Internacional

Trump é acusado de conspiração contra os EUA por tentar anular as eleições de 2020

Procurador especial Jack Smith se reuniu com o grande júri que investiga o ex-presidente por tentar intervir nos resultados das eleições de 2020 e sua participação nos atos antidemocráticos de 6 de janeiro de 2021

Agência O Globo - 02/08/2023
Trump é acusado de conspiração contra os EUA por tentar anular as eleições de 2020
Donald Trump - Foto: Internet

O ex-presidente Donald Trump foi acusado, nesta terça-feira, de conspirar contra os Estados Unidos por tentar reverter o resultado da eleição presidencial de 2020, quando foi derrotado por Joe Biden nas urnas e tentou se manter no poder ao acusar, sem provas, de que o pleito foi fraudado. Com a nova acusação, Trump vira réu em um caso criminal federal pela terceira vez apenas neste ano — ele também é alvo de processos por suposto suborno a uma ex-atriz pornô em 2016 e do manuseio ilegal de documentos secretos quando deixou a Casa Branca.

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A acusação foi apresentada pelo procurador especial Jack Smith no Tribunal Distrital Federal de Washington. Ele acusa Trump de três conspirações: uma para fraudar os Estados Unidos, uma segunda para obstruir um processo oficial do governo e uma terceira para privar as pessoas dos direitos civis previstos em lei federal ou na Constituição.

— Boa noite. Hoje, uma acusação foi feita para denunciar Donald J. Trump por conspirar para fraudar os EUA, conspirar para privar os eleitores e conspirar e tentar obstruir um processo oficial — afirmou o Smith em um breve pronunciamento à imprensa, no qual se referiu aos ataques de 6 de janeiro de 2021 como "um ataque sem precedentes ao seio da democracia americana" e que foi "abastecido por mentiras" de Trump.

"Cada uma dessas conspirações – que se baseou na desconfiança generalizada que o réu estava criando por meio de mentiras profundas e desestabilizadoras sobre fraude eleitoral – visava uma função fundamental do governo federal dos Estados Unidos: o processo nacional de coletar, contar e certificar os resultados das eleições presidenciais eleição”, descreve o documento apresentado pela acusação ao tribunal.

A nova acusação já era esperada por Donald Trump, por seus advogados e pela equipe que trabalha em sua campanha presidencial de reeleição. O próprio ex-presidente e principal candidato do Partido Republicano publicou, minutos antes da imprensa americana primeiro noticiar a formalização da acusação que havia "ouvido dizer" que ela seria feita ainda na terça.

"Ouvi dizer que o enlouquecido Jack Smith, a fim de interferir nas eleições presidenciais de 2024, lançará mais uma acusação falsa de seu presidente favorito, eu, às 17h. Por que eles não fizeram isso 2,5 anos atrás? Por que esperaram tanto? Porque eles queriam colocá-lo bem no meio da minha campanha. Improbidade do Ministério Público!", afirmou o ex-presidente, sem especificar exatamente pelo quê seria acusado, em uma publicação na Truth Social.

Fontes ouvidas pela CNN americana afirmavam desde cedo que Trump e seus assessores legais já traçavam uma estratégia sobre como responder imediatamente ao terceiro processo desde a segunda-feira pela manhã. Ainda na segunda, Trump já havia dito que esperava ser acusado “a qualquer momento”. No início do mês passado, ele já havia dito ter recebido uma carta alvo na investigação, convidando-o a testemunhar perante o grande júri — um sinal de que uma acusação era provável.

“Presumo que uma acusação do enlouquecido Jack Smith e sua gangue altamente partidária de bandidos, referente ao meu discurso 'PACIFICAMENTE E PATRIOTICAMENTE', sairá a qualquer momento, como mais uma tentativa de encobrir todas as más notícias sobre propinas, subornos e extorsão, vindos do 'campo' de Biden”, escreveu Trump, fazendo referencia ao pronunciamento que fez fora da Casa Branca antes da invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021.

Tanto nas mensagens que publicou na rede social quanto em declarações à imprensa americana durante à noite, a estratégia do ex-presidente parece estar apoiada em três pilares: acusar a medida de ser uma interferência nas eleições de 2024, ecoando a narrativa já firmada nas fileiras republicana de que Biden está usando o sistema de justiça para perseguir o principal candidato do partido, questionar o tempo que o Departamento de Justiça levou para processá-lo por fatos ocorridos em 2021 e atacar Joe Biden por ilegalidades e corrupções em seu governo e passado.

Minutos após a confirmação da acusação, uma onda de publicações de políticos republicanos varreu as redes sociais, parecendo respaldar os argumentos utilizados por Trump. A Comissão Jurídica do Partido Republicano na Câmara chamou o caso de "interferência eleitoral" em uma publicação. Em outra, pouco tempo depois, escreveu: "Departamento de Justiça de Joe Biden: (aprova) Indiciar o presidente Trump - que não fez nada de errado. (não age) Negócio querido para Hunter Biden - que fez tudo errado".

