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Caso Jeffrey Epstein: o que diz cada um dos documentos que citam Trump, Clinton, Michael Jackson, Príncipe Andrew e mais

Na grande maioria dos casos, não há provas de comportamento criminoso, embora a mera citação dos nomes tenha se revelado tóxica para a reputação de personalidades

Agência O Globo - 06/01/2024
Caso Jeffrey Epstein: o que diz cada um dos documentos que citam Trump, Clinton, Michael Jackson, Príncipe Andrew e mais
Caso Jeffrey Epstein - Foto: Reprodução

A lista do caso Jeffrey Epstein não é, de fato, uma lista. Pelo menos, não uma lista de clientes, nem daqueles que viajaram para a ilha do magnata envolvido numa rede de abuso e exploração sexual de menores de idade.

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Os nomes aparecem em mais de 900 páginas de documentos judiciais dos quais Loretta Preska — a juíza responsável pelo processo de difamação movido em 2015 por uma das vítimas, Virginia Giuffre, contra a amante e parceira de Epstein, a socialite Ghislaine Maxwell — retirou o sigilo nesta quarta-feira.

Junto com pessoas que cometeram atos sexuais contra algumas das vítimas, há outras que aparecem apenas tangencialmente — porque as pessoas perguntam sobre elas ou porque são vítimas, ou mesmo porque são funcionários. Na grande maioria dos casos, não há provas de comportamento criminoso dos citados, embora a mera menção de um nome tenha se revelado tóxica para a reputação deles, em meio à desinformação e à circulação de listas falsas nas redes sociais.

Jeffrey Epstein se matou em agosto de 2019 em sua cela de uma prisão de segurança máxima em Manhattan, enquanto aguardava julgamento por crimes sexuais. O primeiro lote divulgado inclui 40 documentos de conteúdo variado. Confira abaixo o que cada um deles trouxe à tona.

Documento 1: 'Preciso de tempo para processar'

O primeiro dos documentos é um e-mail enviado por Ghislaine Maxwell ao seu advogado em 2015. Nele, a ex-amante e parceira de Jeffrey Epstein reclama de ser processada por difamação por Virginia Giuffre, uma das vítimas.

“Aparentemente, é perigoso dizer que Virginia é uma mentirosa”, observa ela. Ghislaine enfatiza que nunca havia sido alvo de uma ação civil ou criminal. “Preciso de tempo para processar”, diz.

Posteriormente, a herdeira Ghislaine Maxwell, filha do magnata da mídia Robert Maxwell, resolveu o processo de Giuffre (de onde provêm todos os documentos) com um acordo extrajudicial. No entanto, foi processada criminalmente, considerada culpada de tráfico sexual de menores e condenada a 20 anos de prisão em junho de 2022.

Documento 2: Atividade sexual 'adulta'

Os advogados de Giuffre pedem ao juiz que obrigue Maxwell, a ré, a responder perguntas se ela massageou Jeffrey Epstein e fez sexo com ele. Maxwell se recusou a responder estas questões sobre a atividade sexual “adulta”, mas os advogados de Giuffre afirmam acreditar que seria importante ela responder, já que teria sido a socialite quem ensinou Giuffre a fazer as massagens sexuais para as quais foi contratada quando era menor de idade.

Documento 3: 'Nunca fiz sexo não consensual com ninguém'

Esta é a transcrição de um fragmento de um depoimento de Maxwell em abril de 2016, no qual foi questionada sobre outra vítima, Johanna Sjoberg. Maxwell diz que lhe deu “conselhos profissionais” para se tornar massoterapeuta, o que ela chama de “uma oportunidade de trabalho maravilhosa”. Ela admite que Johanna lhe fez massagens, mas se recusa a responder se fez sexo com ela.

— Nunca fiz sexo não consensual com ninguém — diz.

Documento 4: Clinton citado pela primeira vez

Em outro trecho do depoimento de Maxwell, ela continua a sustentar que as alegações de tráfico de menores para sexo com Jeffrey Epstein são “uma gigantesca teia de mentiras”.

Nesse fragmento, o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton é citado pela primeira vez no lote de documentos. A ré afirma que “as alegações de que Clinton jantou na Ilha Jeffrey são 100% falsas”. Em vez disso, segundo ela, Clinton comeu a bordo do jatinho do magnata.

Em 2019, o ex-presidente reconheceu ter voado várias vezes no avião privado de Epstein em 2002 e 2003, mas garantiu que nada sabia sobre os “terríveis crimes” do milionário.

Documento 5: Trump, príncipe Andrew e 'namorada' de Epstein'

Este documento também pertence ao mesmo depoimento de Maxwell, em abril de 2016. É outro fragmento mais amplo. Nele, Maxwell reconhece ter visitado Mar-a-Lago, clube privado de Donald Trump em Palm Beach, na Flórida. A relação que Trump tinha com Jeffrey Epstein já era pública, e não são fornecidos mais detalhes sobre ela neste depoimento.

Maxwell diz que contratou muitos funcionários de todos os tipos para Epstein e que uma pequena parte de seu trabalho “era ocasionalmente encontrar massagistas adultas profissionais” para o bilionário.

Durante o interrogatório, Maxwell é questionada sobre algumas das meninas recrutadas e se elas foram "fornecidas" a algumas pessoas como o investidor Glenn Dubin, o agente de modelos Jean Luc Brunel (que cometeu suicídio na prisão na França antes de ser julgado por crimes sexuais) e o ex-CEO da Limited e Victoria's Secret Leslie Wexner. A ré responde de forma evasiva. Ela também é questionada se era namorada de Epstein:

— É uma pergunta complicada. Houve momentos em que eu gostaria de me considerar sua namorada — responde ela. Na declaração, Maxwell ressalta, ainda, que o príncipe Andrew (irmão do rei Charles III) visitou a ilha de Epstein, mas que não havia meninas naquela ocasião.

Documento 6: Em busca de respostas

O documento expõe outro pedido de Giuffre para que Maxwell seja obrigada a responder perguntas sobre atividades sexuais relacionadas aos casos de abuso e tráfico sexual envolvendo Epstein.

Documento 7: Um funcionário de Epstein

Trata-se de um depoimento de 2009 de Alfredo Rodríguez, que trabalhou para Jeffrey Epstein.

Documento 8: Quinta Emenda

Trata-se de um pedido de Giuffre para que deponham como testemunhas tanto Jeffey Epstein quanto Sarah Kellen e Nadia Marcincova, acusadas ​​de colaborar com a rede de recrutamento de mulheres. O documento menciona que, em outros casos, quando as duas foram interrogadas, elas buscaram refúgio no direito de não testemunhar contra si mesmas.

“Invoco a Quinta Emenda”, declararam as duas, repetidamente.

Documento 9: Uma orgia para o Príncipe Andrew

Este é um documento de outro caso na Flórida. Nele, duas vítimas cuja identidade permanece anônima pedem para ingressar em uma ação judicial alegando que foram forçadas a fazer sexo com celebridades, políticos, presidentes, “um conhecido primeiro-ministro” e outros. Mais detalhes são fornecidos sobre o príncipe Andrew.

“A [vítima] desconhecida nº 3 foi forçada a ter relações sexuais com este Príncipe quando era menor de idade em três localizações geográficas diferentes: em Londres (no apartamento de Ghislaine Maxwell), em Nova York e na ilha privada de Epstein nas Ilhas Virgens (em uma orgia com inúmeras outras meninas menores de idade)".

Epstein ordenou que a mulher "desse ao príncipe tudo o que ele pedisse" e exigiu que ela o informasse "detalhes do abuso sexual”, diz o texto.

Documentos 10 e 11: Mais depoimentos

Escritos de maio de 2016 resumem os depoimentos de Maxwell e da vítima Johanna Sjoberg. Neles, Giuffre também solicita o interrogatório de 15 testemunhas adicionais, incluindo o próprio Jeffrey Epstein e vários de seus funcionários. Num outro texto desse mesmo mês, é solicitado que se ultrapasse o habitual limite legal de 10 depoimentos neste tipo de processo.

Documento 12: Príncipe Andrew, Trump, Clinton, Michael Jackson, David Copperfield...

O depoimento de Johanna Sjoberg, de 179 páginas, é talvez o principal de todo o lote já divulgado. Nele, a mulher conta que, numa reunião em que Virginia Giuffre também esteve presente, ela descobriu estar com o príncipe Andrew porque havia um boneco do príncipe com o nome dele. Ela diz ter achado o fato engraçado.

— Só lembro que alguém sugeriu tirar uma foto e nos mandou sentar no sofá. Então, Andrew e Virginia sentaram-se no sofá e colocaram o boneco no colo. E então sentei no colo de Andrew, por minha própria vontade, e eles pegaram as mãos do boneco e as colocaram nos seios de Virginia. Então Andrew colocou as dele nos meus [seios] — diz ela, no depoimento.

