Brasil
Censo 2022: pardos são maior grupo étnico pela primeira vez, mas brancos ainda predominam entre mais velhos
População brasileira no ano passado era formada por 92.083.286 pessoas pardas, ante 88.252.121 brancas
Pela primeira vez a população brasileira tem como maior grupo o de pessoas pardas. Este é o retrato revelado pelo Censo 2022 nesta sexta-feira, que confirma as tendências de alteração do pertencimento étnico-racial dos moradores do país apontadas pelas pesquisas domiciliares do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os dados da pesquisa evidenciam que a população brasileira no ano passado era formada por 92.083.286 pessoas pardas (45,3%), 88.252.121 brancas (43,5%), 20.656.458 pretas (10,2%), 1.694.836 indígenas (0,8%) e 850.130 amarelas (0,4%).
O IBGE utiliza o conceito de “raça” como uma categoria socialmente construída na interação social e não como um conceito biológico. Na pesquisa, cada pessoa responde ao instituto a sua percepção sobre a cor ou raça a que pertence, baseado em critérios como origem familiar, cor da pele, traços físicos, etnia e pertencimento comunitário, entre outros. Além disso, o órgão afirma que essas cinco categorias estabelecidas na investigação (branca, preta, amarela, parda e indígena) também podem ser entendidas pelo informante de forma variável.
No entanto, o manual de entrevista do Censo conceitua cada uma das categorias. A pessoa parda, por exemplo, é definida como aquela "que se declarar parda ou que se identifique com mistura de duas ou mais opções de cor ou raça, incluindo branca, preta, parda e indígena". Já a amarela é definida como "pessoa de origem oriental: japonesa, chinesa, coreana, etc".
Ao longo dos últimos 31 anos, quando o IBGE passou a investigar simultaneamente os cinco grupos étnico-raciais, a população branca ocupava a liderança em todas as faixas etárias. Entretanto, os resultados da pesquisa de 2022 mostram um crescimento de pretos e pardos em todos os grupos de idade, enquanto o inverso ocorreu entre a parcela da população que se declara branca, que mesmo com a perda de representação ainda é predominante entre os mais velhos.
"Até o primeiro Censo, em 1872, se interpretava o Brasil como um país europeu formado majoritariamente por brancos, alfabetizados e católicos. Esta interpretação que encobria o que era o povo brasileiro foi desmontada pela pesquisa. O trabalho político de conscientização permitiu que o Censo fosse cada vez mais percebido como um avanço da população não branca no Brasil. Isso é uma expressão de uma conscientização que está em curso. É o que estamos hoje aqui fazendo: revelar do ponto de vista científico e técnico o que é a população brasileira", disse Marcio Pochmann, presidente do IBGE, no evento “Minha Cor, Minha Raça”, transmitido diretamente da Casa do Olodum, em Salvador (BA), nesta sexta-feira. "Os dados vão servir para definir a nova orientação de cota nas universidades."
Na comparação com os resultados do Censo 2010, considerando o aumento de 6,5% da população total, destaca-se o crescimento de 42,3% da população preta e de 11,9% da população parda, enquanto houve um decréscimo de 3,1% da população branca.
"O resultado do Censo revela a evolução de como a sociedade se enxerga. Os dados não trazem surpresas e confirmam o movimento de crescimento das populações pardas e pretas, ao mesmo passo que a população branca diminui", aponta José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e pesquisador aposentado do IBGE.
A população preta passou de 14.517.961 para 20.656.458 no intervalo dos últimos 12 anos. No mesmo período, o número de pessoas de cor ou raça parda cresceu em aproximadamente dez milhões e o de brancos caiu de 90.621.281 para 88.252.121.
O crescimento do número de pardos no país pode ser um reflexo do aumento do letramento racial adquiro por brasileiros ao longo da última década, como aconteceu com o estudante Roberto Malfacini, de 25 anos. Tendo se autodeclarado branco a vida toda, o jovem passou a ter uma nova leitura de si mesmo há cerca de quatro anos, após ingressar sem cota para a universidade.
"Por nunca ter reconhecido nas minhas vivências episódios de racismo, eu não me considerava como uma pessoa parda. Mas comecei a pensar sobre, por ter uma família bem diversamente racializada, e a conversar com outros amigos que são pretos ou pardos, e comecei a me entender enquanto uma pessoa parda", relata o jovem, natural de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, onde 49,7% da população se autodeclara parda, segundo o IBGE.
Na experiência de Roberto, a autodeclaração parda está bastante atrelada à quebra de preconceitos raciais. Segundo ele, o estigma sobre o que é ser uma pessoa negra faz com que muitas pessoas pardas, inclusive em sua família, se autodeclarem brancas.
"O letramento racial é importante pra entendermos o que é uma pessoa negra e que essa pessoa negra tem uma diversidade de tons de pele, que inclui o pardo. Antes, a nossa cor era audeclarada no nascimento por médicos. Hoje, isso já é fruto de uma auto-identificação que perpassa experiências de vida. Acredito que todo esse debate e estudo sobre raça fortalece o movimento, já que a maioria da população é parda", argumenta o estudante.
A população indígena, por sua vez, quase dobrou ao longo do intervalo de realização das duas pesquisas. De acordo com o Censo, o número que contempla os povos originários no Brasil é de 1.694.836, se considerado a soma dos declarados pelos quesitos de cor ou raça e se considera indígena.
Se a comparação for estendida para o intervalo entre 1991 e 2022, ao longo do período desta aferição por grupo étnico-racial, o aumento é ainda maior: os indígenas saem de apenas 0,2% (294.148 pessoas) no início da aferição para 0,83% hoje reportados pelo IBGE.
Em contrapartida, o número de pessoas amarelas apresentou decréscimo: são, na última pesquisa divulgada, 850.130 brasileiros identificados com esta cor ou raça. Isso representa uma perda de quase 60% no comparativo com 2010, quando o grupo passava de pouco mais de dois milhões, mostram os dados. Esse movimento atesta a efetividade da mensagem de confirmação elaborada pelo IBGE para o informante, em que o instituto descreve as características do grupo étnico-racial.
Assim, a população amarela retomou os patamares próximos aos aferidos nas pesquisas realizadas entre 1991 e 2000, quando era representada por 630.658 e 761.583 pessoas, respectivamente.
Pardos são maioria entre jovens
A preponderância da população branca se concentra nas pessoas a partir de 45 anos de idade ou mais. Em 2022, essa população correspondia a mais da metade das pessoas entre 60 e 74 anos de idade (50,3%) e entre aquelas com 75 anos de idade ou mais (55,6%). Os dados mostram que esse grupo étnico perdeu predomínio na faixa de 30 a 44 anos de idade se comparado com a pesquisa anterior do Censo, de 2010.
A população parda manteve predomínio nas faixas etárias abaixo de 30 anos de idade, o que já havia sido alcançado em 2010. Em 2022, pessoas de cor ou raça parda tiveram a maior participação relativa entre as faixas de 0 a 14 anos (49,3%) e de 15 a 29 anos (49,3%). As menores proporções encontradas no ano passado foram nos grupos entre 60 e 74 anos (38,6%) e acima de 75 anos de idade (33,8%).
O Censo 2022 mostra um aumento de idade mediana em todos os grupos étnicos-raciais, em relação a 2010. Este indicador divide uma população entre os 50% mais jovens e os 50% mais velhos.
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