O presidente da Câmara, Kevin McCarthy, também saiu em defesa do ex-presidente em um pronunciamento pelas redes sociais. McCarthy elencou vezes em que julgou o tratamento dado à Trump e a Biden diferente pelo Departamento de Justiça, citou o contexto eleitoral e indicou a tentativa de interferir no pleito.

"Ontem mesmo uma nova pesquisa mostrou que o presidente Trump é sem dúvida o principal oponente político de Biden. Todos na América podiam ver o que viria a seguir: a tentativa do DOJ de se distrair das notícias e atacar o favorito à indicação republicana, o presidente Trump", escreveu

Um dos principais afetados pela tentativa de Trump de reverter o resultado das eleições, o ex-vice-presidente Mike Pence foi uma das vozes divergentes dentro do partido. Alvo dos manifestantes em 6 de janeiro, que gritavam "enforquem Mike Pence" enquanto ele cumpria a função constitucional que Trump se negou a fazer, de confirmar o resultado da eleição no Congresso, o pré-candidato republicano classificou a acusação como "um lembrete importante".

"A acusação de hoje serve como um lembrete importante: qualquer um que se coloque acima da Constituição nunca deve ser presidente dos Estados Unidos”, disse ele.

Embora esteja em busca da indicação republicana para disputar a Presidência, a posição de Pence não é majoritária entre os adversários do ex-presidente no partido. O principal concorrente de Trump, Ron DeSantis, afirmou que iria "acabar com a instrumentalização do governo" e prometeu trocar o diretor do FBI se eleito.

A Casa Branca não comentou a acusação contra o ex-presidente e nem as falas dos republicanos.

Co-conspiradores

A acusação contra Trump menciona, mas não identifica pelo nome, seis co-conspiradores que os promotores dizem que trabalharam com ele na tentativa de derrubar a eleição de 2020. Não está claro por que o escritório de Jack Smith decidiu buscar apenas o indiciamento de Trump por enquanto, embora seja possível que alguns dos co-conspiradores ainda possam enfrentar acusações nas próximas semanas.

As descrições deles parecem corresponder a várias pessoas que foram centrais na investigação sobre a tentativa de fraudar as eleições. Entre as pessoas centrais para o inquérito estava Rudolph Giuliani, ex-prefeito de Nova York e advogado de Trump, que supervisionou suas tentativas de alegar que a eleição foi fraudada.

O co-conspirador 1 é descrito na acusação como um “advogado que estava disposto a espalhar alegações conscientemente falsas e buscar estratégias que a campanha de reeleição do réu em 2020 não faria”.

O relatório final do comitê seleto da Câmara investigando 6 de janeiro detalhou a luta entre Giuliani, que pressionava Trump a promover alegações de fraude, e outros advogados da campanha que se afastaram deles.

Publicidade e narrativa

Com a aparente informação antecipada de que Trump seria novamente acusado, a campanha do ex-presidente lançou uma nova peça publicitária acusando Joe Biden pelas múltiplas acusações criminais que o perseguem em meio a uma candidatura presidencial.

O anúncio estreou nesta terça-feira, quando o grande júri estava reunido em Washington. Com imagens sombrias e em tom sinistro, o anúncio de 60 segundos diz que Biden está “agindo como um ditador corrupto do terceiro mundo”

“Biden soltou um quadro de burocratas inescrupulosos do governo que ele controla para agir como lobos raivosos e atacar sua maior ameaça, lançando uma das maiores caçadas às bruxas da história”, diz o anúncio.

Fotos de quatro promotores que investigam Trump aparecem na tela: O procurador especial Jack Smith; a procuradora-geral de Nova York, Letitia James, cujo nome está escrito incorretamente no anúncio; o promotor do distrito de Manhattan, Alvin Bragg; e o promotor distrital Fani Willis, do condado de Fulton, na Geórgia.

A porta-voz do Comitê Nacional Democrata rebateu as acusações na publicidade de Trump.

— Donald Trump voltou a fazer o que faz de melhor: tentar distorcer a América com mentiras para encobrir seu desempenho como presidente — disse Ammar Moussa. — O povo americano votou contra isso em 2020 e vai rejeitá-lo novamente. Nem todos os anúncios do mundo vão mudar os fatos.

O anúncio, que estreou na Fox News na manhã de terça-feira, é o primeiro novo anúncio pago da campanha de Trump em quase dois meses. Com sua vantagem sobre o resto do campo republicano crescendo, ele está cada vez mais volta sua atenção para a eleição geral contra Biden.