Nessa mesma declaração, a vítima afirma que Epstein uma vez lhe disse que “[Bill] Clinton gosta de jovens, ou seja, meninas”. Em 2019, o ex-presidente reconheceu ter voado várias vezes no avião privado de Epstein em 2002 e 2003, mas garantiu que nada sabia sobre os “terríveis crimes” do milionário. Sjoberg também diz que, uma vez, no avião particular do magnata, os pilotos lhes disseram que não poderiam pousar em Nova York e que desviariam para Atlantic City. Então, "Jeffrey [Epstein] disse: 'Ótimo, vamos ligar para Trump e ir para o cassino'".

A testemunha é questionada se fez sexo com ele [Trump] ou lhe fez massagens, ao que ela responde "não". A série de perguntas também mencionam o cientista Marvin Minsky, o cineasta George Lucas e o advogado Alan Dershowitz. Em todos os casos, ela diz que não teve relações com eles.

Sjoberg indica, ainda, que conheceu Michael Jackson na mansão de Epstein em Palm Beach, na Flórida. Ela diz não ter feito massagem nele. Noutra ocasião, com o mágico David Copperfield, ele fez alguns truques de mágica e perguntou a ela, segundo seu depoimento, se sabia que “as meninas são pagas para encontrar outras meninas”.

Documento 13: Prisão de Epstein

Este documento é um relatório policial de Palm Beach (Flórida) de 2005 com o primeiro caso que desencadeou o escândalo Epstein. Ele foi preso após ser acusado de pagar uma menina de 14 anos para ter relações sexuais, o que foi parcialmente descrito no relatório.

Dezenas de outras menores de idade descreveram abusos sexuais semelhantes. Os promotores permitiram que o bilionário se declarasse culpado em 2008 de uma acusação envolvendo uma única vítima.

Documento 14: Stephen Hawking

O documento reúne dois e-mails. Um deles, com vários erros de digitação, foi escrito por Jeffrey Epstein e diz: “Uma recompensa pode ser oferecida a qualquer amigo e conhecido de Virginia [Giuffre] que se apresentar e ajudar a provar que suas acusações são falsas. As [acusações] mais fortes são o jantar com Clinton e a nova versão, nas Ilhas Virgens, de que Stephen Hawking participou de uma orgia com menores de idade".

Documentos 15 e 16: Privilégio da relação advogado-cliente

Os documentos trazem uma longa lista de e-mails de Giuffre sujeitos a sigilo profissional porque contêm comunicações com seus advogados em relação ao caso. Há outra lista mais curta de mensagens da ré, também sujeitas ao sigilo advogado-cliente.

Documentos 17 e 18: Objeções

A ré expressa objeções a alguns dos pedidos da autora [do processo] para que ela forneça documentos sobre o caso. Giuffre, por sua vez, recusa em outro documento o fornecimento de determinados dados por serem objeto de comunicações com seus advogados. São escritos com argumentos jurídicos, mas não fornecem conteúdo substancial acerca do caso.

Documento 19: 'Uma massagem significa sexo'

Trata-se de um fragmento dos depoimentos prestados pela autora do processo. Virginia Giuffre diz que Ghislaine Maxwell pediu que ela massageasse Glenn Dubin, príncipe Andrew e Bill Richardson, que foi governador do estado do Novo México.

“Uma massagem significa sexo”, diz Giuffre. Nesse depoimento, outro dos mais importantes revelados neste lote, Giuffre diz que foi enviada para fazer sexo com o agente de modelos Jean Luc Brunel, dono de uma rede de hotéis (perto do aniversário da supermodelo Naomi Campbell, em cuja festa ele estava); com o cientista Marvin Minsky; com “outro príncipe”; e com muitas outras pessoas das quais não se lembra.

Ela fez anotações [sobre os casos], mas depois as queimou num acordo com o marido, porque ambos são pessoas “muito espiritualizadas”, diz ela.

Documentos 20, 21 e 22: Discussão sobre os depoimentos

Os advogados de Maxwell se opõem ao pedido para ultrapassar o limite de 10 depoimentos no processo ou pedem que Giuffre arque com as despesas extra. Já os advogados de Giuffre apontam a importância de colher estes depoimentos, incluindo o de uma pessoa cujo nome aparece riscado.

Documento 23: Repetição sobre o Príncipe Andrew

É um fragmento do depoimento de Johanna Sjoberg, no qual se repete a alegação de que o príncipe Andrew tocou seus seios.

