uma trouxa de roupas do lado de fora para passar no raio x. Depois, são colocados no corredor para a vistoria nos aposentos. A ideia do RDD é que eles fiquem trancafiados no mesmo lugar, sem direito ao banho de sol.
No RDD desde setembro
Os dois fugitivos do presídio federal de Mossoró estavam no RDD desde setembro de 2023. Eles foram transferidos para lá por causa da violência com que lideraram uma rebelião em um presídio Antônio Amaro, em Rio Branco, que terminou com cinco presos mortos, dentre eles três decapitados, e um policial penal ferido na face.
A inteligência da Polícia Penal Federal aponta que eles não têm posição de chefia na facção criminosa nascida no Rio de Janeiro nem poder financeiro considerável. No entanto, eles têm um histórico de tentativas de fuga e faltas disciplinares no sistema prisional do Acre, o que envolve flagrantes com serra, com cordas feitas a partir de sacos plásticos, corte de barras e incitação contra agentes penitenciários.
A PF está fazendo um levantamento de todos os agentes penitenciários que podem ter interagido com os presos — aproximadamente 18 entre os cerca de 180 que trabalham na unidade de Mossoró. O plantão dos policiais penais ocorre em dupla. Também está fazendo um pente fino nos operários das obras que deixaram as ferramentas jogadas no canteiro de obras.
Uma sindicância também foi aberta pela Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) para verificar se houve alguma facilitação por parte de algum servidor.
Após sair da cela pelo vão da luminária, os presos subiram para um local chamado de shaft, onde fica a fiação e tubulação do prédio. Escalaram até o telhado do presídio e, de lá, pularam no pátio, que passava por uma reforma de adequação. Atravessaram o tapume da obra, arranjaram um alicate e, com ele, cortaram as grades da cerca de arame. Era a última barreira para o mundo exterior.
Só uma câmera registrou o momento da evasão — e com uma imagem que mostra um borrão quase imperceptível dos presos passando pelo alambrado. Os policiais penais que acompanhavam o videomonitoramento não captaram a fuga, que só foi percebida na hora do café da manhã dos detentos.
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