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Conflito étnico termina em mortes e estupro coletivo de mulheres no nordeste da Índia

Violência aconteceu no início de maio, mas caso só foi comentado pelas autoridades nesta quinta-feira, quando um vídeo da ação se tornou viral nas redes

Agência O Globo - 20/07/2023
Conflito étnico termina em mortes e estupro coletivo de mulheres no nordeste da Índia

Um vídeo mostrando duas mulheres sendo empurradas nuas por entre uma multidão de homens no estado de Manipur, no nordeste da Índia, provocou a indignação de milhões de pessoas nesta quinta-feira, depois de viralizar nas redes sociais e ganhar as manchetes do país. Registrada em maio, a cena foi apontada pelo primeiro-ministro Narendra Modi como “vergonhosa” — com dois meses de atraso.

— O incidente de Manipur que veio à tona é vergonhoso para qualquer sociedade civilizada — disse Modi, nesta quinta-feira, dirigindo-se às câmeras de TV do lado de fora do Parlamento, em Nova Délhi.

O evento a que ele se referia remonta a 4 de maio, um dia após o início dos confrontos entre as comunidades meitei e kuki, que já deixaram mais de 150 pessoas mortas. Na ocasião, um grupo de kukis que fugia para a floresta em busca de segurança foi interceptado por uma multidão de meiteis. Dois homens foram mortos e as mulheres do grupo tiveram que desfilar nuas, além de terem sido agredidas sexualmente pela turba.

A polícia local diz que abriu um caso de sequestro, estupro coletivo e assassinato no distrito de Thoubal, em 18 de maio, depois que uma queixa foi apresentada por um parente de uma das mulheres. O principal acusado e três suspeitos, porém, só foram detidos nesta quinta-feira, 63 dias depois, segundo a imprensa indiana.

— Garanto à nação que a lei seguirá seu curso com todas as suas forças. O que aconteceu com as filhas de Manipur nunca poderá ser perdoado — acrescentou Modi, finalmente quebrando seu silêncio sobre o caso mais de dois meses após o início da violência.

A Suprema Corte está “profundamente perturbada com o vídeo”, disse DY Chandrachud, presidente do tribunal, expressando preocupação com o ataque.

— Nós tomaremos medidas se o governo não o fizer — declarou o jurista.

As atrocidades foram cometidas em uma aldeia no distrito de Kangpokpi, em Manipur, na divisa com Mianmar, contra mulheres da comunidade kuki-zo, de acordo com Fórum de Líderes Tribais da Índia (ITLF), que acrescentou: "O estupro coletivo das mulheres aconteceu depois que a vila foi incendiada e dois homens, um de meia-idade e outro adolescente, foram espancados até a morte pela multidão".

O vídeo perturbador foi amplamente divulgado nas redes sociais e mostra as duas mulheres da minoria kuki sendo arrastadas e apalpadas por uma multidão de homens meitei que as empurram para um campo vazio, enquanto elas choram e imploram a seus agressores que mostrem alguma misericórdia.

O governo central pediu a todas as empresas de mídia social que excluíssem o material de suas plataformas, e o governo do estado de Manipur, também liderado pelo BJP, disse que está investigando o incidente filmado.

O ataque foi condenado por políticos de todo o espectro, com vários líderes da oposição responsabilizando o governo nacionalista hindu do Partido Bharatiya Janata (BJP) por não fazer o suficiente para conter a violência no estado.

— As imagens de violência sexual contra mulheres de Manipur são de partir o coração — disse Priyanka Gandhi Vadhra, líder do Partido do Congresso Nacional.

O Parlamento Europeu também exortou as autoridades a "interromper prontamente a violência étnica e religiosa" na Índia, dizendo ainda que havia "preocupações sobre políticas segregacionistas que promovem a maioria hindu na área".

Hindus versus cristãos

A violência em Manipur, motivada por uma disputa pelo acesso a empregos públicos e outras regalias, resultou também em ao menos 1.700 casas e igrejas incendiadas, com dezenas de milhares de pessoas fugindo para acampamentos administrados pelo governo.

Os confrontos entre gangues vigilantes de comunidades rivais colocaram a maioria meitei, que é principalmente hindu e vive em Imphal e arredores, contra os kuki, majoritariamente cristãos e habitantes colinas circundantes.

A comunidade kuki protestou contra as demandas dos meitei por cotas reservadas de empregos públicos e admissões em faculdades como forma de ação afirmativa. Isso também alimentou temores de longa data entre os kuki de que os meitei pudessem adquirir terras em áreas atualmente reservadas para eles e outros grupos tribais.

As mulheres Kuki mostradas no vídeo disseram ao site de notícias The Wire que a polícia estava presente no momento e não as ajudou.