Documento 24: Pedido de depoimento de Clinton

Os advogados de Giuffre pedem, numa petição corrigida, que fosse ultrapassado o limite de 10 testemunhas no processo para que o ex-presidente dos EUA Bill Clinton depusesse. O objetivo não foi alcançado.

Documento 25: Mais sobre as testemunhas

Outro resumo processual sobre a disputa pelo número de depoimentos a serem colhidos.

Documento 26: Fragmentos Repetidos

Aparecem novamente fragmentos repetidos do depoimento de Johanna Sjoberg, incluindo, pela terceira vez, o episódio em que o Príncipe Andrew é acusado de tocar os seios dela.

Documentos 27 e 28: Questões processuais

Outro resumo processual da disputa se o limite habitual de 10 depoimentos de testemunhas deve ser excedido ou não e se o prazo para a tomada dos depoimentos deve ser prorrogado.

Documento 29: Uma testemunha

O documento traz o depoimento de Rinaldo Rizzo, que trabalhou para Glenn Dubin e Eva Anderson Dubin. Sem grandes revelações sobre o caso.

Documento 30: Interrogatório sobre Príncipe Andrew

São 27 páginas com parte do depoimento de Virginia Giuffre de maio de 2016. Especificamente, ela fala sobre seus cadernos, onde anotou as memórias do que viveu com Ghislaine Maxwell e Jeffrey Epstein e o qual queimou na fogueira com o marido em 2013.

Os investigadores perguntam a ela sobre a fotografia com o Príncipe Andrew, que ela afirma ter tirado com suas próprias mãos e ter guardada em caixas na casa de seus sogros em Sydney, na Austrália, passara a residir com o marido e os filhos. Ela também explica que disse que Bill Clinton voou de helicóptero com Ghislaine Maxwell porque a própria Maxwell lhe contou isso, e não porque Clinton lhe contou ou porque estaria junto na aeronave.

Documento 31: Procurando evidências de Brunel

Neste documento de fevereiro de 2016, Giuffre pede uma investigação com “documentos, informações ou objetos” contra o agente de modelos Jean Luc Brunel, que cometeu suicídio numa prisão da França, em fevereiro de 2022, antes de ser julgado por estupro.

São pedidos documentos e provas como gravações, CDs, fotografias, comprovantes de pagamentos ou viagens, gravações telefônicas de entre 1996 e 2016 que estejam relacionados ou nos quais apareçam a própria Virginia Giuffre, Jeffrey Epstein ou Ghislaine Maxwell ou ainda o advogado Alan Dershowitz, “Emmy Taylor, Sarah Kellen ou Nadia Marcinkova” (três das alegadas vítimas menores de Epstein). Este documento também informa que o depoimento de Brunel seria registrado em 7 de junho de 2016, embora ele tenha sido adiado por algumas semanas posteriormente.

Documento 32: O piloto e o detetive

A informação-chave deste documento aparece riscada: o nome da pessoa a quem se dirige. Trata-se de um pedido dos advogados de Virginia Giuffre para que essa pessoa preste depoimento em junho de 2016, levando toda documentação, correspondência, gravação e anotação dos últimos 20 anos que fosse de interesse do caso.

Apenas um nome é mencionado de passagem: o de David Rodgers, que foi piloto de Epstein durante 28 anos e sob cuja supervisão várias das vítimas voaram no final da década de 1990. São solicitadas informações sobre Sarah Kellen — assistente contratada por Epstein no início dos anos 2000 para agendar as massagens nas quais posteriormente ele abusou de dezenas de mulheres — e sobre Nadia Marcinkova, uma das vítimas.

Joe Recarey, o investigador que deu os primeiros passos contra Epstein na Flórida e que morreu em 2018, também é convocado para testemunhar em junho de 2016.

Documento 33: Ghislaine Maxwell acusa Giuffre

Neste documento de abril de 2016, Ghislaine Maxwell acusa Virginia Giuffre de “jogar o jogo do pegar e soltar”, de fornecer apenas os dados que deseja e quando lhe convém.

“Ela está retendo informações que o tribunal ordenou que fossem apresentadas e só as divulga quando é pega em erro”, diz a ré. Especificamente, Maxwell afirma que seus advogados pediram a Giuffre informações sobre seus prestadores de serviços médicos e que Giuffre evitou fornecê-las.

