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China muda liderança da divisão de foguetes responsável por arsenal nuclear, em momento crítico na disputa com Taiwan

Sem citar antecessores, que não eram vistos desde abril, mídia estatal nomeou Wang Houbin como comandante e Xu Xisheng como seu comissário político

Agência O Globo - 02/08/2023
China muda liderança da divisão de foguetes responsável por arsenal nuclear, em momento crítico na disputa com Taiwan
China - Foto: AFP

A China anunciou, no começo desta semana, dois novos líderes de sua Força de Foguetes do Exército, uma mudança surpreendente que coloca em xeque o funcionamento interno no topo do ramo militar que supervisiona o poderoso arsenal de mísseis nucleares e balísticos do país. Na segunda-feira, a mídia estatal nomeou Wang Houbin como comandante da Força de Foguetes, e Xu Xisheng como seu comissário político.

O anúncio das novas lideranças da divisão de foguetes, um ramo independente das Forças Armadas chinesas, foi feito na segunda-feira de maneira indireta pela mídia estatal do país, que não citou o antecessor de Wang, Li Yuchao, um veterano da força que servia como comandante desde o início do ano passado. Também não houve qualquer menção oficial ao comissário anterior, Xu Zhongbo, que ocupava o cargo desde julho de 2020.

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A última vez que Li e Xu foram citados pela imprensa estatal chinesa foi em abril, quando participaram de uma cerimônia de colocação de coroas de flores na cidade de Suzhou. De acordo com o Financial Times, autoridades estrangeiras acreditam que os dois generais estão sendo investigados por supostamente vazar segredos militares.

A substituição de duas figuras importantes da Força de Foguetes é um movimento incomum, segundo especialistas. E acontece dias depois de o chanceler chinês, Qin Gang, que também não era visto em público há um mês, ter sido substituído por seu antecessor, Wang Yi.

A remodelação também ocorre em um momento de grande importância para o setor, que controla o arsenal de mísseis balísticos, tanto nucleares quanto convencionais, de curto alcance usados para intimidar o governo autônomo de Taiwan.

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Wang e Xu têm experiência na Marinha e na Força Aérea, respectivamente, e suas nomeações contrariam a política de longa data da China de colocar a força de mísseis estratégicos do país sob o comando de oficiais com experiência específica na função.

— A mudança é bastante significativa — disse à CNN Yun Sun, diretora do programa para a China do Stimson Center, centro de estudos com sede em Washington. — Especialmente em um momento em que a China está tentando construir seu arsenal nuclear para impedir uma possível intervenção dos EUA na disputa com Taiwan, a reorganização pode aumentar o ceticismo sobre a capacidade da força de realizar a missão de forma confiável e com sucesso.

Para Taylor Fravel, professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e especialista sobre os militares chineses, a decisão de nomear oficiais de fora da Força de Foguetes sugere que os problemas identificados com Li foram graves, e reflete a importância da força, à medida que ela passa por uma ampliação significativa em meio à deterioração das relações com os Estados Unidos.

Desde que assumiu, em 2012, Xi comandou uma ampla reforma contra a corrupção nas Forças Armadas, expurgando vários comandantes de alta patente, dentre eles o ex-chefe do Departamento do Estado-Maior Conjunto Fang Fenghui, sentenciado à prisão perpétua em 2019.

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A Força de Foguetes controla os programas de mísseis terrestres convencionais e nucleares da China, incluindo mísseis balísticos intercontinentais capazes de alcançar o território dos Estados Unidos. Nos últimos anos, Pequim acelerou o desenvolvimento de armas nucleares e caminha para ter cerca de 1.500 ogivas nucleares operacionais até 2035, de acordo com um relatório do Pentágono no ano passado.

De acordo com estimativas do Pentágono, o arsenal atual inclui 1.200 mísseis balísticos de curto alcance, 200 a 300 mísseis balísticos convencionais de médio alcance e um número desconhecido de mísseis balísticos convencionais de alcance intermediário, bem como entre 200 e 300 mísseis de cruzeiro lançados do solo.

O país também construiu vastos campos de silos de mísseis em sua região desértica ocidental para mísseis balísticos intercontinentais e hoje possui mais lançadores desses mísseis do que os EUA, segundo relatório encaminhado por militares americanos ao Congresso.

O sigilo sobre a vida pessoal e a saúde de altos funcionários está arraigado no Partido Comunista Chinês (PCC). Em uma das ausências mais notáveis ​​e ainda inexplicadas dos últimos tempos, Xi desapareceu abruptamente da vista do público por duas semanas, pouco antes de assumir o poder em 2012, perdendo uma reunião com a então secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton.