Variedades
Balanço de fim de ano: o que você mantém e do que você abre mão? Série 'Fim' inspira reflexões
Produção disponível no Globoplay acompanha um grupo de amigos ao longo de décadas, mostrando a finitude de todos; se a morte é inevitável, como viver melhor até lá?

Entre os caras do grupo, Ribeiro (Emilio Dantas) foi um dos mais longevos, no entanto, morreu só. Teve uma vida que podemos julgar triste se comparada a dos outros membros. Não foi correspondido pelo grande amor. Soube tarde demais que tinha um filho. Já Silvio (Bruno Mazzeo) fez o que queria, até orgia. E, devido aos seus excessos, deixou esse plano antes.
Dezembro chegou, e começa aquele clima de balanço do ano, pra tentar fazer diferente nos próximos 365 dias. Ou repetir tudo. Então, pergunto: você prefere viver inconsequentemente com riscos de partir antes? Ou encarar seus dias de modo mais manso — que muitos até consideram chato — tentando durar mais por aqui? Como será nosso fim?
Falei sobre uma série documental na semana passada e alguns leitores comentaram sobre outra produção ficcional, “Fim’’, baseada no livro de mesmo nome escrito por Fernanda Torres. Um deles mandou mensagem: “Adorei. Não tenho mais medo de morrer. Cada um faz suas escolhas, erra e acerta. E pra cada um acaba de um jeito. Mas ninguém foge disso”. Um resumo interessante. A linha de chegada da experiência por aqui todos sabemos qual é. As incertezas se dão no caminho até lá. Por onde ir? O que aceitar ou negar? E um dos pontos que me chama atenção nessa história, disponível no Globoplay e que teve o primeiro episódio exibido na Globo, foi que quem nos cerca faz diferença no trajeto, obviamente, já que vivemos em sociedade. Mas fazer algumas escolhas importantes é um processo individual.
A trama é uma celebração à amizade, aprofundando-se em tudo o que relações fortes têm de bom e podem ter de danoso também, ao longo de anos de convivência, da juventude à maturidade. O já citado Silvio é um personagem arrebatador, ao mesmo tempo que um ser execrável. Egoísta, tóxico, arrogante ao extremo com seus pares que optam por rumos diferentes. Mas sempre a postos para a festa. Aquele ser que muita gente consideraria uma ameaça para os casados e que é a companhia perfeita para uma farra após um pé na bunda. No mesmo núcleo há Neto (David Junior), trabalhador e responsável. Mas sua mulher, Célia (Heloisa Jorge), segue a máxima “diga-me com quem andas que eu te direi quem tu és’’ para pegar no pé do marido. Como julga que os outros são má influência, inferniza o parceiro exageradamente. Se, por acaso, Neto saísse da linha, a culpa seria de quem? Provavelmente dos amigos, ela consideraria. Mas, se somos adultos, o B.O. é nosso mesmo. Temos que assumir. Entre os protagonistas, ainda destacaria Irene (Débora Falabella) que, desgostosa com a vida, menospreza o parceiro e pai de sua filha, Álvaro (Thelmo Fernandes). Um cara tão bacana que nunca foi amado. Quantas pessoas legais como ele morrerão sem ser amadas de verdade?
Faço a provocação porque, compartilhando impressões com outra pessoa que já assistiu a “Fim’’, ela me dizia que chamou sua atenção o fato de vários personagens se tornarem e terminarem tristes. Ponderei que a velhice em si — e não que eu considere isso uma regra — carrega inevitavelmente uma melancolia. Ela tem dificuldade de considerar isso porque enxerga o mundo sob o seu viés, ainda tem a juventude a seu favor, usufruindo de todos os seus prazeres, sem temer a solidão. Mesmo que saia só, será notada, atrairá olhares, arrumará companhias. Mas muita gente, conforme se aproxima do fim da vida, perde tudo isso. Pode acontecer com todo mundo. Comigo e com você.
Então o que a gente faz? Escolhas durante o caminho! Elas não garantem um final feliz (poxa, eu lamentei tanto pelo Ribeiro ao longo dos episódios...). Mas elas possibilitam que a gente usufrua de nossa trajetória efetivamente, dia a dia, seja você aquela pessoa que opta por aventuras radicais ou por introspecção. Há uma passagem interessante na trama, quando Ciro (Fabio Assunção) pergunta à mulher, Irene (Ruth), se eles devem insistir na “chatice’’ do almoço de Natal, já que parte do pessoal está brigado, um clima desagradável. Ela diz que sim, lembra que aquilo é uma tradição há anos entre eles, importante de ser mantida. Depois disso, o grupo ainda segue convivendo por muitos anos, brigando aqui e se acertando ali.
A vida, não só no último mês do ano, é um constante balanço. No que vamos seguir insistindo? O que a gente vai priorizar, quem a gente quer manter, com quem a gente quer trocar, que relações cultivar? Mesmo e principalmente nas dificuldades, vale a gente se fazer essas perguntas. Se o fim é inevitável, quero tentar curtir da melhor forma até a véspera. Seja só ou bem acompanhada.
Gabriela Germano é editora-assistente e atua na área de cultura e entretenimento desde 2002. É pós-graduada em Jornalismo Cultural pela Uerj e graduada pela Unesp. Sugestões de temas e opiniões são bem-vindas. Instagram: @gabigermano E-mail: [email protected]
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