Internacional

Padres casados e benção a casais LGBTQIA+: Papa convoca Sínodo da Igreja com temas sensíveis e voto de mulheres

Principal colegiado deliberativo da Igreja Católica também terá maior participação de leigos

Agência O Globo - 02/10/2023
Padres casados e benção a casais LGBTQIA+: Papa convoca Sínodo da Igreja com temas sensíveis e voto de mulheres
Papa Francisco

Ao longo de uma década como líder da Igreja Católica Romana, o Papa Francisco permitiu debates sobre temas antes tratados como tabus e desencadeou sutis mudanças liberalizantes que enfureceram conservadores por ter ido longe demais e frustraram progressistas por não avançar o suficiente.

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Este mês, a partir de quarta-feira, o desejo de Francisco de que a Igreja discuta as preocupações dos seus fiéis, mesmo os temas mais delicados, terá vez no Sínodo dos Bispos, um encontro de religiosos dos mundo todo que, pela primeira vez, permitirá que mulheres votem e terá maior participação de leigos. As questões em discussão incluirão padres casados, o celibato sacerdotal, a bênção a casais LGBTQIA+, a extensão dos sacramentos aos divorciados e a ordenação de mulheres.

Os críticos desconfiam da própria natureza do Sínodo, apontado como uma maratona burocrática ou como um cavalo de Tróia para os progressistas corroerem as tradições da Igreja sob o manto do colegiado. Mas há os que enxergam uma oportunidade de botar em prática a visão de Francisco sobre a Igreja, como uma instituição inclusiva e que busca subverter a hierarquia tradicional e a força dos bispos, e ouvir e a trabalhar mais com os fiéis.

Para estes, mais do que qualquer questão em debate, e para além dos principais temas da “guerra cultural” que ficaram de fora da pauta[aborto, casamento entre pessoas do mesmo sexo ou eutanásia], é o processo de bispos e leigos trabalhado e votando juntos que representa uma mudança potencialmente transformadora.

'Momento incrível'

— É um momento incrível — disse Renée Köhler-Ryan, reitora da Escola de Filosofia e Teologia da Universidade de Notre Dame Austrália, que participará e votará entre as primeiras mulheres a terem essa oportunidade.

Ainda assim, muitos observadores da Igreja analisam que resta saber se o encontro se tornará um instrumento para a transformação que os conservadores temem ou outra oportunidade frustrada na visão dos liberais.

O Sínodo dos Bispos é uma instituição permanente de aconselhamento do Papa que reúne bispos de todo o mundo, em encontros periódicos para discutir e votar propostas sobre orientações da Igreja que são enviadas para deliberação do Pontífice. Se desejar, o Papa pode adotar texto final como um documento papal ou decidir escrever sua versão ao fim do Sínodo.

O tema geral do evento deste ano, que começa em 4 de outubro e se extende até 2024, gira em torno do estímulo ao maior envolvimento dos fiéis nas questões da Igreja, definido como um " Sínodo sobre a Sinodalidade", ou sobre a capacidade de religiosos e leigos trabalharem juntos pelo bem da Igreja.

— Eu tenho plena consciência de que falar de um ‘Sínodo da Sinodalidade’ pode parecer um pouco obscuro, autorreferente, excessivamente técnico, e de pouco interesse para o público em geral — disse o Papa, em agosto, mas acrescentou que — é algo verdadeiramente importante para a Igreja.

Francisco convocou vários Sínodos durante os seu Papado, sobre a família e sobre a juventude, por exemplo. Mas este é diferente. Não tratará de um único tema e sim da prática de trabalhar em Sínodo, um processo que o Vaticano explica como “caminhando juntos”. Em 2021, o Vaticano iniciou um processo de sondagem em Igrejas do mundo todo para levantar os temas que, em teoria, seriam os mais importantes apontados, em comum, pelos fiéis.

Em abril, o Papa publicou as novas regras para este ano, que marcaram uma mudança histórica nas normas da Igreja. Pelo documento, a maior parte dos participantes ainda é formada por bispos, mas o Papa adicionou 70 integrantes além deles, com orientação de que 35 sejam mulheres e que a presença de jovens seja incentivada. O texto determina que, por serem integrantes, “eles terão o direito a voto". Além disso, cinco freiras vão se juntar aos 5 padres que também podem votar como representantes de ordens religiosas. Nos Sínodos passados, as mulheres puderam apenas atuar como auditoras.