Internacional

'Invasão' de caranguejos azuis ameaça ecossistemas no norte da Itália

Originária da América do Norte, espécie é predadora de mexilhões usados em um prato famoso no país, o espaguete com amêijoas; organizações de marisqueiros estão preocupadas

Agência O Globo - 03/09/2023
'Invasão' de caranguejos azuis ameaça ecossistemas no norte da Itália

Nas águas da Lagoa de Scardovarido, ao sul de Veneza, os pescadores italianos capturam amêijoas, um tipo de mexilhão usado em um prato local muito popular, o famoso espaguete com amêijoas (spaghetti alle vongole), mas a proliferação de caranguejos azuis ameaça seu meio de sustento.

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Esta espécie invasora é nativa da costa atlântica da América do Norte e está presente há anos no Mediterrâneo. Mas, nos últimos meses, tornou-se um problema grave nesta zona do Adriático, localizada ao sul de Veneza, no norte da Itália.

— Os caranguejos azuis comem tudo. Esta parte da lagoa costeira está se transformando num deserto — diz Gianluca Travaglia, um pescador de amêijoas e mexilhões de 52 anos.

Travaglia que é da terceira geração de sua família que trabalha na pesca em Scardovari, em um dos braços do estuário Rio Pó, o maior da Itália que deságua no Mar Adriático.

— Cada dia vemos mais, não sei o que fazer — continua ele. — Outros pescadores enfrentam o mesmo problema.

O governo liberou 2,9 milhões de euros na semana passada para combater o que o ministro da Agricultura, Francesco Lollobrigida, descreveu como uma “situação crítica”.

Este dinheiro destina-se a dar “incentivos econômicos” a quem pesca caranguejos azuis, que se reproduzem de forma “perigosa”, disse o ministro, acrescentando que a espécie não tem predadores naquela zona.

A organização empresarial Coldiretti denunciou uma “invasão” provocada pelas alterações climáticas. Segundo a entidade, esta espécie “extermina amêijoas, mexilhões, ovos, outros peixes e moluscos, pondo em perigo a sobrevivência de 3.000 empresas no delta do Pó”.

Das costas dos EUA, os caranguejos azuis espalharam-se por todo o mundo, provavelmente através da água dos tanques dos navios. Durante anos, pescadores de Espanha, Albânia e França verificaram que a presença desta espécie afeta o equilíbrio natural da fauna nativa.

Este crustáceo é um excelente nadador. Pode pesar até um quilo e comer quase tudo, usando suas afiadas garras azuis, com as quais abre as amêijoas. Em Eraclea, uma cidade costeira a leste de Veneza, um cozinheiro decidiu experimentar o crustáceo como ingrediente.

— Muitos pratos podem ser preparados com o siri azul — diz Luca Faraon, de 58 anos, que faz macarrão com o caranguejo azul cozido com alho, tomate e salsa. — Procuramos até uma forma de usar em sobremesas.

Nos Estados Unidos, na Baía de Chesapeake, perto de Washington, o caranguejo azul é muito procurado. Num encontro com representantes do setor na semana passada, Lollobrigida reconheceu a gravidade da situação, mas sublinhou que o caranguejo azul pode ser exportado para os Estados Unidos e a China.

— Os caranguejos azuis são um grande recurso — disse ele, observando que são ricos em vitamina B12.

Emanuele Rossetti, bióloga do Polesine Fisheries Consortium, uma das mais importantes associações de mariscos, não partilha deste otimismo. Para ela, as amêijoas, que não sobrevivem em águas invadidas por caranguejos azuis, são o principal recurso da sua associação. O número de caranguejos azuis, presentes nestas águas há cerca de 15 anos, aumentou “exponencialmente” nos últimos meses, diz Rossetti. A bióloga alerta que o ritmo atual com que os caranguejos “comem amêijoas” é uma ameaça iminente.

— Tenho certeza de que os pescadores do nosso consórcio não terão mercadorias para vender depois de dezembro — afirma.