"Todas essas informações são diretamente relevantes e necessárias para a defesa contra as reivindicações da demandante [Giuffre] de danos por 'lesões psicológicas' e pelas despesas médicas resultantes", afirma a defesa de Maxwell. Quando algumas das doenças ou resultados médicos de Giuffre (físicos ou psicológicos) são expostos no documento, eles aparecem riscados.

Documento 34: Aspectos técnicos jurídicos

O documento 34 tem apenas quatro páginas e é puro detalhamento técnico. Nele, Laura A. Menninger, advogada do escritório que defende Ghislaine Maxwell, certifica que foram apresentadas 14 provas, como depoimentos e transcrições, especialmente de Virginia Giuffre e sua mãe, Lynn Trude, relacionadas às alegações de Maxwell citadas no documento anterior.

Documento 35: 'Ghislaine Maxwell me apresentou à indústria do tráfico sexual'

Este é um dos principais documentos publicados. São transcritas, em 12 páginas, declarações de Virginia Giuffre de maio de 2016. O texto começa com uma pergunta: “Outro príncipe, o dono da grande rede hoteleira e [o cientista] Marvin Minsky, há mais alguém com quem Ghislaine Maxwell a forçou a ter relações sexuais?”

A resposta: — Tenho certeza, definitivamente, que existe [mais alguém]. Mas posso lembrar o nome de todos? Não — diz. Quando questionada se pode dar mais detalhes, Giuffre afirma: — Olha, eu falei tudo o que sei. Sinto muito. Isso é muito difícil para mim e é muito frustrante ter que passar por tudo de novo. Não me lembro de todos. Eles me enviaram [para encontros] com um quantidade enorme de gente.

Giuffre admite não ter anotações sobre os casos, porque queimou seus diários, conforme afirmara no documento 30. Ela só conversou sobre esse assunto com ele, o marido, e não com amigos em sua nova vida no Colorado, nos EUA, e depois em Sydney, na Austrália.

Ela também afirma que há anos toma medicamentos “para controlar as dores sofridas pelas mãos de Ghislaine Maxwell e Jeffrey Epstein”.

— Ghislaine Maxwell me apresentou à indústria do tráfico sexual. Foi ela quem abusou de mim regularmente. Foi ela quem me expôs, me disse o que fazer, me treinou como escrava sexual, abusou de mim física e mentalmente — diz ela, garantindo que Maxwell a feriu duplamente, por dizer, depois, que seu depoimento era uma mentira.

Documento 36: Especificações técnicas da defesa de Maxwell

O documento 36 tem apenas três páginas e é novamente assinado pela advogada Laura A. Menninger, da defesa de Ghislaine Maxwell. O documento cita a apresentação de 13 provas: cartas, registros médicos e cópias dos depoimentos de Virginia Giuffre, de sua mãe e de seu médico.

Documento 37: As provas que Virginia Giuffre 'não quer' apresentar

Este documento tem quase cinquenta páginas que compõem a chamada "prova C". Apresenta respostas a vinte declarações de Giuffre e, sobretudo, à sua recusa em apresentar mais provas e alegações de violação à lei. Cita que a regra judicial estabelece que o número máximo de interrogatórios é de 25 por pessoa e que Giuffre, naquela época, já tinha prestado 59 depoimentos.

Giuffre também se opõe a certos pedidos de provas e declarações (como fornecer seu endereço atual ou passado, por exemplo, seus passaportes, extratos bancários ou receitas médicas) Ela afirma que já teria apresentado essas provas (como fotografias com o príncipe Andrew ou contratos de trabalho em Mar-a-Lago, entre outros) ou que não as apresentou por serem objeto de comunicações com seus advogados.

"Essas [informações] só são solicitadas para invadir sua privacidade, com o único propósito de assediar e intimidar a Sra. Giuffre, que foi vítima de tráfico sexual", diz sua defesa. Nesse documento, Giuffre também se opõe ao pedido para que forneça fotografias e vídeos que possuísse ao lado de uma série de pessoas, incluindo Bill Clinton, o ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore e o cientista Stephen Hawking.

Documento 38: O presidente 'espanhol', viagens à Tailândia e França, aniversário de Naomi

Semelhante ao documento 35, aqui estão quase 90 páginas de declarações de Giuffre, num depoimento de maio de 2016. Cada página está dividida em quatro, o que equivale a mais de 330 páginas de declarações. Ao longo deles, Giuffre detalha como é sua vida agora, na Austrália, depois de ter sido vítima de Jeffrey Epstein e principalmente de Ghislaine Maxwell, a ré, nos anos 2000.

