Internacional
Plano do Japão de despejar água da usina nuclear de Fukushima no mar atrai oposição de Pequim e divide Seul
China e Hong Kong já anunciaram proibições à importação de alimentos japoneses; comunidade pesqueira local teme danos à reputação de seus produtos
O Japão começará a despejar a água residual tratada da usina nuclear de Fukushima no Oceano Pacífico na quinta-feira, anunciou o primeiro-ministro Fumio Kishida, apesar da oposição de países vizinhos, incluindo a China. A decisão ocorre semanas após o órgão regulador das Nações Unidas aprovar o plano.
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O governo japonês e a operadora central nuclear, TEPCO, afirmam, assim como a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) da ONU, que a água não representa riscos para a saúde e o meio ambiente após um tratamento que elimina a maioria das substâncias radioativas.
Mas a comunidade pesqueira local teme os danos à reputação de seus produtos. China e Hong Kong já anunciaram proibições à importação de alimentos japoneses, com Pequim acusando o país vizinho de querer despejar "arbitrariamente" a água contaminada no mar.
— O oceano é propriedade comum de toda a humanidade, não é um lugar para o Japão despejar arbitrariamente água contaminada com material nuclear — afirmou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Wang Wenbin, nesta terça-feira, acrescentando que a China tomará "as medidas necessárias para salvaguardar o ambiente marinho, a segurança alimentar e a saúde pública.
O governo chinês também proibiu a importação de alimentos de 10 municípios japoneses e passou a aplicar controles de radiação aos produtos do restante do arquipélago.
Por sua vez, o presidente-executivo de Hong Kong, um importante mercado para as exportações marítimas japonesas, disse que deu instruções para "ativar imediatamente" os cortes na importação de alguns alimentos do Japão.
“A segurança alimentar e a saúde pública em Hong Kong são as principais prioridades do governo”, escreveu Lee no Facebook. "Instruí os ministérios relevantes a ativar imediatamente medidas de controle de importação para proteger a segurança alimentar e a saúde pública em Hong Kong.”
Apoio sul-coreano
Na Coreia do Sul também foram registradas manifestações contra o projeto e alguns cidadãos, com medo, estocaram sal marinho pelo receio de que a água da qual o produto é obtido termine contaminada. Mas o que diferencia Seul de outros críticos na região é que seu governo endossou o plano de descarte do Japão, apesar da apreensão pública generalizada, pedindo apenas que Tóquio forneça transparência para garantir que a água seja descartada adequadamente.
Em plena campanha para melhorar as relações historicamente distantes com Tóquio, as autoridades sul-coreanas estão também veiculando anúncios online e realizando briefings diários para dissipar o que chamam de medo da oposição e convencer as pessoas de que a água não fará mal.
O Japão tem 1.000 grandes tanques para armazenar a água usada para resfriar os reatores ainda radioativos da usina de Fukushima, destruída por um terremoto seguido de tsunami que matou quase 18 mil pessoas em março de 2011, no que foi um dos piores desastres radioativos da História.
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Mas com o esgotamento da capacidade dos tanques, Tóquio quer liberar gradualmente a água no oceano nos próximos 30 anos, depois de filtrá-la e diluí-la para atender aos padrões regulatórios. Nos últimos 12 anos, a operadora TEPCO acumulou mais de 1,3 milhão de toneladas dessa água, equivalente à capacidade de 500 piscinas olímpicas.
O governo japonês solicitará à TEPCO, que "se prepare para o início do despejo no oceano, com base no plano aprovado pela Autoridade de Regulação Nuclear", anunciou o primeiro-ministro Fumio Kishida nesta terça-feira, acrescentando que o início do processo está "programado para 24 de agosto, desde que as condições meteorológicas e marítimas não o impeçam".
A TEPCO afirma que a água foi diluída e filtrada para eliminar todas as substâncias radioativas, exceto o trítio, que está em níveis muito inferiores ao que é considerado perigoso. O plano prevê despejar a água a uma taxa máxima de 500 mil litros por dia no Oceano Pacífico, ao longo da costa nordeste do Japão.
Manifestações e restrições à importação
A ONG de defesa do meio ambiente Greenpeace denunciou que o processo de filtração tem falhas e que uma quantidade "imensa" de material radioativo será dispersado no mar nas próximas décadas. Mas Tony Hooker, especialista no setor nuclear da Universidade de Adelaide, na Austrália, chamou a denúncia de "alarmismo".
— O trítio foi liberado [por usinas nucleares] durante décadas sem evidências de efeitos prejudiciais para o meio ambiente ou à saúde — declarou à AFP.
Quando o plano foi anunciado pela primeira vez em 2021, a Agência de Alimentos e Medicamentos (FDA) dos EUA disse que “não havia impacto na saúde humana e animal” se as águas residuais tratadas fossem descartadas conforme proposto. Especialistas independentes nomeados pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, no entanto, alertaram para “riscos consideráveis” para milhões de vidas e meios de subsistência na região do Pacífico.
Em julho, porém, a AIEA endossou o plano do Japão, chamando o impacto radiológico da água de “insignificante”. Semanas depois, os reguladores ambientais em Massachusetts, nos EUA, negaram um pedido semelhante para liberar águas residuais radioativas tratadas de uma usina nuclear fechada na Baía de Cape Cod.
Como o Japão, outras nações filtram a água de resfriamento de suas usinas nucleares e liberam a água tratada no oceano. Mas os críticos dizem que a água de Fukushima foi contaminada com mais materiais radioativos perigosos do que o normal.
— Falando cientificamente, a questão em jogo é simples: se materiais radioativos suficientes chegariam ao nosso país para nos afetar — disse Chung Bum-Jin, presidente eleito da Sociedade Nuclear Coreana, em entrevista ao New York Times. — Mas quando a política se mistura, a questão fica complicada, com mais de uma resposta.
Para Chung , “o que importa é se o Japão libera sua água de acordo com os padrões internacionais. Tudo o mais é demagogia”.
— Não podemos nos intrometer de fato enquanto o Japão liberar sua água abaixo dos limites regulatórios — afirmou.
Indústria pesqueira
A descarga marinha é a maneira “mais segura” de descartar a água com segurança, disse Jeong Yong Hoon, professor de engenharia nuclear do Instituto Avançado de Ciência e Tecnologia da Coreia do Sul, ao New York Times. Outras opções de descarte apenas tornam sua eventual rota para o mar — e o processo de avaliação do impacto ambiental — mais complicado, disse ele.
Mas as restrições têm gerado preocupação na indústria pesqueira nipônica, no momento em que o setor começava a registrar uma recuperação mais de uma década após o desastre nuclear.
— Nada de liberação de água nos beneficia — disse Haruo Ono, um pescador de 71 anos que mora a 60 km da usina nuclear e perdeu um irmão na catástrofe de 2011.
James Brady, da consultoria de risco Teneo, considera que as preocupações chinesas podem ser sinceras, mas também observa um toque de rivalidade geopolítica e econômica na reação.
— A natureza multifacetada da questão do despejo de água residual de Fukushima permite que Pequim explore o tema — declarou Brady à AFP, acrescentando que a China "pode exercer um certo grau de pressão econômica no eixo comercial, exacerbar as divisões políticas internas sobre esta questão dentro do Japão". (Com AFP)
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