Internacional
'A vida não para': soldados mutilados encontram forças para voltar à rotina através do futebol na Ucrânia
Grupo, formado por dez soldados, se reúne uma ou duas vezes por semana em uma quadra de Kiev
Há um ditado popular que diz que “o jogo só acaba quando o juiz apita”. A frase, usada para dar ânimo e estimular a seguir adiante, parece cair como uma luva em soldados ucranianos feridos durante a guerra na Ucrânia. Mutilados, militares e civis decidiram seguir, apesar da tragédia — e o campo de futebol é um dos motivos.
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Na quadra em Kiev, um grupo de dez ex-combatentes, composto por jovens e adultos, se reúne uma ou duas vezes por semana para uma partida. A paixão pelo esporte veio antes dos ferimentos provocados pela guerra.
Volodymyr Samus é um deles. O soldado de 42 anos perdeu a perna após ser atingido por estilhaços em Avdiivka, no Leste da Ucrânia, na região de Donetsk. A região, tomada em maio por forças russas apoiadas pelos paramilitares do Grupo Wagner, foi palco de um dos combates mais sangrentos da guerra.
— Nós nos adaptamos — disse Samus à AFP.
O homem contou à agência francesa que jogou futebol por muito tempo, mas que agora, sem uma das pernas, é diferente.
— É uma sensação totalmente nova. Como uma criança que aprende a andar, aprendemos a brincar — observou.
O sentimento de que há mais para viver também é compartilhado pelo ex-policial Oleg. O homem, de 46 anos, era um oficial da 46ª brigada de assalto, uma unidade localizada em Robotyne, no Sul do país.
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Usando muletas, ele contou à AFP que quase morreu em dezembro do ano passado, durante um combate em Bakhmut, cidade no Leste da Ucrânia tomada pela Rússia.
— [Um soldado russo] atirou em mim com um lançador de granada a cerca de sete metros. Ele estava com medo. Se ele segurasse a arma com firmeza, teria me acertado no meio do peito e agora eu não estaria jogando aqui — relembra Oleg à agência.
O homem conta ainda que muitos dos seus amigos do campo de batalha que sobreviveram procuraram conforto em outras coisas, como drogas. Ele lembra que, ao ver que havia perdido a perna, chegou a pensar que a vida tinha acabado.
— Mas aqui estou! — disse com um sorriso.
Quem também teve parte da perna amputada foi o ex-combatente e parte da equipe Oleksandre Malchevski. Ele foi atingido no joelho por uma bala em um ataque perto de Kharkiv, no Nordeste do país, em maio do ano passado.
Um membro a menos, contudo, não é sinônimo de dificuldade. Pelo contrário, o ex-combatente de 31 anos compensa a falta de parte da perna com inteligência e agilidade. A mesma filosofia que tem levado para a vida.
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— Tenho uma mulher e um filho de nove anos. Não quero ficar em cadeira de rodas e receber cuidados. Ter perdido uma perna não mexe com a minha psique. Ninguém me obrigou [a lutar]. Fui voluntário desde os primeiros dias e sabia do risco — destacou à AFP.
Na partida de cinco contra cinco, um dos goleiros é o sargento Yevguen Nazarenko, de 31 anos. Também em maio do ano passado, o então controlador de drones de reconhecimento foi atingido pela explosão de um projétil danificado, a dez metros dele, levando-o a perder o braço.
Jogador de futebol amador desde novo, Nazarenko contou à agência francesa que voltou recentemente ao campo e que já aprendeu a controlar drones com apenas um braço. A expectativa é voltar ao trabalho assim que conseguir uma prótese.
— É preciso mostrar aos outros jovens lesionados que a vida não para e que eles não precisam ficar em casa — ressaltou à AFP.
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