É aqui que lhe perguntam se ela teve encontros sexuais forçados com presidentes estrangeiros, e ela garante que sim.

— Sinceramente, não consigo lembrar o nome dele, tenho memória visual… — diz ela. Quando solicitada a descrevê-lo, ela diz: — Ele é espanhol, alto, cabelo escuro, tinha sotaque estrangeiro. Homem. Eu diria cerca de 40 anos.” O encontro ocorreu no Novo México, acredita ela, onde Epstein tinha um rancho.

Ela também explica, no depoimento, que conheceu Ghislaine Maxwell enquanto trabalhava no clube Mar-a-Lago, na Flórida, onde o pai trabalhava na manutenção e conseguira um emprego para ela durante o verão. Desde então, passou longos períodos com Maxwell e Epstein, desde menor de idade, aos 16 anos (havia muitas meninas exploradas, "principalmente entre 15 e 21 anos", "todas muito bonitas"). Giuffre conta como lhe davam presentes caros, como uma viagem à Tailândia, e exploravam-na por todo o mundo, também na Europa, onde recorda viagens a Paris e ao sul de França ou ao aniversário da modelo Naomi Campbell.

Maxwell e Epstein, segundo ela, lembravam-lhe constantemente que tinham amigos muito importantes e que ela não deveria “ultrapassar os limites com eles”. Depois, a ofereciam a celebridades, políticos, milionários:

— Tem pessoas que eu poderia citar e pessoas que [as memórias] são confusas. Muitas coisas estavam acontecendo — diz Giuffre. Quando solicitada a nomear uma dessas pessoas, ela diz: — Príncipe Andrew. Ela também fala sobre Bill Richardson, ex-governador do Novo México; o investidor Glenn Dubin; o pioneiro da inteligência artificial Marvin Minsky (que morreu em 2016); e “outro príncipe cujo nome não me lembro”.

Depois de passar pelas mãos de Maxwell e Epstein, ela diz ter sofrido com crises de ansiedade e problemas psicológicos. Giuffre diz ainda que o manuscrito de um livro inédito e um contrato com o jornal britânico Mail on Sunday (pelo qual lhe pagaram 140 mil libras pela foto com Andrew e mais 20 mil por duas histórias impressas).

Documento 39: Troca de e-mails

Este documento de 35 páginas está dividido em duas partes. Primeiro, uma série de e-mails entre os advogados, ou também da própria Virginia Giuffre, nos quais são pedidos detalhes do caso a ela ou são mencionados o FBI e organizações de vítimas. Depois, um punhado de tabelas detalhando diversas trocas de e-mails (geralmente entre Giuffre e seus advogados) e explicando os temas neles discutidos, desde o sigilo das comunicações entre advogado e cliente até o debate sobre provas, documentos, possíveis declarações ou assuntos relacionados ao que foi publicado pela mídia.

Documento 40: 'Pessoas que possam ter informações relevantes sobre fatos controversos'

O último documento é composto por vinte páginas com uma lista de 77 pessoas, denominada “Identidades de pessoas que podem ter informações relevantes sobre eventos polêmicos”. A lista traz seus nomes completos, endereços e números de telefone.

Os nomes vão de Ghislaine Maxwell, em primeiro, e de Virginia Giuffre, em segundo lugar, para nomes como o do Príncipe Andrew; os de membros da equipe de Mar-a-Lago; o do advogado Alan Dershowitz; entre outros. Quatro dos nomes estão ocultos.

Novos documentos

Nesta quinta-feira, a juíza retirou o sigilo de um segundo lote de 19 documentos com mais de 300 páginas. Ao contrário do primeiro lote, não há um depoimento mais detalhado de vítimas de Epstein e dos crimes cometidos. Estão incluídas inúmeras mensagens trocadas entre Giuffre e Sharon Churcher, jornalista do tablóide britânico Sunday Mail que contou a história dela e de seu relacionamento com o Príncipe Andrew.

Há também outro e-mail em que Giuffre afirmava que Clinton foi aos escritórios da Vanity Fair “e os ameaçou a não escreverem artigos sobre o tráfico sexual e sobre o seu bom amigo [Epstein]”.

Existem alguns documentos repetidos que já eram conhecidos. Também aparecem uma lista de cem testemunhas propostas, semelhante à que já aparecera no primeiro lote; solicitações de laudos médicos; o depoimento de uma vítima não identificada; o de um médico; o de um ex-namorado da vítima; e o de um detetive que atuara no caso.